Acórdão nº 493/19 de Tribunal Constitucional (Port, 26 de Setembro de 2019

Magistrado ResponsávelCons. Gonçalo Almeida Ribeiro
Data da Resolução26 de Setembro de 2019
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 493/2019

Processo n.º 653/2019

3ª Secção

Relator: Conselheiro Gonçalo de Almeida Ribeiro

Acordam, em conferência, na 3ª secção do Tribunal Constitucional

I. Relatório

1. Nos presentes autos, vindos do Tribunal da Relação do Porto, em que são recorrentes A. e B., sendo recorrido o Ministério Público, foi interposto o presente recurso, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70º da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (Lei do Tribunal Constitucional, referida adiante pela sigla «LTC»), dos acórdãos daquele Tribunal, de 8 de março de 2019 e de 15 de maio de 2019.

2. Pela Decisão Sumária n.º 523/2019, decidiu-se, ao abrigo do disposto no artigo 78.º-A, n.º 1, da LTC, não tomar conhecimento do objeto do recurso interposto. Tal decisão tem a seguinte fundamentação:

«4. No requerimento de interposição do presente recurso de constitucionalidade, os recorrentes não indicam expressamente o acórdão do Tribunal da Relação do Porto sobre o qual incide o recurso de constitucionalidade. Assim, consideram-se as duas hipóteses possíveis.

5. De acordo com a alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC, cabe recurso para o Tribunal Constitucional das decisões dos tribunais que apliquem norma cuja inconstitucionalidade haja sido suscitada durante o processo. Suscitação que deve ter ocorrido de modo processualmente adequado perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida, em termos de este estar obrigado a dela conhecer (artigo 72.º, n.º 2, da LTC).

Recorde-se que os recorrentes pretendem a apreciação da constitucionalidade da norma do «art.º 127.º do Código de Processo Penal, quando interpretada - como o faz a douta sentença condenatória proferida em 1.ª instância, o douto acórdão interposto dessa sentença e, implicitamente, o douto acórdão ora recorrido - no sentido de que a livre convicção do julgador é suficiente para, sem prova direta alguma, sem indicação das regras de experiência ou ciência, adquirir por dedução ou presunção natural ou outra prova dos factos em julgamento»

Não pode dar-se como verificado tal requisito de suscitação prévia, se considerarmos como decisão recorrida o acórdão datado de 8 de março de 2019, que negou provimento ao recurso interposto da sentença condenatória de 1.ª instância.

Não obstante se suscitarem as maiores dúvidas sobre a idoneidade do objeto do recurso, tal como articulado pelos recorrentes – que respeita, no essencial, à apreciação da prova –, é certo que, na motivação do recurso interposto para o Tribunal da Relação do Porto, não suscitaram qualquer questão de inconstitucionalidade normativa, designadamente reportada ao artigo 127.º do Código de Processo Penal. Na verdade, os próprios recorrentes indicam que essa suscitação apenas ocorreu no subsequente requerimento, em que é arguida a nulidade desse aresto; ou seja, em momento posterior à prolação da decisão em causa, quando já se encontrava esgotado o poder jurisdicional do Tribunal recorrido sobre a questão em apreço.

A não verificação deste requisito do recurso de constitucionalidade obsta a que o Tribunal Constitucional possa conhecer do objeto do mesmo.

6. O mesmo desfecho é atingido se considerarmos como decisão recorrida o acórdão datado de 15 de maio de 2019, que indeferiu a arguição de nulidade oposta ao precedente acórdão, datado de 8 de março de 2019.

Constitui requisito do recurso de constitucionalidade previsto na alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC a aplicação pelo tribunal recorrido, como ratio decidendi, da norma cuja inconstitucionalidade é invocada pelo recorrente.

É manifesto, quanto a este segundo aresto, que tal requisito não se encontra preenchido.

No acórdão de 15 de maio de 2019, o Tribunal da Relação do Porto não aplicou qualquer norma extraída do artigo 127.º do Código de Processo Penal, como fundamento jurídico determinante da solução da questão que lhe cabia julgar. Com efeito, em tal aresto apreciou-se apenas a arguida nulidade do acórdão de 8 de março de 2019, por excesso de pronúncia, tendo sido aplicado apenas o disposto no artigo 379.º, n.º 1, alínea c), do Código de Processo Penal.

É certo que aí se aludiu à questão dos critérios de avaliação da prova e se explicitou que no acórdão de 8 de março de 2019 se tomou conhecimento dessa questão por ela estar abrangida no objeto do recurso. Porém, tal não implica que tenham sido novamente aplicadas as normas aí invocadas, nomeadamente a do artigo 127.º do Código de Processo Penal. A argumentação desenvolvida serviu apenas para fazer a demonstração de que a nulidade não existia, designadamente que se não verificava qualquer excesso de pronúncia.

A não aplicação pelo tribunal recorrido, como ratio decidendi, da norma cuja constitucionalidade é questionada pelos recorrentes obsta ao conhecimento do objeto do recurso, justificando a prolação da presente decisão sumária, segundo o previsto no artigo 78.º-A, n.º 1, da LTC.»

3. De tal Decisão Sumária vêm os recorrentes reclamar para a conferência, ao abrigo do disposto no n.º 3 do artigo 78.º-A da LTC, invocando as seguintes razões:

«A. e B., Recorrentes nos autos em referência, notificados da douta Decisão Sumária no sentido de não tomar conhecimento do objeto do recurso nos termos do art.º 78.º-A, n.º 1, da LTC e condenar os recorrentes em custas, vêm, ao abrigo do n.º 3 do mesmo art.º 78.º-A da LTC, Reclamar para a Conferência, nos termos e com os fundamentos seguintes:

1. No recurso interposto para o Tribunal Constitucional invocou-se a al. b) do n.º 1 do art.º 70.º da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, e dizia-se que se pretendia fosse “apreciada a inconstitucionalidade material da norma ínsita no artº 127.º do Código de Processo Penal, quando interpretada - como o fa; a douta sentença condenatória proferida em l ª instância, o douto acórdão interposto dessa sentença e, implicitamente, o douto acórdão ora recorrido - no sentido de que a livre convicção do julgador é suficiente para, sem prova direta alguma, sem indicação das regras de experiência ou ciência, adquirir por dedução ou presunção natural ou outra prova dos factos em julgamento, por violação dos princípio constitucionais da normalidade na utilização da prova indireta, da garantia de defesa dos arguidos e a presunção da sua inocência (artº 32.º da CRP), dizendo-se ainda que “tal questão...

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