Acórdão nº 510/18 de Tribunal Constitucional (Port, 17 de Outubro de 2018

Magistrado ResponsávelCons. Joana Fernandes Costa
Data da Resolução17 de Outubro de 2018
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 510/2018

Processo n.º 447/2018

3ª Secção

Relator: Conselheira Joana Fernandes Costa

Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional

1. No âmbito dos presentes autos, vindos do Supremo Tribunal de Justiça, em que é recorrente A. e recorrido o Conselho Superior da Magistratura, foi interposto recurso, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei do Tribunal Constitucional («LTC»), do acórdão proferido por aquele Tribunal, em 22 de março de 2018, que negou provimento ao recurso contencioso interposto da Deliberação do Plenário do Conselho Superior da Magistratura, de 6 de junho de 2017.

2. Por deliberação do Plenário do CSM, datada de 21.12.2015, foi aplicada ao ora recorrente a pena disciplinar de demissão, pena essa que foi mantida no Acórdão da Secção do Contencioso do Supremo Tribunal de Justiça, proferido em 22.2.2017, pendente de recurso para o Tribunal Constitucional.

Para efeitos de atribuição do subsídio de desemprego, o ora recorrente requereu ao Presidente do Conselho Superior da Magistratura a substituição do modelo que lhe havia sido entregue pela Direção Geral da Administração da Justiça, por outro, que, ao invés daquele, fizesse referência ao processo de inaptidão para o exercício da profissão e não a «justa causa de despedimento por facto imputável ao trabalhador».

Por despacho datado de 31.3.2017, o Vice-Presidente do Conselho Superior da Magistratura concluiu ser mais adequado o preenchimento do modelo através da referência a facto imputável ao trabalhador.

De tal despacho, reclamou o ora recorrente, em 4.5.2017, para o Plenário do Conselho Superior da Magistratura, tendo este, por deliberação de 6.6.2017, julgado improcedente a reclamação.

Inconformado com tal deliberação, o ora recorrente interpôs recurso contencioso para o Supremo Tribunal de Justiça, pedindo, a final, que a mesma fosse anulada.

Por acórdão datado de 22.3.2018, o Supremo Tribunal de Justiça negou provimento ao recurso.

Deste acórdão, recorreu, por último, o ora recorrente para o Tribunal Constitucional.

3. No segmento que aqui releva, consta do acórdão recorrido a seguinte fundamentação:

«3.2. A questão fulcral que o recorrente coloca no presente recurso consiste em saber se o modelo para pedido da prestação de subsídio de desemprego, requerido pelo recorrente ao recorrido, não deve assinalar «justa causa de despedimento por facto imputável ao trabalhador», antes devendo aludir a «despedimento por inadaptação superveniente ao posto de trabalho».

Segundo o recorrente, o motivo pelo qual foi demitido não se prende com despedimento com justa causa e, por isso, não podia aceitar o formulário que lhe foi apresentado pela DGAJ.

Mais alega que o que consta da deliberação do Plenário do CSM de 21/12/15, é que a pena de demissão foi aplicada com fundamento em «definitiva incapacidade de adaptação às exigências da função de magistrado judicial e de inaptidão para o exercício do cargo».

Pelo que, alega ainda, o motivo da cessação da relação laboral que deverá ser indicado no referido modelo é o alusivo à inaptidão/inadaptação, pois que só esta está em conformidade com o princípio da proporcionalidade previsto nos arts.18º, da CRP e 7º, do CPTA, sendo manifestamente desnecessário o modo de preenchimento que constava do modelo exibido ao ora recorrente.

Alega, também, que a deliberação impugnada é ilegal, ao não ordenar que se diligencie pela imediata entrega da declaração do modelo de subsídio de desemprego nos termos solicitados, e inválida, por propugnar uma interpretação inconstitucional das normas constantes dos arts.34º, n.º 2 e 95º, n.º 1, als. a) e c), do EMJ, por violação dos princípios da dignidade humana, do Estado de Direito, da igualdade, da justiça, da legalidade, da necessidade, da proporcionalidade e da adequação, previstos nos arts. lº, 2º, 3º, 13º e 18º, da CRP, e, ainda, por violação do direito à assistência material quando o trabalhador involuntariamente se encontre numa situação de desemprego, previsto no art.59º, n.º 1, al. e), e do direito à segurança social, previsto no art.63º, ambos da CRP.

Conclui, assim, que deve ser anulada a deliberação em causa, devendo o recorrido ser condenado no preenchimento e entrega do modelo atrás identificado, nos termos defendidos pelo recorrente, o qual deve ser preenchido por referência à cessação da relação laboral no dia 22/2/17.

[…]

Vejamos.

Dir-se-á, antes do mais, que, pretendendo o recorrente, no fundo, ter acesso às prestações do subsídio de desemprego, e tendo já tido a possibilidade de ter em seu poder o documento que lhe permitia esse acesso, rejeitou o mesmo apenas por não concordar com o facto de aí se assinalar: «justa causa de despedimento por facto imputável ao trabalhador».

Não alega o recorrente que essa circunstância fosse impeditiva do exercício do seu direito àquele subsídio, antes parecendo, até, que carece de interesse em agir (sobre o interesse em agir, a propósito da pretendida anulação de uma deliberação do CSM, pode ver-se o Acórdão do STJ, de 10/12/09, proferido nos processos n.ºs 3415/06 e 2085/07).

Na verdade, não vem invocada uma situação que demande uma necessidade justificada, razoável e fundada de se lançar mão do presente recurso para se anular a deliberação recorrida.

Note-se que a atribuição do subsídio de desemprego - uma das modalidades das prestações sociais de desemprego (cfr. o n.º 1, do art.7º, do DL n.º 220/2006, de 3/11 - pressupõe que o pretenso beneficiário se encontre numa situação de desemprego involuntário (n.º I, do art. 2º, daquele diploma).

E o desemprego considera-se involuntário sempre que a cessação do contrato de trabalho decorre da iniciativa do empregador (al. a), do n.º 1, do art.9º, do mesmo diploma), sendo que se presume a involuntariedade se o fundamento invocado pelo empregador constituir justa causa de cessação da relação laboral e o trabalhador fizer prova de interposição de ação judicial contra aquele (cfr. o n.º 2, do mesmo art. 9º, e o Acórdão da 2ª Secção do Contencioso Administrativo do STA, de 7/4110, proferido no proc. n.º 0l057 e acessível in www.dgsi.pt).

Por isso que, no caso, tendo o recorrente impugnado contenciosamente a deliberação que lhe aplicou a pena de demissão, é de considerar que o mesmo se encontra numa situação de desemprego involuntário, satisfazendo, pois, essa condição para que seja reconhecido como titular do direito ao subsídio de desemprego (cfr. o art.8º, n.º l, do citado DL n.º 220/2006).

Assim sendo, podia este Tribunal, prima facie, abster-se de conhecer do mérito da causa, por falta do aludido interesse em agir.

De todo o modo, sempre se dirá que o direito à assistência material na eventualidade de desemprego involuntário foi constitucionalmente reconhecido aos trabalhadores (cfr. alínea e) do n.º l do artigo 59. º), sendo tido como uma das traves mestras do sistema de proteção social (cfr. ainda o n.º 3 do artigo 63. º da Lei Fundamental),

[…]

Ora, tendo presente que o recorrente incorreu em responsabilidade disciplinar e que foi isso que determinou a aplicação da mencionada sanção disciplinar, é manifesto que a cessação da relação jurídica que o recorrente mantinha não é reconduzível aos quadros do despedimento por inadaptação.

Não há, pois, que confundir os juízos fáctico-jurídicos - entre os quais avultam a definitiva incapacidade de adaptação às exigências da função e a inaptidão profissional para o cargo - que constituem os pressupostos específicos da imposição daquela sanção disciplinar com a situação da inadaptação profissional que legitima o despedimento acima aludido.

De resto, a circunstância de os elementos concretizadores deste conceito estarem claramente tipificados nas diversas alíneas que compõem o n.º 1 do artigo 374.º do Código do Trabalho inviabilizaria qualquer interpretação como a que é sustentada pelo recorrente.

Refira-se, também, que o preenchimento do formulário em questão constitui um mero ato material de execução, sendo, pois, impassível de ser confundido com um ato administrativo. Por isso, mal se percebe que se convoque um dos vetores pelos quais se avalia a conformidade legal dos atos da administração - o princípio da proporcionalidade (n.º 2 do artigo 6.º da Constituição da República Portuguesa e artigo 7.º do Código do Procedimento Administrativo) - para sustentar as pretensões em apreço.

Seja como for, ao recorrente não assiste o direito a que o dito formulário seja preenchido em moldes diferentes.

Aliás, a inclusão daquela menção revela-se, como vimos, coerente com o motivo pelo qual cessou o vínculo jurídico do recorrente.

Deste modo, não obstante ser incontroversa a admissibilidade adjetiva da cumulação do pedido de anulação da deliberação com o pedido de condenação da administração na prática do ato devido (cfr. as als. a) e c), do n02, do art.4º, do CPTA), o que é certo é que, no caso, não assiste ao recorrente o direito a que o formulário em questão seja preenchido nos termos que pretende.

Acresce que, uma vez que a interposição de recurso para este Supremo Tribunal de Justiça da deliberação que aplicou ao recorrente a sanção disciplinar de demissão não possui, em regra, eficácia suspensiva (n.º 1 do artigo 170.º do Estatuto dos Magistrados Judiciais), carece, em absoluto, de sustentação que o formulário em questão seja preenchido com referência à data em que foi proferido o acórdão mencionado no ponto n.º 7 dos factos provados (22/2/17).

Dir-se-á, por último, que, tendo o recorrente invocado várias inconstitucionalidades, não as fundamentou devidamente, sendo que, por nossa parte, também não as vislumbramos.

Aliás, nem se vê que, na deliberação em causa, haja sido aplicada ou...

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