Acórdão nº 6/17 de Tribunal Constitucional (Port, 18 de Janeiro de 2017

Magistrado ResponsávelCons. Gonçalo Almeida Ribeiro
Data da Resolução18 de Janeiro de 2017
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 6/2017

Processo n.º 663/16

3ª Secção

Relator: Conselheiro Gonçalo de Almeida Ribeiro

Acordam, em conferência, na 3ª secção do Tribunal Constitucional

I. Relatório

1. Nos presentes autos de insolvência de pessoa coletiva, em que é recorrente A., Ld.ª e são recorridos o B., S.A., C., Ld.ª e outros, foi interposto recurso do acórdão do Tribunal da Relação de Évora, de 19 de maio de 2016, ao abrigo do artigo 70.º, n.º 1, alínea b), da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (Lei do Tribunal Constitucional, referida adiante pela sigla «LTC»).

2. Pela Decisão Sumária n.º 636/2016, decidiu-se, ao abrigo do disposto no artigo 78º-A, n.º 1, da LTC, não tomar conhecimento do objeto do recurso interposto. Tal decisão tem a seguinte fundamentação:

«De acordo com a alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC, cabe recurso para o Tribunal Constitucional das decisões dos tribunais que apliquem norma cuja inconstitucionalidade haja sido suscitada durante o processo. A questão de constitucionalidade deve ser suscitada de modo processualmente adequado perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida (artigo 72.º, n.º 2, da LTC), em termos de este estar obrigado a dela conhecer. (artigo 72.º, n.º 2, da LTC).

Ora, nos presentes autos, não pode dar-se como verificado o requisito da suscitação prévia, perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida, da questão de constitucionalidade identificada pela recorrente no seu requerimento de interposição do presente recurso. De acordo com tal requerimento, a recorrente pretende a apreciação da constitucionalidade da norma «dos n.ºs 2 e 3 do artigo 30.º e no n.º 3 do artigo 36.º da LGT, em virtude das alterações introduzidas a esse artigo pela Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro, quando conjugado com o artigo 215.º do CIRE e interpretado no sentido de que «o plano de insolvência, aprovado com o voto contrário da Fazenda Nacional, que inclui a redução dos créditos fiscais (...) é manifestamente violador das normas imperativas [e não negligenciáveis] plasmadas nos n.ºs 2 do artigo 30.º, e 3 do artigo 36.º, ambos da LGT».

Contudo, na alegação do recurso interposto para o Tribunal da Relação de Évora, não suscitou qualquer questão inconstitucionalidade normativa, designadamente aquela que constitui objeto do presente recurso. Em tal peça processual a recorrente limita-se a sustentar que «a procedência do pedido de não homologação do Plano por suposta violação de normas aplicáveis apenas ao conteúdo respeitante aos créditos da Fazenda Nacional constitui naturalmente uma violação grosseira do princípio constitucional da proporcionalidade».

Importa concluir, assim, que não suscitou qualquer questão de inconstitucionalidade normativa, reportada aos artigos 30.º, n.os 2 e 3 e 36.º, n.º 3, da Lei Geral Tributária (LGT) e ao artigo 215.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresa (CIRE), antes assacando a alegada infração constitucional à própria decisão judicial de não aprovação do plano de insolvência, segundo o argumento de que tal constitui uma violação grosseira do princípio constitucional da proporcionalidade.

A não verificação deste requisito do recurso de constitucionalidade obsta a que este Tribunal possa conhecer do objeto do presente recurso, justificando-se, dessa forma, a prolação da presente decisão sumária (artigo 78.º-A, n.º 1, da LTC).»

3. Da transcrita decisão sumária vem agora a recorrente reclamar para a conferência, ao abrigo do disposto no n.º 3 do artigo 78.º-A da LTC, invocando os seguintes argumentos:

«(…)

17. O recurso é interposto ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LOTC e tem em vista a apreciação da inconstitucionalidade dos n.ºs 2 e 3 do artigo 30.º e no n.º 3 do artigo 36.º da LGT, em virtude das alterações introduzidas a esse artigo pela Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro, quando conjugado com o artigo 215.º do CIRE e interpretado no sentido de que “o plano de insolvência, aprovado com o voto contrário da Fazenda Nacional, que inclui a redução dos créditos fiscais (...) é manifestamente violador das normas imperativas [e não negligenciáveis] plasmadas nos n.ºs 2 do artigo 30.º, e 3 do artigo 36.º, ambos da LGT

18. Bem sabe a Recorrente que a fiscalização da constitucionalidade, nestes casos, obedece a diversos requisitos e pressupostos de admissibilidade.

19. De entre esses, é pressuposto da admissibilidade a suscitação prévia questão de constitucionalidade normativa que se invoca.

20. Sendo que, no caso, considerou o Exmo. Senhor Juiz Conselheiro Relator, na sua decisão sumária ora em reclamação, que a Recorrente “não suscitou qualquer questão de inconstitucionalidade normativa, reportada aos artigos 30.º, n.ºs 2 e 3 e 36.º n.º 3, da Lei Geral Tributária (LGT) e ao artigo 215.º do Código da Insolvência e Recuperação de Empresas (CIRE), antes assacando a alegada infração constitucional à própria decisão judicial de não aprovação do plano de insolvência, segundo o argumento de que tal constitui uma violação grosseira do princípio constitucional da proporcionalidade.”

21. Ora, salvo o devido respeito – que é muito – mal andou o Exmo. Senhor Juiz Conselheiro Relator ao considerar desta forma.

22. Não só porque, ao longo da sua fundamentação, vai o Exmo. Senhor Juiz Conselheiro Relator mencionando indiferenciadamente a ausência desse “requisito do recurso e constitucionalidade e a não verificação de pressupostos de admissibilidade”.

Quando bem sabe, certamente, o Exmo. Senhor Juiz Conselheiro Relator os requisitos específicos do requerimento de interposição do recurso de constitucionalidade e aquilo que são pressupostos de admissibilidade do recurso de constitucionalidade não são uma e a mesma coisa.

Nem é indiferente que se considerem em falta os pressupostos de admissibilidade ou os requisitos do recurso.

Pois que, ainda que uns e outros determinem, em última instância, o indeferimento do recurso (cfr. decorre do disposto no n.º 2 do artigo 76.º da LTC), quando esteja em causa a omissão dos segundos [dos requisitos] “o juiz convidará o requerente a prestar essa indicação no prazo 10 dias” (cfr. decorre do disposto no n.º 5 do artigo 78-A.º da LTC).

E se é certo, por um lado, que o alegadamente em falta seria, na verdade – e caso estivesse efetivamente em falta – um pressuposto – o que obstaria desde já à apreciação do objeto do recurso.

23. Não menos certo, por outro lado, é que, ao contrário da conclusão a que chega o Exmo. Senhor Juiz Conselheiro Relator, a dita inconstitucionalidade havia já sido suscitada pela Recorrente no recurso de Apelação da douta sentença proferida em 1.ª instância.

24. E, embora não tenha merecido acolhimento, visto que nem tão pouco chegou a ser apreciada – o que desde logo redunda numa omissão de pronúncia por parte desse Tribunal – facto é que, no modesto entendimento da Recorrente, a questão foi suscitada de forma clara e bastante.

A propósito, refere-se a dada altura nas alegações do recurso interposto para o Tribunal da Relação, parcialmente transcritas pela Recorrente no seu Requerimento de interposição de Recurso para esse Venerando Tribunal Constitucional, o seguinte:

“Que, “prejudicados” já pela clara preferência dada a esse credor em virtude da classificação dos seus créditos e das suas inúmeras prorrogativas de cobrança, se furtam com essa solução a ser duplamente prejudicados, pela imposição de não homologação do Plano e consequente impossibilidade (ou acréscimo da dificuldade) de recuperação do seu crédito pela via que maioritariamente aprovaram.

É que, como não poderá deixar de se realçar, os créditos da Fazenda Nacional ainda que considerado o montante reclamado e que não corresponde, reitere-se, ao devido são claramente minoritários face à generalidade dos credores.

Pois que estão em causa mais...

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