Acórdão nº 602/19 de Tribunal Constitucional (Port, 21 de Outubro de 2019

Magistrado ResponsávelCons. Lino Rodrigues Ribeiro
Data da Resolução21 de Outubro de 2019
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 602/2019

Processo n.º 414/19

3.ª Secção

Relator: Conselheiro Lino Rodrigues Ribeiro

Acordam, em conferência, na 3.ª Secção do Tribunal Constitucional

I – Relatório

1. Nos presentes autos, vindos do Tribunal da Relação de Coimbra, em que é recorrente A. e recorrida B., S.A., a primeira vem pedir a reforma, em matéria de custas, do Acórdão n.º 410/2019, que indeferiu a reclamação para a conferência apresentada pela recorrente da Decisão Sumária n.º 340/2019, que decidiu não conhecer o objeto do recurso de constitucionalidade por si interposto, por ter considerado não estarem reunidos os necessários pressupostos processuais.

2. A Decisão Sumária n.º 340/2019 decidiu não conhecer o objeto do recurso, em razão de (manifestamente) se não encontrar reunido o pressuposto de que houvesse sido suscitada prévia e adequadamente uma questão de constitucionalidade perante o tribunal recorrido. Entendeu-se igualmente que, ainda que assim não fosse, as questões que a recorrente procurou formular no seu recurso não apresentavam o caráter normativo necessário para poderem ser sindicadas pelo Tribunal Constitucional. Foi a seguinte a fundamentação apresentada:

«5. Importa começar por firmar a impropriedade da interposição do presente recurso ao abrigo do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC. Como com nitidez resulta dos autos, não está no presente processo em causa a recusa de aplicação, por parte do tribunal a quo, de qualquer norma com fundamento em inconstitucionalidade, como aquele preceito pressupõe, mas a aplicação de normas possivelmente feridas de inconstitucionalidade, o que corresponde, antes e apenas, à hipótese prevista na alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC.

6. Admitido o recurso, cumpre verificar se é de facto possível conhecer o seu objeto, já que a decisão que o admitiu não vincula o Tribunal Constitucional (artigo 76.º, n.º 3, da LTC). Um recurso interposto ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC deve preencher, desde logo, os seguintes pressupostos: além de ter esgotado as vias de recurso ordinário admitidas pela decisão recorrida, é necessário que a recorrente tenha suscitado durante o processo e de forma adequada uma questão de constitucionalidade que corresponda ao objeto do recurso e incida sobre normas jurídicas que tenham constituído ratio decidendi da decisão recorrida.

7. No presente caso, é desde logo absolutamente manifesto que não se acha preenchido o pressuposto de que tenha sido suscitada adequadamente perante o tribunal recorrido uma questão de constitucionalidade de que este ficasse obrigado a conhecer. De facto, da análise das peças processuais indicadas supra, nos pontos 2 e 3 – as peças em que, no caso, deveria ter sido suscitada adequadamente perante o tribunal a quo uma questão de constitucionalidade de que este ficasse obrigado a conhecer (vd. o artigo 72.º, n.º 2, da LTC) –, não consegue vislumbrar-se qualquer questão de constitucionalidade, ou sequer uma referência à Constituição da República Portuguesa.

Não há, pois, dúvida de que não se encontra satisfeito o referido pressuposto da suscitação prévia e adequada, tanto mais quanto se nota que este pressuposto não se basta com uma simples alusão a um enunciado normativo ordinário, mas antes exige que o recorrente tenha identificado um tal enunciado de modo expresso e claro, delimitando e especificando pela positiva o objeto do recurso perante o tribunal recorrido.

Mesmo no requerimento de recurso de constitucionalidade, a recorrente continua a não se aproximar de satisfazer aquela exigência, não identificando nunca uma norma de direito ordinário potencialmente ferida de inconstitucionalidade. De todo o modo, este também já não constituiria momento adequado para suscitar uma questão de constitucionalidade, uma vez que, obviamente, o tribunal recorrido já não poderia ser aí confrontado com uma questão de que devesse conhecer. Daí que o pressuposto da suscitação prévia e adequada se configure como uma condição de legitimidade (que não pode ser adquirida a título póstumo) para a interposição destes recursos (cf. de novo o artigo 72.º, n.º 1, alínea b) e n.º 2 da LTC). Isto basta para que o presente recurso não possa ser conhecido.

8. No entanto, justifica-se acrescentar o seguinte: a referida falta de suscitação adequada é sintomática de um problema mais profundo da pretensão recursiva em apreço: a circunstância de esta não versar sobre qualquer questão dotada de caráter normativo, o único tipo de questão que pode ser apreciado pelo Tribunal Constitucional num recurso como o que se aprecia.

Note-se que, diversamente de outros pressupostos de que depende o conhecimento de um recurso de constitucionalidade, o pressuposto de a questão apresentada ter caráter normativo não tem uma dimensão apenas formal ou procedimental, destinando-se a delimitar a competência do Tribunal...

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