Acórdão nº 492/19 de Tribunal Constitucional (Port, 26 de Setembro de 2019

Magistrado ResponsávelCons. Gonçalo Almeida Ribeiro
Data da Resolução26 de Setembro de 2019
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 492/2019

Processo n.º 582/2019

3ª Secção

Relator: Conselheiro Gonçalo de Almeida Ribeiro

Acordam, em conferência, na 3ª secção do Tribunal Constitucional

I. Relatório

1. Nos presentes autos, vindos do Tribunal da Relação de Guimarães, em que é recorrente A. e recorridos o Ministério Público e B., foi interposto o presente recurso, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (Lei do Tribunal Constitucional, referida adiante pela sigla «LTC»), do acórdão daquele Tribunal, de 29 de abril de 2019.

2. Pela Decisão Sumária n.º 470/2019, decidiu-se, ao abrigo do disposto no artigo 78.º-A, n.º 1, da LTC, não tomar conhecimento do objeto do recurso interposto. Tal decisão tem a seguinte fundamentação:

«4. Segundo o disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 280.º, da Constituição, e na alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º, da LTC, cabe recurso para o Tribunal Constitucional das decisões dos tribunais que apliquem norma cuja inconstitucionalidade haja sido suscitada durante o processo, «identificando-se assim, o conceito de norma jurídica como elemento definidor do objeto do recurso de constitucionalidade, pelo que apenas as normas e não já as decisões judiciais podem constituir objeto de tal recurso» (v. Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 361/98).

O recorrente questiona a conformidade jurídica da apreciação da prova feita pelo Tribunal recorrido, designadamente quanto à congruência do valor probatório conferido ao depoimento da vítima no seu todo com o teor da prova pericial produzida. E fá-lo, quer por referência ao artigo 127.º do Código de Processo Penal, quer no plano das nulidades da sentença, invocando o artigo 410.º, n.º 2, alíneas b) e c), do Código de Processo Penal. Daí decorre, inequivocamente, que o recorrente pretende sindicar a constitucionalidade da própria decisão recorrida e não qualquer norma legal por aquela aplicada. Ora, como se escreveu no Acórdão n.º 695/2016: «o sistema português de controlo da constitucionalidade normativa assenta na ideia de que a jurisdição constitucional deve ser o juiz das normas e não o juiz dos juízes. O papel do Tribunal Constitucional na arquitetura da nossa democracia constitucional é o de controlar a atuação do legislador e dos seus sucedâneos; os erros judiciais são corrigidos através do regime de recursos próprio da ordem jurisdicional a que as decisões pertencem.»

A apreciação da prova ao abrigo do artigo 127.º do Código de Processo Penal ─ que consagra o princípio da «livre apreciação da prova» ─, sujeita ao parâmetro constitucional da presunção de inocência, nomeadamente na vertente do in dubio pro reo, e a determinação da medida concreta da pena, sujeita aos princípios da culpa e da proporcionalidade, situam-se necessariamente no domínio reservado ao exercício da função jurisdicional, pelo que não constituem objetos idóneos de recurso para o Tribunal Constitucional (v., neste sentido, entre muitos outros, os Acórdãos n.os 303/02 e 633/08). O mesmo se diga do confronto da decisão com os seus vícios intrínsecos, nos termos do artigo 410.º, n.º 2, alíneas b) e c), do Código de Processo Penal: sob as vestes de um problema processual, o que se visa aqui, em substância, é também a apreciação da mesma questão de fundo, qual seja, a do acerto do juízo probatório na decisão recorrida.

Em suma, pela própria natureza das questões que pretende controverter, é manifesto que o presente recurso incide sobre um objeto destituído de carácter normativo. Tal é condição suficiente para obstar ao respetivo conhecimento, justificando-se a prolação da presente decisão sumária, nos termos do artigo 78.º-A, n.º 1, da LTC.»

3. De tal Decisão Sumária vem agora o recorrente reclamar para a conferência, ao abrigo do disposto no n.º 3 do artigo 78.º-A da LTC, o que fez nos seguintes termos:

«O recurso interposto visa a fiscalização concreta da inconstitucionalidade da parte do Acórdão deste Tribunal que julgou:

a) - ter de ter por assente que, tendo o coletivo dado credibilidade ao depoimento da menor vítima quanto a determinados factos, se o seu depoimento serviu de mote para que o coletivo considerasse provados tais factos, então também outro relato descrito pela menor, dado por não provado, tem de ser tida em consideração nos mesmos moldes ou seja ser dado por provado.

b) - a conjugação da descrição e relato da factualidade dada por não provada com o relatório médico-legal de natureza sexual e de perícia psicológica que revela que a menor não apresentou vestígios físicos e/ou biológicos da penetração, permite concluir que se verificou o facto, em violação do princípio in dubio pro reo considerando o facto como provado.

Concretamente,

visa o presente recurso a...

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