Acórdão nº 243/19 de Tribunal Constitucional (Port, 23 de Abril de 2019

Magistrado ResponsávelCons. Pedro Machete
Data da Resolução23 de Abril de 2019
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 243/2019

Processo n.º 229/19

2.ª Secção

Relator: Conselheiro Pedro Machete

Acordam, em conferência, na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional:

I. Relatório

1. A., reclamante nos presentes autos, em que é reclamado o B., S.A., deduziu, por apenso à execução instaurada contra C. e D., incidente de embargos de terceiro.

Tendo o referido incidente sido indeferido liminarmente em primeira instância, o ora reclamante apelou para o Tribunal da Relação de Guimarães que, por acórdão proferido em 18 de dezembro de 2017, julgou improcedente a apelação, confirmando a decisão recorrida.

Inconformado, o ora reclamante interpôs recurso excecional de revista e, tendo o mesmo sido admitido pela formação a que alude o n.º 3 do artigo 672.º do Código de Processo Civil, o Supremo Tribunal de Justiça, por acórdão de 18 de outubro de 2018, decidiu negar a revista, confirmando o acórdão recorrido.

Deste acórdão a ora reclamante interpôs recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo do disposto no artigo 70.º, n.º 1, alínea b) da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (Lei do Tribunal Constitucional – LTC), nos seguintes termos (cf. fls. 212-213):

«Em cumprimento do disposto no nº 2 do art. 75º-A da LTC, mais se indica expressamente que o presente recurso tem por base a fiscalização concreta da constitucionalidade:

a. A interpretação das normas conjugadas dos arts. 824º, n.º 2, do Cód. Civil e do 344º, n.º 2, 2ª parte, do Cód. Proc. Civil, feitas no Acórdão recorrido, no sentido de permitirem que uma decisão jurisdicional condene em objeto qualitativamente diferente do pedido formulado, é inconstitucional por violação do art. 20° do CRP e dos princípios constitucionais do acesso ao direito, do direito a uma tutela judicial efetiva, das garantias do processo e do processo equitativo;

b. A interpretação, pelo menos implícita, do art. 3º, nº 3, do Cód. Proc. Civil, feita no Acórdão recorrido, no sentido de não dever ser precedida de prévia audição da parte uma decisão que conhece oficiosamente de exceção, é inconstitucional por violação dos nºs 1 e 4 do art. 20º da CRP e dos princípios constitucionais do acesso ao direito, do direito a uma tutela judicial efetiva, das garantias do processo, do contraditório e do processo equitativo - cfr., Acs. TC n.º 440/94 e 605/95 (DR, II série, de 1.9.94 e de 15.3.96);

c. A interpretação feita dos arts. 824°, nº 2 do Cod Civil e 344°, nº 2, 2ª parte do CodProc Civil, e a completa cegueira pelo preceito do artº 1057º do Código Civil vertida no douto Acórdão recorrido no sentido de que com a adjudicação ao Banco exequente, que o adquiriu de livre vontade e com conhecimento do arrendamento, a fração objeto do arrendamento desde 2013 e que foi apreendida (penhorada em 25.2.2014), após o arrendamento, e que o arrendatário e sua família não devia ignorar a hipoteca e a penhora que onerava o bem locado, consubstancia, flagrantemente, pelos motivos acima expressos, uma violação grosseira dos princípios da igualdade e da habitação própria ou arrendada, previstos e consagrados nos arts. 2º, 13º, nº 1, 18º, nº 2, e 20º, nº 4, 65°, nº 2 e) da CRP;

d. A interpretação feita no Acórdão recorrido dos arts. 824º, nº 2 do Cód. Civil e do art. 344º, nº 2, 2ª parte do Cód. Proc. Civil. no sentido de que no âmbito de um recurso de apelação onde se ignorou a defesa do direito do aqui recorrente (improcedendo os embargos de terceiro), privando-o de defender o seu direito e interesse legalmente protegido, o Tribunal de recurso, tendo recorrido a uma presunção judicial com base em factos que considerou análogos à questão em apreço, (sendo certo que os factos só podem ser dados como provados depois de escrutinada toda a prova e as presunções só atuam num segundo momento, sobre a factualidade dada como adquirida), traduz-se numa situação de absoluta indefesa e do direito a um segundo grau de jurisdição em matéria de facto e consubstancia uma violação grosseira dos princípios constitucionais do acesso ao direito, da tutela jurisdicional efetiva, das garantias do processo, do processo equitativo e da proporcionalidade, e o direito à habitação previstos e consagrados nos arts. 2°, 18°, nº 2, e 20°, nºs 1 e 4 e 65°, nº 2º, e) da CRP;

f. A interpretação feita no Acórdão recorrido dos arts. 824º, nº 2 do CC e 344º, nº 2, 2ª parte do Cod Proc. Civil, no sentido de que, caducou automaticamente o contrato de arrendamento com a venda do imóvel arrendado, o que inviabiliza, desde logo, a dedução dos embargos de terceiro, pois, não obstante, sairá, objetivamente, penalizado o arrendatário, a verdade é que, no jogo de interesses em confronto, “fará menos sentido protege-lo, em detrimento do credor hipotecário, tendo em conta que ele não ignorava ou não devia ignorar a hipoteca que onerava o bem locado” pois, nessa dimensão interpretativa, impede a sua impugnação posterior no âmbito do novo recurso de apelação interposto da nova sentença entretanto prolatada, consubstancia uma violação grosseira dos princípios constitucionais do acesso ao direito, da tutela jurisdicional efetiva, das garantias do processo, do direito a um segundo grau de jurisdição em matéria de facto, do processo equitativo e ela proporcionalidade previstos e consagrados nos arts. 2°, 18°, nº 2, e 20º, nºs I e 4 e 65º, nº 2 e), 67º, nº 1 da CRP;

g) A interpretação feita no Acórdão recorrido dos art. 824, nº 2 do CC e 344°, nº 2, 2ª parte do CodProc Civil, ignorando totalmente que a relação de arrendamento foi constituída antes do imóvel ser apreendido (penhorado), desconsiderando o artº 1057° do Código Civil, preceito que inequivocamente espelha que o direito do arrendatário permanecerá intocado (em obediência ao princípio consagrado no artigo 1057º. Do CC, onde se consagra o velho brocardo emptio non tollit locatum), consubstancia uma violação grosseira dos princípios constitucionais do acesso ao direito, do direito à habitação própria ou arrendada, atentando contra a dignidade da família previstos e consagrados nos arts. 65º, nº 2 e), 67º, nº l da CRP;

Em suma, pelos motivos expostos e por se considerar que a interpretação normativa extraída dos artigos supra citados feita na decisão recorrida é inconstitucional por violação das normas e princípios constitucionais concretamente identificados supra, pretende-se a sindicância da constitucionalidade ele cada um daquelas interpretações normativas.

Saliente-se que as...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT