Acórdão nº 425/19 de Tribunal Constitucional (Port, 10 de Julho de 2019

Magistrado ResponsávelCons. Joana Fernandes Costa
Data da Resolução10 de Julho de 2019
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 425/2019

Processo n.º 371/2019

3ª Secção

Relator: Conselheira Joana Fernandes Costa

Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional

I. Relatório

1. Nos presentes autos, em que é recorrente a A. e recorrido o Ministério Público, foi interposto recurso, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei do Tribunal Constitucional («LTC»), do despacho proferido pelo Juízo de Competência Genérica de Esposende, Tribunal Judicial da Comarca de Braga, datado de 28 de fevereiro de 2019, que julgou improcedente o recurso de impugnação judicial interposto pelo ora recorrente, confirmando integralmente a decisão administrativa que decretou a cassação do título de condução de que aquele é titular.

2. Através da Decisão Sumária n.º 365/2019, decidiu-se, ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 78.º-A da LTC, não tomar conhecimento do objeto do recurso.

Tal decisão tem a seguinte fundamentação:

«II – Fundamentação

3. O recurso de constitucionalidade interposto nos presentes autos funda-se na alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC, nos termos da qual cabe recurso para o Tribunal Constitucional «das decisões dos tribunais (…) que apliquem norma cuja inconstitucionalidade haja sido suscitada durante o processo».

De acordo com o disposto no n.º 2 do artigo 70.º da LTC, os recursos de constitucionalidade interpostos ao abrigo da alínea b) do respetivo n.º 1 apenas cabem de «decisões que não admitam recurso ordinário, por a lei o não prever ou por já haverem sido esgotados todos os que no caso cabiam, salvo os destinados a uniformização de jurisprudência».

Conforme vem sendo reiteradamente afirmado na jurisprudência deste Tribunal, a exigência de exaustão dos recursos ordinários associa a sua razão de ser à natureza hierarquizada do sistema judiciário e à possibilidade de reação facultada no interior de cada ordem jurisdicional, com a mesma se tendo pretendido assegurar que o Tribunal Constitucional seja somente chamado a reapreciar, no âmbito da fiscalização concreta, «as questões de constitucionalidade abordadas em decisões judiciais que constituam a última palavra dentro da ordem judiciária a que pertence o tribunal que proferiu a decisão recorrida» (cf. Acórdão n.º 489/15).

Mesmo antes das alterações introduzidas pela Lei n.º 13-A/98, sempre se entendeu que o conceito de recurso ordinário tem, no n.º 2 do artigo 70.º da LTC, uma «amplíssima significação» (cf. Acórdão n.º 2/87), abrangendo todos os meios impugnatórios facultados pela lei processual aplicável ao processo-base, desde que efetivamente previstos ou admitidos na respetiva lei do processo e suscetíveis, por isso, de obstar ao trânsito em julgado da decisão pretendida sindicar no âmbito da fiscalização concreta da constitucionalidade.

De acordo com o disposto no n.º 4 do artigo 70.º da LTC, consideram-se «esgotados todos os recursos ordinários», nos termos e para os efeitos previstos no respetivo n.º 2, «quando tenha havido renúncia, haja decorrido o respetivo prazo sem que a interposição ou os recursos interpostos não possam ter seguimento por razões de ordem processual». O que importa é que se tenha tornado processualmente impossível, no momento em que é interposto o recurso de constitucionalidade, o recurso para um tribunal superior àquele que proferiu a decisão recorrida, seja em resultado do decurso do prazo legal previsto para esse efeito, seja por efeito da renúncia expressa ao direito de recurso, seja ainda por qualquer outra razão de natureza procedimental impeditiva do conhecimento do respetivo objeto.

Conforme vem sendo pacificamente entendido por este Tribunal, a mera interposição de recurso de constitucionalidade dentro do prazo previsto para a interposição de recurso ordinário da decisão recorrida não vale como facto concludente inequívoco da vontade de o não utilizar, sendo inadmissível a antecipada interposição de recurso sem que a parte renuncie expressamente ao meio de reação que normalmente se seguiria de acordo com a lei processual aplicável (Acórdãos n.ºs 105/03, 108/04, 153/08, 427/08, 76/09).

Ora, é essa, justamente, a hipótese que se verifica no presente caso.

4. A decisão aqui recorrida é o despacho proferido pelo Juízo de Competência Genérica de Esposende, datado de 28 de fevereiro de 2019, que julgou improcedente o recurso de impugnação judicial interposto pelo ora recorrente, confirmando integralmente a decisão administrativa que decretou a cassação do título de condução de que o mesmo é titular.

Tal despacho, proferido nos termos previstos no artigo 64.º, n.º 2, do Regime Geral das Contraordenações, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de outubro (doravante, «RGCO»), foi notificado à Mandatária do recorrente, por via eletrónica, no dia 01 de março de 2019 (cf. fls. 125), tendo sido notificado pessoalmente ao próprio no dia 9 de março de 2019 (cf. fls. 107 e 114).

De acordo com as disposições conjugadas dos artigos 186.º do Código da Estrada e 73.º, n.º 1, alínea b), do RGCOC, a sentença ou despacho judicial que confirme a condenação do arguido em determinada sanção acessória é recorrível para o Tribunal da Relação.

Tal recurso — resulta do artigo 74.º do aludido RGCOC — «deve ser interposto no prazo de 10 dias a partir da sentença ou do despacho, ou da sua notificação ao arguido, caso a decisão tenha sido proferida sem a presença deste».

Ora, considerando que o termo inicial do prazo para interposição de recurso do despacho proferido pelo Juízo de Competência Genérica de Esposende se fixa a partir da notificação efetuada, não ao próprio recorrente, mas sim à respetiva mandatária — é o que decorre do artigo 47.º, n.º 2, do RGCOC (cf., a respeito da aplicabilidade desta norma à interposição de recurso jurisdicional, Manuel Simas Santos e Jorge Lopes de Sousa, Contraordenações Anotações ao Regime Geral, Viseu, Vislis Editores, 3ª edição, janeiro de 2006, p. 496) —, o certo é que, tendo tal notificação sido realizada no dia 1 de março de 2019, não há como não concluir que, no momento em que o recurso de constitucionalidade foi interposto, decorria ainda o prazo para interposição de recurso ordinário.

Senão vejamos.

Tendo sido levada a cabo por via eletrónica, a notificação da mandatária do recorrente presume-se efetuada no dia 04 de março de 2019 (3.º dia posterior ao do envio, cf. artigo 113.º, n.º 12 do Código de Processo Penal, aplicável ex vi artigo 41.º, n.º 1 do RGCOC), conforme constava, aliás, do próprio teor da notificação que lhe foi dirigida (cf. fls. 125).

Sendo de 10 dias o prazo para interposição de recurso para o Tribunal da Relação, verifica-se que o mesmo só terminou no dia 14 de março de 2019.

Tendo o recurso para o Tribunal Constitucional sido interposto através de requerimento apresentado no dia 13 de março de 2019 (cf. fls. 90), é manifesto que, nesse momento, a decisão recorrida não constituía ainda, na ordem dos tribunais comuns, o pronunciamento final sobre a matéria a que respeita a questão de constitucionalidade enunciada pelo recorrente.

O recurso de constitucionalidade não pode, pois, ser admitido por falta de esgotamento prévio dos meios impugnatórios ordinários, ónus prescrito no n.º 2 do artigo 70.º da LTC.

Justifica-se, assim, a prolação da presente decisão sumária (cf. artigo 78.º-A, n.º 1, da LTC), sabido, como é, que o despacho de admissão proferido pelo tribunal recorrido não vincula o Tribunal Constitucional (cf. artigo 76.º, n.º 3, da LTC)».

3. Inconformada com tal decisão, o recorrente reclamou para a Conferência, invocando para o efeito os seguintes fundamentos:

«A., Arguido/Recorrente, melhor identificado nos autos de processo à margem referenciados;

- Notificado da Decisão Sumária nº 370/2019, proferida pela Exma. Sra. Juiz Conselheira Relatora, mediante a qual decidiu não tomar conhecimento do objeto do recurso, com a qual não se conforma, vem da mesma

RECLAMAR PARA A CONFERÊNCIA DESTE TRIBUNAL CONSTITUCIONAL,

- O que faz ao abrigo e nos termos do disposto no nº3, do artigo 78.º-A, da Lei Orgânica do Tribunal Constitucional, aprovada pela Lei nº28/82, de 15/11, na sua redação atualizada, adiante identificada por "LTC", com os fundamentos seguintes:

1. No âmbito do processo de impugnação judicial/recurso que correu termos no Tribunal Judicial da Comarca de Braga, Juízo de Competência Genérica de Esposende, em epigrafe identificado, foi proferida sentença que julgou "improcedente, na totalidade, o recurso de impugnação apresentado, confirmando integralmente a decisão administrativa que decidiu decretar a cassação do título de condução n.º P-745737, de que é titular A.."

2. Importando evidenciar, antes de mais, que a decisão administrativa impugnada, da qual se interpôs recurso para o identificado Tribunal, Juízo de Competência Genérica de Esposende, se trata da decisão proferida pelo Presidente da Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária, que determinou a cassação do titulo de condução n.º P-745737, do Recorrente A., na sequência das condenações pela prática de dois crimes rodoviários que foram averbados...

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