Acórdão nº 79/19 de Tribunal Constitucional (Port, 05 de Fevereiro de 2019

Magistrado ResponsávelCons. Joana Fernandes Costa
Data da Resolução05 de Fevereiro de 2019
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 79/2019

Processo n.º 463/2017

3ª Secção

Relator: Conselheira Joana Fernandes Costa

Acordam na 3ª Secção do Tribunal Constitucional

I. Relatório

1. No âmbito dos presentes autos, vindos do Tribunal Central Administrativo Norte, em que é recorrente A. e recorrido o Conselho de Acompanhamento dos Julgados de Paz, foi interposto recurso, ao abrigo do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei do Tribunal Constitucional («LTC»), do acórdão proferido por aquele Tribunal, em 18 de novembro de 2016, que negou provimento ao recurso interposto do acórdão proferido pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, datado de 14 de março de 2013, que julgou improcedente a ação de impugnação proposta pela ora recorrente, tendo em vista invalidar a deliberação, aprovada pelo ora recorrido, que indeferira o seu pedido de renomeação como juiz de paz.

2. A ora recorrente intentou contra o Conselho de Acompanhamento dos Julgados de Paz, ora recorrido, uma ação administrativa especial, tendo em vista a impugnação da Deliberação n.º 30/2010, de 27 de maio de 2010, aprovada por aquele órgão, através da qual fora indeferido o seu pedido de renomeação como juiz de paz.

Por acórdão proferido pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, datado de 14 de março de 2013, a ação foi julgada improcedente.

Inconformada, a ora recorrente recorreu para o Tribunal Central Administrativo Norte, que, por acórdão datado de 18 de novembro de 2016, negou provimento ao recurso.

3. No recurso interposto para o Tribunal Central Administrativo Norte, a ora recorrente formulou, entre outras, as seguintes conclusões:

«D. DA DECISÃO RECORRIDA

[…]

b) Da violação do princípio da separação de poderes e da independência

i. Na presente ação foi ainda peticionado que fosse declarada inconstitucional a interpretação que o Recorrido, faz do n.º 1 do artigo 25.º da Lei n.º 78/2001, de 13 de Julho e dos artigos 11.º do D.L. n.º 329/2001 de 20.12, 29.º da Lei n.º 78/2001, 6.º da Declaração n.º 125/2006, publicado em D.R., 2.ª série, n.º 165 de 28.08, alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 7.º do DL n.º 427/89, de 07.12 e alínea a) do artigo 25.º da Lei n.º 51/2005 de 30.08, no sentido de que o desempenho de funções como juiz de paz não é vitalício, tal como, sucede com os juízes dos tribunais judiciais.

ii. Tendo o Tribunal a quo, decidido que não é incompatível com a constituição a interpretação, daquelas normas, no sentido de que o desempenho de funções como juiz de paz não é vitalício, cessando no final da comissão de serviços de três anos, sendo-lhe aplicável para o efeito o regime da função pública.

iii. Ora, também quanto ao aqui decidido, não concorda a Recorrente.

iv. Admitindo a aqui Recorrente que a lei não explicita de modo claro e inequívoco que o desempenho de funções pelos juízes de paz é vitalício, entende ser claro que essa é a única interpretação suscetível de defender os princípios da separação de poderes e da imparcialidade dos juízes constitucionalmente consagrados.

v. E, nesse sentido se pronunciou o TCAN, no Processo n.º 1019/07.6 BEPRT.

vi. Também a doutrina se vem pronunciando nesse sentido:

vii. Assim, GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA, não têm dúvidas em afirmar que “pela inserção sistemática é imperativo tratar-se de um tribunal (e não de um sistema extrajudicial), dotado de utilidade própria” (Gomes Canotilho e Vital Moreira, Ob. cit., p. 554);

viii. Do mesmo modo, defendem JORGE MIRANDA e RUI MEDEIROS que “do modo como o legislador ordinário concretizou a credencial constitucional, pode concluir-se que os julgados de paz estão, em boa verdade, subordinados ao regime da categoria dos tribunais judiciais” e que essa subordinação “constitui uma assimilação material dos tribunais judiciais” (Jorge Miranda e Rui Medeiros, Constituição Portuguesa Anotada, Tomo III, Coimbra Editora, 2007, p. 110).

ix. Razão pela qual “Da aplicabilidade das referidas garantias constitucionais aos juízes de paz resulta a inconstitucionalidade da norma do artigo 29, da Lei n.º 78/2001, de 13 de julho, quando interpretada no sentido de tornar aplicável aos juízes de paz direitos e deveres do regime de função pública incompatíveis com aquelas garantias constitucionais” (Jorge Miranda, Ob. Cit., p. 113).

x. Também a jurisprudência do Tribunal Constitucional, tem dado passos claros no sentido da necessária equiparação dos juízes de paz, aos juízes dos tribunais judiciais, ao decidir que “o núcleo funcional das funções exercidas e o respetivo enquadramento institucional, nos termos em que a Constituição o recorta” pelos Juízes de Paz, impõe indubitavelmente ao legislador ordinário “a adoção de critérios que permitam o exercício do poder jurisdicional nas condições exigidas pelo genoma iuris que materialmente o compõem” (Ac. Tribunal Constitucional n.º 250/2009, de 18.05.2009).

xi. Ora, decidindo o Tribunal a quo em sentido diverso do peticionado pela aqui Recorrente, atuou em evidente erro de julgamento, na medida em que o decidido atenta de modo contundente, contra os princípios da separação de poderes e da independência constitucionalmente consagrados.»

4. Para negar provimento ao recurso, o Tribunal Central Administrativo Norte invocou, no segmento que ora releva, os fundamentos seguintes:

«II - Questões a apreciar

Importa apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, sendo que o objeto do Recurso se acha balizado pelas conclusões expressas nas respetivas alegações, nos termos dos Artº 5º, 608º, nº 2, 635º, nº 3 e 4, todos do CPC, ex vi Artº 140º CPTA, impondo-se verificar, designadamente, as suscitadas, falta de fundamentação, violação do princípio da separação de poderes, violação do princípio da igualdade e da justiça, para além, se for caso disso, dos pedidos subsidiários de recurso apresentados pela Entidade Recorrida.

III – Fundamentação de Facto

O Tribunal a quo, considerou a seguinte factualidade:

“A) Por deliberação n.º 171/2004, publicada no Diário da República de 12 de janeiro foi a Autora, conjuntamente com outros candidatos, nomeada Juiz de Paz e colocada no Julgado de Paz do Porto.

B) A Autora iniciou funções no Julgado de Paz do Porto em 15 de abril de 2004.

[…]

K) Em 09/01/2007 o Conselho de Acompanhamento dos Julgados de Paz aprovou a deliberação n.º 3/2007, com o seguinte teor:

“O Conselho de Acompanhamento dos Julgados de Paz, atento o disposto no art.º 25.º delibera comunicar à Sr.ª Juíza de Paz do Julgado de Paz do Porto, Dr.ª A., que cessará a comissão de serviço como Juiz de Paz no fim do triénio para que foi nomeada, ou seja, em 15 de abril de 2007”

L) A deliberação a que se alude em K) foi comunicada à Autora através do ofício datado de 17/01/2007

[…]

P) Em 07/03/2007, a Autora dirigiu ao Senhor Presidente do Conselho de Acompanhamento de Julgados de Paz um requerimento com o seguinte teor:

“MAACG, Juíza de Paz do Julgado de Paz do Concelho do Porto (…), completando-se, no próximo dia 15 de abril de 2007, no que respeita à pessoa da requerente, o período de três anos de exercício das suas funções de juíza de paz no Julgado de Paz do Porto, atento o disposto no artigo 25.º da Lei n.º 78/2001, de 13.07, vem (…) requerer a V. Ex.ª a sua colocação num dos seguintes Julgados de Paz, e por esta ordem de preferências:

[…]

Q) Sobre o requerimento referido em P), em 08/03/2007, o Conselho de Acompanhamento dos Julgados de Paz tomou a deliberação n.º 8/2007, cujo teor ora se transcreve:

“O Conselho de Acompanhamento dos Julgados de Paz ponderou o requerimento da Exm.ª Sr.ª Dr.ª A., de 7 de março de 2007, através do qual pediu a colocação como Juíza de Paz, em Santa Maria da Feira ou Trofa ou Poiares. Após debate, o Conselho concluiu que, sem necessidade de outros considerandos, atento o Regulamento de Nomeações de Juízes de Paz (n.º 131/2006, publicado no Diário da República, 2.ª Série, de 14 de julho de 2006), tal requerimento carece de justificação normativa porque o Conselho não abriu concurso para o efeito em causa, que teria de ser abrangente de todos os Juízes de Paz. Como assim, o Conselho delibera indeferir o referido requerimento, do que deverá ser dado conhecimento à Requerente […]

S) Com data de 12/04/2010, a Autora remeteu ao Conselho de Acompanhamento dos Julgados de Paz um requerimento, com o seguinte teor:

“A., tendo sido nomeada como requereu, Juíza de Paz para exercer funções no Julgado de Paz do Porto no triénio com início em 15/04/2004 a 15/04/2007 e no seguimento do também pedido de nomeação/renomeação para o triénio de 15/04/2007 a 15/04/2010, requerer nos mesmos termos a sua nomeação/renomeação como Juíza de Paz para exercer funções no Julgado de Paz do Porto para o triénio com início em 15/04/2010 a 15/04/2013”

T) Em 29/04/2010 o Conselho de Acompanhamento dos Julgados de Paz tomou a deliberação n.º 26/2010, da qual consta:

“O Pleno do Conselho de Acompanhamento dos Julgados de Paz delibera mandar comunicar à Sr.ª Dr.ª MAACG, por c.r. com a a.r. que, provavelmente na próxima sessão, será tomada deliberação definitiva quanto ao seu requerimento recebido em 14 de Abril de 2010, perspetivando: que a inexistência de concurso para nomeação de Juiz de Paz para o Julgado de Paz do Porto conduzirá à improcedência daquele requerimento, prejudicando a eventualidade de quaisquer outras considerações”

U) A deliberação aludida em T) foi comunicada à Autora através do ofício datado de 06/05/2010

V) Na sequência da comunicação da deliberação referida em T), a Autora dirigiu ao Senhor Presidente do Conselho de Acompanhamento de Julgados de Paz um requerimento com o seguinte teor:

“(…) - Encontra-se pendente no Tribunal Central Administrativo do Norte, sob o n.º 1019/07.6BEPRT, ação judicial por via da qual a...

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