Acórdão nº 400/19 de Tribunal Constitucional (Port, 04 de Julho de 2019

Magistrado ResponsávelCons. Maria de Fátima Mata-Mouros
Data da Resolução04 de Julho de 2019
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 400/2019

Processo n.º 1044/2018

1.ª Secção

Relator: Conselheira Maria de Fátima Mata-Mouros

Acordam na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional,

I – Relatório

1. A., S.A., ora recorrente, impugnou judicialmente a liquidação da taxa promovida pela B., S.A., no montante de € 10.898,40, respeitante à legalização de 18 mangueiras existentes no posto de abastecimento de combustíveis localizado na ER 247, em Terrugem, Concelho de Sintra, no Tribunal Tributário de Lisboa. Por sentença de 2 de outubro de 2017, a impugnação foi julgada improcedente.

Inconformada, recorreu para o Supremo Tribunal Administrativo que, por acórdão da 2.ª Secção do Contencioso Tributário de 22 de março de 2018, confirmou a sentença recorrida e negou provimento ao recurso.

Ainda inconformada, interpôs recurso para o Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo invocando oposição do decidido com o acórdão da Secção de Contencioso Administrativo do mesmo Supremo Tribunal Administrativo, proferido em 12 de maio de 2016. O referido recurso não foi admitido por despacho de 3 de maio de 2018. Este despacho foi objeto de reclamação para a conferência, que a indeferiu em acórdão de 27 de junho de 2018.

2. Recorre agora para o Tribunal Constitucional ao abrigo do artigo 70.º, n.º 1, alínea b), da Lei da Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional (Lei n.º 28/82, de 15 de novembro, doravante designada por LTC).

Prosseguindo os autos para alegações, a recorrente apresentou as seguintes conclusões (cfr. fls. 300-301):

«a) À luz dos artigos 22º, 24º e 30º do ETAF de 1984, os recursos em que se pretendia apreciar conflitos de jurisprudência entre acórdãos proferidos por formações das duas secções do STA (fiscal e administrativa) eram apreciados em Plenário (constituído por juízes de ambas as áreas). Ou seja, o legislador concebeu a possibilidade de existir uma contradição jurisprudencial entre acórdãos proferidos pelas duas secções (fiscal e Administrativa) do STA, relativamente a situações fácticas substancialmente idênticas e dentro de um quadro legislativo substancialmente idêntico.

b) Com o ETAF de 2002, apenas se passou a prever no artigo 27º/1, alínea b) que, compete ao Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo conhecer dos recursos para uniformização de jurisprudência, sendo certo, todavia, que nos termos do disposto no artigo 152° do CPTA (que estabelece o regime dos recursos para uniformização de jurisprudência), não se faz qualquer restrição aos acórdãos invocáveis como fundamento, no sentido de serem proferidos pela mesma secção de que se recorre.

c) Pelo que, a conclusão vertida no douto acórdão proferido em conferência pelar Secção Tributária do STA assenta numa clara interpretação restritiva das normas contidas nos citados artigos 27°/1, alínea b) do ETAF e 152°/1 alínea b) do CPTA.

d) Sucede que, a garantia da via judiciária, enquanto direito de natureza análoga aos direitos, liberdades e garantias, exige que se afaste uma tal interpretação restritiva em benefício de uma outra mais favorável à tutela judicial efetiva.

e) Com efeito, no âmbito da proteção normativa do artigo 20º da CRP, deverá entender-se que, para além de um geral direito de ação, integram-se igualmente o direito a prazos razoáveis de ação e de recurso e o direito a um processo justo.

f) E, ainda que se defenda que a Constituição não garante um triplo grau de jurisdição, permitindo que o legislador ordinário regule, com larga margem de liberdade, a existência de recursos e a recorribilidade das decisões, tal não significa que essa concreta modelação possa ser feita de modo irrazoável, arbitrário ou desproporcionado (vide neste sentido Acórdão do TC n.º 383/2009).

g) Ora, uma tal interpretação do disposto no artigo 152°/1, alínea b) do CPTA, no sentido de que devem restringir-se os acórdãos invocáveis como fundamento do recurso a acórdãos proferidos pelas secções do contencioso tributário ou administrativo do STA, constitui, salvo devido respeito, uma restrição, sem fundamento válido, irrazoável e desproporcionada ao direito de acesso aos Tribunais da ora reclamante, constitucionalmente consagrado nos artigos 20º e 268°/4 da Lei Fundamental.

h) Podendo, além do mais, colocar em crise a harmonização e coerência do próprio sistema judicial, sendo certo que, os domínios do direito administrativo e fiscal possuem notórias áreas de confluência, apelando aos mesmos princípios e regras jurídicas (como sucedeu no caso dos presentes autos).

i) Do exposto resulta claro que não poderiam ser aplicáveis in casu as normas contidas nos artigos 27°/1, alínea 1) do ETAF e no artigo 152° do CPTA, interpretadas no sentido da inadmissibilidade legal do recurso por oposição de julgados quando a divergência decisória surja entre acórdãos das secções de contencioso administrativo e de contencioso tributário do STA (como no caso dos autos), por violação do direito de acesso aos tribunais, nomeadamente à impugnação jurisdicional dos atos da administração constitucionalmente consagrados nos artigos 20º e 268º/4 da Lei Fundamental».

Regularmente notificada, a recorrida não apresentou contra-alegações.

Cumpre apreciar e decidir.

II. Fundamentação

a) Delimitação do objeto do recurso

3. De acordo com o requerimento de recurso de constitucionalidade, a questão de constitucionalidade a decidir reporta-se à «impossibilidade legal do recurso por oposição de julgados quando a divergência decisória surja entre acórdãos das secções de contencioso administrativo e de contencioso tributário do STA», norma decorrente da...

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