Acórdão nº 194/19 de Tribunal Constitucional (Port, 27 de Março de 2019

Magistrado ResponsávelCons. Maria José Rangel de Mesquita
Data da Resolução27 de Março de 2019
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 194/2019

Processo n.º 1170/18

3ª Secção

Relator: Conselheira Maria José Rangel de Mesquita

Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional

I - Relatório

1. Nos presentes autos, vindos do Supremo Tribunal Administrativo (STA), em que é recorrente A. e recorrido o Ministério da Administração Interna, o primeiro vem interpor recurso, ao abrigo do artigo 70.º, n.º 1, alínea b), da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro, na sua atual versão (Lei do Tribunal Constitucional, adiante designada pela sigla LTC), após a prolação do acórdão do STA, de 9 de novembro de 2018, em que se decidiu não admitir o recurso de revista excecional, cuja interposição foi requerida pelo ora recorrente, por não estarem preenchidos os respetivos pressupostos.

2. Na Decisão Sumária n.º 87/2019 decidiu-se não conhecer do objeto do recurso por não estarem preenchidos vários pressupostos, cumulativos, de que depende tal conhecimento, nos seguintes termos (cfr. II – Fundamentação, n.º 4 e ss.):

«II – Fundamentação

4. Segundo jurisprudência constante do Tribunal Constitucional, a admissibilidade do recurso apresentado nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC depende da verificação, cumulativa, dos seguintes pressupostos: ter havido previamente lugar ao esgotamento dos recursos ordinários (artigo 70.º, n.º 2, da LTC); tratar-se de uma questão de inconstitucionalidade normativa; a questão de inconstitucionalidade normativa haver sido suscitada «durante o processo», «de modo processualmente adequado perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida, em termos de este estar obrigado a dela conhecer» (artigo 72.º, n.º 2, da LTC); e a decisão recorrida ter feito aplicação, como sua ratio decidendi, das dimensões normativas arguidas de inconstitucionalidade pelo recorrente.

Faltando um destes requisitos, o Tribunal não pode conhecer do recurso, ainda que este tenha sido admitido pelo tribunal a quo. Conforme resulta do n.º 3 do artigo 76.º da LTC, essa decisão não vincula o Tribunal Constitucional, pelo que se deve antes de mais apreciar se estão reunidos todos os pressupostos de admissibilidade do recurso previstos na LTC. Caso o Relator verifique que algum, ou alguns deles, não se encontram preenchidos, pode proferir decisão sumária de não conhecimento, conforme resulta do n.º 1 do artigo 78.º-A da LTC.

5. Cabendo aos recorrentes delinear o objeto do recurso (norma ou interpretação normativa cuja constitucionalidade pretendem ver apreciada), a aferição do preenchimento dos requisitos de que depende a sua admissibilidade deve ter por base o invocado no requerimento de interposição de recurso para o Tribunal Constitucional e reportar-se à decisão recorrida (ou decisões recorridas), tal como identificada(s) pelo recorrente, que fixa(m) o respetivo objeto.

Sucede que, no caso dos autos, o recorrente não identifica a decisão recorrida – ficando por esclarecer se pretende recorrer do acórdão do STA – que não admitiu o recurso excecional de revista; ou do acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 14 de junho de 2018 – que confirmando decisão sumária, concluiu pela improcedência da pretensão do recorrente.

Concluiu-se, não obstante, que não se justificaria convidar o recorrente a aperfeiçoar o requerimento (nos termos previstos no n.º 6 do artigo 75.º-A da LTC), pois não estão, em qualquer caso, reunidos os pressupostos, cumulativos, de admissibilidade do recurso.

6. No caso de o recurso versar sobre o acórdão do STA – ao qual, aliás, foi dirigido o requerimento de interposição –, prontamente se verifica que não se encontra preenchido o pressuposto, cumulativo, relativo à efetiva aplicação, como ratio decidendi, das interpretações normativas cuja inconstitucionalidade é arguida.

Efetivamente, este acórdão versa sobre a admissibilidade do recurso excecional de revista, à luz do disposto no n.º 1 do artigo 150.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), tendo concluído que não estavam reunidos os necessários pressupostos. Deste modo, se o recurso de constitucionalidade fosse interposto desta decisão, faltaria a exata correspondência entre as normas cuja inconstitucionalidade é arguida pelo recorrente e aquelas que fundamentaram a decisão do Acórdão recorrido, o que por si só obstaria a que este Tribunal pudesse conhecer o objeto do recurso, em estrito cumprimento do artigo 79.º-C da LTC (neste sentido, e sobre casos análogos, v. os Acórdãos n.os 131/2014, 794/2014, 229/2015, 249/2015 e 386/2017).

7. Ainda que o requerente tivesse identificado, como decisão recorrida, o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 14 de junho de 2018, não poderia este Tribunal conhecer do objeto do recurso.

Desde logo, tendo em conta o disposto no artigo 76.º, n.º 1, da LTC (segundo o qual compete ao tribunal que tiver proferido a decisão recorrida apreciar a admissão do respetivo recurso) resulta dos autos que o recurso foi admitido pelo STA – pelo que a única decisão proferida por este Supremo Tribunal foi o acórdão que não admitiu o recurso excecional de revista.

Além disso, não poderia este Tribunal conhecer a questão por não ser idóneo o objeto do recurso e, também, por não ser possível dar por demonstrada a exata correspondência entre as normas efetivamente aplicadas pelo tribunal a quo e as normas a que a inconstitucionalidade é realmente imputada pelo recorrente.

Efetivamente, entende o recorrente que «o artigo 78.º n.º 2 alínea d) da Lei n.º 23/2007, de 4 de Julho, é inconstitucional quando aplicável a cidadãos estrangeiros que tenham filhos menores de nacionalidade portuguesa residentes em território nacional e sobre os quais possam exercer o convívio-dever (através do direito de visita), o que acontece quando as responsabilidades parentais tenham sido atribuídas judicialmente e em exclusivo ao outro progenitor e o cidadão estrangeiro não tenha sido judicialmente inibido das responsabilidades parentais e mantenha o contacto com os filhos menores, estimulando os laços de afecto entre pai e filhos, como acontece na questão em discussão nos presentes autos, por violação do artigo 30.º n.º 4, 26.º, 36.º n.º 1, 3 ,5 e 6, artigo 67.º n.º 1, artigo 68.º n.º 1 e 2, aplicáveis por força do artigo 15.º, todos da Constituição da República Portuguesa (…).».

Embora o artigo 78.º n.º 2 alínea d) seja identificado como o preceito de que é extraída a norma cuja inconstitucionalidade é arguida, da análise das peças processuais onde é suscitada a questão resulta, claramente, que a ofensa aos preceitos constitucionais invocados pelo recorrente seria a consequência de uma hipotética decisão de expulsão do território nacional – mas não consta dos autos que qualquer decisão nesse sentido tenha sido adotada pelos órgãos administrativos competentes. A uma tal decisão seria aplicável, aliás, um regime legal próprio, que estabelece limites à expulsão do território nacional, designadamente, quando em causa estejam cidadãos estrangeiros que tenham filhos menores a residir em Portugal (v. os artigos 134.º e 135.º da Lei n.º 23/2007, na sua redação atual).

Como tal, à questão de constitucionalidade, assim colocada, falta-lhe um objeto normativo atual, a submeter ao escrutínio do Tribunal Constitucional, antes fazendo o recorrente depender a pretensa violação dos preceitos constitucionais invocados da verificação (futura, eventual) de uma hipótese de que ainda não há indício, pelo que do pedido de fiscalização formulado não se retira uma fundamentação minimamente adequada quanto à alegada violação dos direitos fundamentais invocados. E não havendo qualquer evidência de o artigo 78.º n.º 2 alínea d) ter sido interpretado, pelas instâncias, no sentido de o indeferimento do pedido de renovação da autorização de residência, com o fundamento previsto nessa alínea, determinar automaticamente a expulsão do recorrente do território nacional, não pode igualmente dar-se por verificada a coincidência entre o arco normativo objeto do recurso e a interpretação normativa do supracitado artigo efetivamente aplicada pelas instâncias.

8. Em conclusão, inexistindo um objeto normativo atual no presente recurso e verificando-se que não houve lugar à aplicação, pelas instâncias recorridas, da norma (ou interpretação normativa) impugnada, resulta dos autos que não se encontram preenchidos diversos pressupostos, cumulativos, de admissibilidade do recurso, pelo que não pode o Tribunal Constitucional conhecer do seu objeto.».

3. Notificado da Decisão Sumária n.º 87/2019, o recorrente veio reclamar para a conferência, ao abrigo do artigo 78.º-A, n.º 3, da LTC, alegando, quanto à admissibilidade do recurso, o seguinte:

«A., notificado que foi da Decisão Sumária n.º 87/2019, de 11 de Fevereiro de2019, que não conheceu do objeto do recurso que havia sido interposto para o Tribunal Constitucional, vem reclamar para a conferência deste Venerando Tribunal nos termos do disposto pelo artigo 78.º-A, n.º 3, da Lei do Tribunal Constitucional, nos seguintes termos e fundamentos:

I - Questão Prévia (identificação da decisão recorrida):

1. A Sr.ª Dr.ª Juíza Conselheira Relatora alega na Decisão Sumária n.º 87/2019, de 11 de Fevereiro de 2019 que o Recorrente não identifica a decisão recorrida a ser objecto de recurso.

2. Por força do artigo 75.º-A da LTC n.º 6 podia e devia a Sr.ª Dr.ª Juíza Conselheira Relatora notificar o Recorrente para aperfeiçoar o requerimento, o que efectivamente não ordenou.

3. Assim, o Recorrente declara para todos os devidos e legais efeitos que o objecto do recurso é o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 14 de Julho de 2018, que confirmou a decisão sumária e concluiu pela improcedência da pretensão de A....

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