Acórdão nº 621/19 de Tribunal Constitucional (Port, 23 de Outubro de 2019

Magistrado ResponsávelCons. Maria de Fátima Mata-Mouros
Data da Resolução23 de Outubro de 2019
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 621/2019

Processo n.º 593/2017

1.ª Secção

Relator: Conselheira Maria de Fátima Mata-Mouros

Acordam na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional,

I – Relatório

1. A A., S.A., ora recorrida, impugnou judicialmente autoliquidações da taxa para financiamento do Sistema de Recolha de Cadáveres de Animais Mortos nas Explorações (SIRCA), no valor de €91.973,15, respeitantes aos meses de agosto, setembro e outubro de 2015, junto do Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel.

Este Tribunal veio, no entanto, em sentença de 1 de setembro de 2016, a julgar a impugnação judicial totalmente improcedente.

Inconformada, a recorrida recorreu para a Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal de Justiça. Este Tribunal, por acórdão de 10 de maio de 2017, julgou «ser inconstitucional, por violação do princípio da igualdade, na sua dimensão de equivalência (artigo 13.º da Constituição), a taxa “SIRCA” tal como configurada pelo Decreto-Lei n.º 19/2011, de 7 de Fevereiro, na medida em que configura o “estabelecimento de abate” como contribuinte direto de tal tributo, quando o presumível beneficiário do serviço que esta se destina a financiar é, não ele, mas o titular da exploração» (fls. 269-270). Foi, por isso, concedido provimento ao recurso, revogada a sentença recorrida e julgada procedente a impugnação judicial.

2. O Ministério Público interpôs o presente recurso ao abrigo dos artigos 280.º, n.º 1, alínea a), e n.º 3, da Constituição e dos artigos 70.º, n.º 1, alínea a), e 72.º, n.º 1, alínea a), e n.º 3, da Lei da Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional (Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro [LTC]), com fundamento em tal recusa de aplicação de norma.

3. Notificado para apresentar alegações, o Ministério Público concluiu, nos termos seguintes (fls. 294-298):

«1.ª) Vem interposto recurso, pelo Ministério Público, para si obrigatório, nos termos do disposto nos artigos 280.º, n.º 1, alínea a), e n.º 3, da Constituição e dos artigos 70.º, n.º 1, alínea a), e 72.º, n.º 1, alínea a), e n.º 3, da LOFPTC, “do douto acórdão proferido nos autos [de proc. n.º 1290/16-30, do Supremo Tribunal Administrativo (2.ª Secção – Contencioso Tributário / Recursos jurisdicionais), sendo recorrente A., S.A., e recorrida a Direção-Geral de Alimentação e Veterinária], a fls. 194 e ss que declarou ser inconstitucional por violação do princípio da igualdade, na sua dimensão de equivalência (artigo 13.º da CRP), a taxa SIRCA tal como configurada pelo Decreto-Lei n.º 19/2011, de 7 de Fevereiro, recusando, consequentemente a aplicação das respetivas normas, designadamente o seu artigo 2.º, n.º a, que define o regime de incidência do tributo.

2.ª) No quadro do regime do Decreto-Lei n.º 19/2011, cit., nomeadamente do seu artigo 2.º, n.º 1, alíneas a) e b), aquando da apresentação de animais para abate, tal isso dá causa ao pagamento do preço do serviço aos estabelecimento de abate, os quais ficam depois obrigados ao pagamento da taxa SIRCA, sendo que o montante assim arrecadado vai financiar o FSSAM, entidade pública tendo por atribuição legal a realização de prestações administrativas no domínio do sistema sanitário e da segurança alimentar, nomeadamente de caráter preventivo.

3.ª) Ora, por uma parte, no caso de animais mortos já nas suas abegoarias, os estabelecimentos de abate poderão aproveitar dos serviços de recolha, transporte e eliminação prestados para o efeito.

4.ª) Por outra parte, o sistema SIRCA assenta na “interdição, em geral, do enterramento dos animais mortos em exploração”, substituído por um sistema com intervenção necessária dos estabelecimentos de abate, em ordem à transformação ou eliminação dos subprodutos, o que se traduz numa procura induzida pela Direcção-Geral de Alimentação e Veterinária para tal efeito, na sua faceta de administradora do SIRCA, gerando assim receita para os estabelecimentos de abate, a título de pagamento do preço do serviço em causa.

5.ª) Acresce, que o sistema de recolha e eliminação dos cadáveres animais mortos despista doenças, nomeadamente a EET, e é feito de tal modo que previne e minimiza riscos sanitários, nomeadamente no decurso das operações de eliminação, o que promove a segurança e a continuidade da laboração dos estabelecimentos de abate. Finalmente, o bom funcionamento do SIRCA, reforçado por outras ações administrativas da responsabilidade do FSSAM [art. 3.º (Missão e objetivos), als. a) a d)], contribui decisivamente para a integridade e reputação do mercado, sinalizada por um dístico comprovativo, oferecendo uma garantia pública de qualidade alimentar e criando assim condições de confiança que promovem o comércio interno e conferem “às exportações nacionais adicionais condições de sucesso nos competitivos mercados internacionais”, gerando assim um crescimento da procura no mercado por virtude qual todos os agentes económicos, nomeadamente os estabelecimentos de abate, retiram vantagens económicas e comerciais.

6.ª) Pelo exposto, a definição legal da base subjetiva de incidência da taxa SIRCA, tal como consta do aludido artigo 2.º, n.º 1, alíneas a) e b), do Decreto-Lei n.º 19/2011, cit., não apenas é conforme como faz o pleno cumulativo dos três critérios relevantes para a legitimação material do tributo: homogeneidade, responsabilidade e aproveitamento pelo grupo dos agentes económicos em causa (estabelecimentos de abate) das prestações administrativas financiadas, mesmo que em parte, com a receita da taxa SIRCA.

7.ª) Assim, a denominada taxa SIRCA, tal como definida no Decreto-Lei n.º 19/2011, cit., nomeadamente no aludido artigo 2.º, n.º 1, alíneas a) e b), é de...

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