Acórdão nº 51/19 de Tribunal Constitucional (Port, 23 de Janeiro de 2019

Magistrado ResponsávelCons. Joana Fernandes Costa
Data da Resolução23 de Janeiro de 2019
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 51/2019

Processo n.º 986/2017

3.ª Secção

Relator: Conselheira Joana Fernandes Costa

Acordam na 3ª Secção do Tribunal Constitucional

I – Relatório

1. No âmbito dos presentes autos, vindos do Tribunal da Relação do Porto, em que é recorrente A. e recorrido o Ministério Público, foi interposto recurso, ao abrigo do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei do Tribunal Constitucional («LTC»), (i) do acórdão proferido por aquele Tribunal, em 22 de março de 2017, que negou a provimento ao recurso interposto do despacho proferido pela Instância Central, Secção Criminal – J2, de Penafiel, da Comarca do Porto Este, que indeferira a reclamação apresentada pela ora recorrente contra o valor dos honorários fixados pela sua intervenção no processo; (ii) do acórdão proferido pelo mesmo Tribunal, em 10 de maio de 2017, que julgou procedente a arguição de nulidade imputada àquele primeiro e, suprindo-a, considerou não se verificar o vício de inconstitucionalidade anteriormente invocado; e, por último, (iii) do acórdão proferido pelo mesmo Tribunal, em 21 de junho de 2017, que indeferiu a nulidade imputada ao aresto datado de 10 de maio de 2017.

2. No âmbito do processo comum coletivo que correu termos na Instância Central, Secção Criminal – J2, de Penafiel, da Comarca do Porto Este, a ora recorrente interveio, na qualidade de defensora oficiosa de um dos arguidos no processo, na audiência de julgamento que teve lugar no dia 26 de junho de 2015, assegurando a respetiva defesa, entre outras, na sessão que decorreu entre as 9h30m e as 13h, bem como naquela que, após interrupção determinada pelo Juiz Presidente, teve inicio às 14h15m do mesmo dia.

Através de requerimento dirigido ao Juiz titular do processo, em 27 de maio de 2016, a ora recorrente solicitou que aquela sua intervenção na audiência de julgamento fosse contabilizada, para efeitos de fixação e pagamento de honorários, como correspondendo a duas sessões.

Por despacho datado de 23 de setembro de 2016, tal requerimento foi indeferido.

3. Inconformada, a ora recorrente recorreu para o Tribunal da Relação do Porto, tendo formulado, entre outras, a seguinte conclusão:

«33.º - De qualquer modo, acaso assim não venha a ser entendido, sempre se dirá que a interpretação conjugada do disposto no artigo 25.º, n.º 1, da Portaria n.º 10/2008, de 03/01, do n.º 9 da Tabela de Honorários para a Proteção Jurídica anexa à Portaria n.º 1386/2004, de 10/11, conjugado com a revogação da Nota 1 operada pelo artigo 2.º, alínea a), da Portaria n.º 210/2008, de 29/02, no sentido de que deve contabilizar-se, para efeitos de pagamento de honorários ao respetivo Advogado/Patrono, como uma única sessão o ato ou diligência que decorra no período da manhã de um determinado dia e, depois de interrompido, no período da tarde desse mesmo dia, e como duas sessões autónomas o ato ou diligência que decorra naqueles mesmos períodos de dias diferentes, está ferida de INCONSTITUCIONALIDADE por violação do disposto nos artigos 59.º, n.º 1, al. a) e 208.º da Constituição da República Portuguesa (CRP), bem como o consignado no artigo 2.º da mesma CRP, que consagra o princípio fundamental do Estado de Direito, a que são inerentes as ideias de jurisdicidade, constitucionalidade e direitos fundamentais, concretizado nos subprincípios do Estado constitucional ou da constitucionalidade, da independência dos Tribunais e do acesso à justiça, da prevalência da lei. da segurança jurídica e da confiança dos cidadãos e das garantias processuais e procedimentais ou do justo procedimento».

4. Por acórdão proferido em 22 de março de 2017, o Tribunal da Relação do Porto negou provimento ao recurso, invocando, para o efeito, os fundamentos seguintes:

«II. A recorrente suscita para apreciação nesta instância, tal como emerge das conclusões apresentadas que delimitam o objeto e âmbito do recurso (art. 412.º, n.º 1, do CPP), se para efeitos de cálculo dos seus honorários se deve considerar que há lugar a uma nova sessão sempre que o julgamento é interrompido, salvo se tal interrupção ocorrer no mesmo período da manhã ou da tarde.

Importa desde logo, salientar que o acórdão desta Relação citado pela recorrente foi subscrito pela ora relatora enquanto adjunta, pelo que nada há a alterar ao que então foi decidido.

Na verdade, a Portaria 1386/2004, de 10.11, surgiu na sequência da Lei n.º 34/2004, de 29.07, que procedeu a profundas alterações ao regime de acesso ao direito e aos tribunais, e definia os “termos em que o Estado garante a remuneração dos profissionais forenses pelos serviços prestados no âmbito da proteção jurídica, bem como o reembolso das respetivas despesas”.

Esta Portaria continha uma nota 1 que considerava haver lugar a nova sessão sempre que o ato ou diligência fossem interrompidos, exceto se tal interrupção ocorresse no mesmo período da manhã ou da tarde.

Essa nota foi revogada pela Portaria n.º 210/2008, de 29.02, que revogou também a Portaria n.º 10/2008, que tinha revogado aquela primeira, sem efeitos produzidos, face à revogação da norma revogatória pela portaria n.º 210/2008, mantendo-se em vigor a Portaria n.º 1386/2004, com alterações, entre as quais se verifica a manutenção do número 9 da tabela de honorários para proteção jurídica que diz que há lugar a pagamento por cada sessão a mais, quando a diligência comporte mais do que uma sessão. E é o que se deve entender por sessão o que aqui importa.

Se a nota 1 da Portaria 1386/2004 definia concretamente o que deveria entender-se por nova sessão, a revogação dessa nota alterou tudo, deixando agora de poder considerar-se que cada interrupção de manhã para a tarde constitui uma nova sessão.

Estas alterações e outras que lhes sucederam, sem prejuízo do que se mantém da Portaria 1386/2004, só podem significar que o legislador quis afastar essa definição, passando agora a considerar-se nova sessão só se a interrupção for para outro dia, de resto, numa política de contenção de despesas de que o art. 5.º também é testemunha.»

5. Novamente inconformada, a ora recorrente arguiu a nulidade do referido aresto por omissão de pronúncia, alegando que o Tribunal ad quem não conhecera da questão de constitucionalidade suscitada no âmbito do recurso.

Por acórdão datado de 10 de maio de 2017, o Tribunal da Relação do Porto julgou procedente a arguição de nulidade e, suprindo-a, considerou não verificado o vício de inconstitucionalidade invocado pela ora recorrente.

Fê-lo nos seguintes termos:

«Outra questão foi suscitada, sem que tenha havido pronúncia sobre ela, o que, conforme alega a recorrente, constitui nulidade por omissão de pronúncia que agora se supre. Tal questão tem que ver com a invocada inconstitucionalidade da interpretação conjugada do disposto no art. 25.º, n.º 1, da Portaria n.º 10/2009, de 03.01, do n.º 9 da Tabela de honorários para a proteção jurídica anexa à Portaria n.º 1386/2004, de 10/11, conjugado com a revogação da Nota I operada pelo art. 2.º, al. a), da Portaria n.º 21012008, de 29.02, no sentido de que deve contabilizar-se, para efeitos de honorários ao patrono oficioso, como uma única sessão o ato ou diligência que decorra no período da manhã de um determinado dia e, depois interrompido, no período da tarde desse mesmo dia, e como duas sessões autónomas o ato ou diligência que decorra em dias diferentes.

O entendimento expresso quanto à primeira questão suscitada não se vê inconstitucional, pois de outro modo não seria assim adotado, não se vendo nele qualquer violação do princípio fundamental do estado de direito democrático consagrado no art. 2.º da CRP, concretizado nos subprincípios invocados pela recorrente e outros que eventualmente tenha omitido».

6. Uma vez mais inconformada, a ora recorrente arguiu a nulidade do aludido acórdão, imputando-lhe o vício de omissão de pronúncia.

Por acórdão proferido em 21 de junho de 2017, o Tribunal da Relação do Porto indeferiu a arguição da aludida nulidade.

7. O requerimento de interposição do recurso tem o seguinte teor:

Não se conformando com os acórdãos proferidos em 22 de março de 2017, 10 de maio de 2017 e 21 de junho de 2017 por este Tribunal da Relação, deles vem interpor recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo do disposto no artigo 280º, nº1, alínea b) e nº 4 da Constituição da República Portuguesa e nos artigos 70º, nº1, alínea b) e nº 2, 75º-A, e 78º, nº4, da Lei do Tribunal Constitucional aprovada pela Lei nº 28/82, de 15 de novembro (com as alterações que têm vindo sucessivamente a ser-lhe introduzidas), a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito suspensivo.

As normas e princípios constitucionais que se consideram violados são os seguintes:

a) A conjugação do disposto no artigo 25º, nº1, da Portaria nº 10/2008, de 03 de janeiro, no nº 9 da Tabela de Honorários para a Proteção Jurídica anexa à Portaria nº 1386/2004, de 10 de novembro conjugado com a revogação da Nota 1 da mesma tabela operada pelo artigo 2º, alínea a), da Portaria nº 210/2008, de 29 de fevereiro, quando interpretada no sentido de que deve contabilizar-se, para efeitos de pagamento de honorários ao respetivo Advogado/Patrono, como uma única sessão o ato ou diligência que decorra no período da manhã de um determinado dia e, depois de interrompido, no período da tarde desse mesmo dia, e como duas sessões autónomas o ato ou diligência que decorra naqueles mesmos períodos de dias diferentes;

b) Esta interpretação que o Tribunal da Relação do Porto fez das ditas normas legais briga frontalmente com o disposto nos artigos 59º, nº 1, alínea a) e 208º, da Constituição da República Portuguesa (CRP), bem como com o consignado no artigo 2º da...

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