Acórdão nº 159/19 de Tribunal Constitucional (Port, 13 de Março de 2019

Magistrado ResponsávelCons. Catarina Sarmento e Castro
Data da Resolução13 de Março de 2019
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 159/2019

Processo n.º 43/16

2.ª Secção

Relator: Conselheira Catarina Sarmento e Castro

Acordam na 2. ª Secção do Tribunal Constitucional,

I – Relatório

1. Nestes autos, vindos do Supremo Tribunal de Justiça, a A. interpôs recurso, ao abrigo do artigo 70.º, n.º 1, alínea b), da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (Lei da Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional, doravante designada por LTC).

2. O presente processo tem origem em ação de execução comum, que corre termos no 2.ª Juízo da 2.ª Secção dos Juízos de Execução do Porto, na qual a aqui recorrente figura, juntamente com a B. (Gibraltar) Ltd. e B1 Ag., como executada, sendo exequentes a C. S.A., D. S.A., E., S.A., F. S.A. e G. S.A..

No âmbito de tal ação, instaurada pelas então exequentes, ora recorridas, estas peticionaram que as executadas fossem instadas a liquidar a quantia monetária correspondente à sanção pecuniária compulsória em que foram condenadas no Processo n.º 1279/06.6TVPRT, da 3.ª Secção da 3.ª Vara Cível do Tribunal Judicial do Porto. Mais requereram as exequentes que fosse dispensada a citação prévia das executadas, nos termos dos artigos 812.º-F, n.º 1, e 812.º-C, alínea a), ambos do Código de Processo Civil (adiante mencionado por CPC).

No aludido Processo n.º 1279/06.6TVPRT foi proferido despacho saneador-sentença, em 16 de setembro de 2011, que, no que ora releva, declarou a ilegalidade da atividade desenvolvida pelas executadas em Portugal e da publicidade a essa atividade, adjacente, quanto à ora recorrente, à organização, regulamentação e exploração comercial das competições de caráter profissional disputadas na Federação Portuguesa de Futebol, no desempenho da qual promove o nome, marca e/ou imagem dos sítios da internet das outras executadas (www…..com e www…..com), as quais, por sua vez, se dedicam à exploração, através de meios eletrónicos, de jogos de fortuna ou azar, modalidades afins destes jogos e jogos sociais. As executadas foram ainda condenadas a abster-se de explorar em Portugal, por qualquer forma, jogos de lotaria e apostas mútuas, e proibidas de efetuar qualquer publicidade ou divulgação dos sítios da internet www…..com e www…..com bem como às próprias executadas. Por fim, foram solidariamente condenadas, a título de sanção pecuniária compulsória, no pagamento às exequentes da quantia de € 50.000,00, por cada dia que perdurasse a infração a tal proibição.

No processo executivo foi junta certidão, datada de 1 de fevereiro de 2012, da qual consta que o referido despacho saneador-sentença não transitou em julgado, dado que foi do mesmo interposto recurso, a que foi atribuído efeito devolutivo.

A ora recorrente, em 27 de junho de 2012, apresentou nos autos de execução requerimento mediante o qual, invocando o conhecimento da ação executiva contra si instaurada, requereu que se declarasse a nulidade do processo executivo, nos termos do artigo 194.º do CPC, por falta de citação em momento anterior à realização da penhora, conforme o disposto no artigo 941.º, n.º 2, do CPC, reclamando também dos atos de penhora efetuados. Requereu, assim, que o agente de execução fosse intimado a abster-se de praticar atos adicionais de penhora e para que procedesse ao cancelamento imediato e urgente dos já praticados.

Por despacho proferido em 28 de junho de 2012, foi indeferido, nos termos do artigo 45.º, n.º 1, e 812.º-E, n.º 1, alínea a), do CPC vigente à data, o requerimento executivo, com fundamento no facto de não se verificar o trânsito em julgado da sentença que fixou a sanção pecuniária compulsória, consignando-se que não é aplicável o artigo 47.º, n.º 1, parte final do CPC, o que determinou a inexistência de título executivo, e, em consequência, prejudicou a apreciação das questões suscitadas pela executada A., aqui recorrente.

Inconformadas com o referido despacho, as aqui recorridas interpuseram recurso de apelação para o Tribunal da Relação do Porto. Em resposta, a ora recorrente requereu a ampliação do objeto do recurso e interpôs recurso subordinado.

Após vicissitudes processuais várias, concernentes, designadamente, com o efeito atribuído ao recurso de apelação e à citação das executadas, o Tribunal da Relação do Porto, por acórdão prolatado em 25 de novembro de 2014, rejeitou, por um lado, o pedido de ampliação do objeto do recurso e o recurso subordinado interposto pela aqui recorrente, e, por outro lado, concedeu provimento ao recurso interposto pelas recorridas, revogando na íntegra o despacho recorrido.

Por ainda inconformada, a A., aqui recorrente, interpôs recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, invocando o disposto nos artigos 629.º, n.º 2, alínea d), e 854.º, ambos do CPC.

Não obstante tal recurso ter merecido, primeiramente, despacho de admissão no Tribunal da Relação do Porto em 29 de abril de 2015, subidos os autos ao Supremo Tribunal de Justiça, foi proferido despacho que, em 29 de maio de 2015, no que ora releva, não admitiu o recurso interposto nos termos do artigo 629.º, n.º 2, alínea d), do CPC, por não se verificarem os requisitos de que depende a admissão da revista-regra, consagrados no artigo 671.º do mesmo diploma.

Deste despacho reclamou a ora recorrente, nos termos do artigo 652.º, n.º 3, do CPC, ex vi artigo 679.º do mesmo código.

Por acórdão datado de 17 de novembro de 2015, o Supremo Tribunal de Justiça indeferiu a reclamação apresentada, adotando jurisprudência firmada nesse mesmo tribunal, que sintetizou com o sentido de que «só nos casos em que o recurso para o Supremo não seja admissível por causa atinente com o valor da causa ou a alçada do tribunal de que se recorre é que é possível lançar-se mão do disposto na alínea d) do n.º 2 do artigo 629.º do Código de Processo Civil». Com efeito, o tribunal a quo entendeu que a admissibilidade do recurso previsto no artigo 629.º, n.º 2, alínea d), do CPC, depende da verificação dos pressupostos de admissibilidade do recurso previsto no n.º 1 do artigo 671.º do CPC, ou seja, que a decisão de que se pretende recorrer tenha conhecido «do mérito da causa ou tenha posto termo ao processo, absolvendo da instância o réu ou algum dos réus quanto ao pedido ou reconvenção deduzidos».

É este acórdão de não admissão do recurso de revista, datado de 17 de novembro de 2015, que figura como decisão recorrida no âmbito do presente recurso de constitucionalidade.

3. No requerimento de interposição do recurso, a recorrente delimita o objeto respetivo, nos seguintes termos:

«Através do presente recurso, a Recorrente pretende que seja apreciada a constitucionalidade da norma contida na conjugação dos artigos 629.º, n.º 2, alínea d), 671.º, n.º 1, e 854.º do CPC, interpretada no sentido perfilhado na Decisão Recorrida de que o recurso para o Supremo Tribunal de Justiça do acórdão da Relação que esteja em contradição com outro, dessa ou de diferente Relação, no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito, e do qual não caiba recurso ordinário por motivo estranho à alçada do tribunal, não é admissível quando o mesmo não preencha os requisitos do artigo 671.º, n.º 1, do CPC, ou seja, quando o mesmo não conheça do mérito da causa ou ponha termo ao processo, absolvendo da instância o réu ou algum dos réus quanto a pedido ou reconvenção deduzidos».

Entende a recorrente que tal sentido interpretativo «acarret[a] a violação dos princípios da segurança jurídica, da proteção da confiança, da igualdade e da proporcionalidade e do direito de acesso aos tribunais ou princípio da tutela jurisdicional efetiva, consagrados, respetivamente, nos artigos 2.º, 13.º, 18.º e 20.º, todos da CRP».

4. Notificada para apresentar alegações, a recorrente concluiu do seguinte modo:

«1. O artigo 629.º, n.º 2, alínea d), do CPC, repristinou a solução que constara antes da reforma dos recursos de 2007 do artigo 678.º, n.º 4, da versão do CPC então vigente, reabrindo, assim, a possibilidade de acesso ao Supremo Tribunal de Justiça em casos em que tal está vedado por razões estranhas à alçada da Relação, ou seja, em que o impedimento ao recurso não reside no facto de o valor da ação ou da sucumbência não respeitar os limites do n.º 1 do artigo 629.º do CPC, mas noutro motivo de ordem legal.

2. No presente caso, tratando-se de uma execução, o impedimento ao recurso de revista nos termos gerais resulta, desde logo, do facto de não estarmos perante nenhuma das situações em que poderia caber recurso de revista no âmbito das execuções, conforme delimitadas pelo artigo 854.º do CPC.

3. Com efeito, é o próprio artigo 854.º do CPC que ressalva os “casos em que é sempre admissível recurso para o Supremo Tribunal de Justiça” – e um desses casos encontra-se previsto no artigo 629.º, n.º 2, alínea d), do CPC.

4. Em todo o caso, é forçoso concluir que a admissibilidade do recurso de revista para uniformização de jurisprudência, interposto ao abrigo do artigo 629.º, n.º 2, alínea d), do CPC, residiria também no facto de o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto não ser passível de recurso ordinário de revista nos termos gerais para o Supremo Tribunal de Justiça ao abrigo do artigo 671.º do CPC por motivos estranhos à alçada do tribunal.

5. Na Decisão Recorrida, o Supremo Tribunal de Justiça sufraga o entendimento de que, para ser admissível o tipo de recurso previsto no artigo 629.º, n.º 2, alínea d), do CPC, para além dos requisitos próprios, têm ainda de estar preenchidos os pressupostos do recurso ordinário de revista previstos no artigo 671.º, n.º 1, do CPC, ou seja, que o Acórdão da Relação tenha conhecido do mérito ou posto termo ao processo.

6. Fá-lo, ao arrepio da letra do artigo 629.º, n.º 2, alínea d), do CPC, e da...

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