Acórdão nº 768/19 de Tribunal Constitucional (Port, 12 de Dezembro de 2019

Magistrado ResponsávelCons. Fernando Vaz Ventura
Data da Resolução12 de Dezembro de 2019
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 768/2019

Processo n.º 79/2019

2.ª Secção

Relator: Conselheiro Fernando Ventura

Acordam na 2.ª secção do Tribunal Constitucional

I. Relatório

1. O arguido A. interpôs recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (Lei da Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional, doravante LTC), do acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa em 30 de maio de 2018, o qual confirmou a decisão proferida em 1.ª instância, que o condenou pela prática de um crime de falsificação de documento, um crime de quebra de selos e um crime de arrancamento de editais, impondo, em cúmulo jurídico, a pena unitária de 42 meses de prisão, mais o condenando no pagamento de indemnização ao Município do Seixal no valor de €15.000.00.

No requerimento de interposição de recurso (apresentado em 8 de novembro de 2018) é enunciada a pretensão de apreciação da conformidade constitucional da norma «resultante da interpretação conjugada dos artigos 66º, nº 4 do C.P.P., nº 3 do art. 42º da Lei 34/2004 de 29 de Julho, na redação da Lei nº 47/2007, de 28/08, interpretados em consonância com o artigo 411º do C.P.P., no sentido de que o prazo para interposição de recurso se conta ininterruptamente a partir da data do depósito da decisão na secretaria, mesmo no caso de recusa de interposição do recurso por parte do seu defensor oficioso, cuja substituição foi requerida e deferida, porque violadora do disposto nos artigos 20º, nº 1 e 32º, nº 1 da Constituição da República Portuguesa, inconstitucionalidade que foi devidamente invocada em sede Reclamação para a Conferência da Decisão Sumária do Venerando Juiz Desembargador Relator».

2. Admitido o recurso e remetidos os autos a este Tribunal, em sede de reclamação da decisão sumária n.º 169/2019, o Acórdão n.º 349/2019 determinou a notificação dos sujeitos processuais para alegações.

3. O recorrente apresentou alegações, nas quais defendeu a verificação dos pressupostos de admissibilidade do recurso, considerando ter suscitado a questão de constitucionalidade na reclamação apreciada pela decisão recorrida, e existir identidade entre a dimensão normativa posta à apreciação do Tribunal e a ratio decidendi mobilizada pelo tribunal a quo, matéria que sintetizou conclusivamente nestes termos:

«28 – (...) [N]o ponto 15 das conclusões da sua reclamação para a Conferência se pode ler: "Ora, a interpretação dada pelo Venerando Juiz Desembargador Relator ao nº 3, do art. 42.º da lei 34/2004, de 29 de Julho (na redação da Lei 4/200, de 28.08) e ao nº 4 do artigo 66.º do C.P.P. em consonância com o artigo 411.º do C.PP., no sentido de que o prazo para interposição do recurso não se interrompe com o pedido de substituição de defensor é inconstitucional, porque violadora do disposto nos artigos 20.º, nº 1 e 32.º nº 1 da Constituição da República Portuguesa, inconstitucionalidade que invoca".

30 - Resultando, ainda, do ponto 19 das conclusões da reclamação que: "Havendo recusa da defensora oficiosa em interpor recurso da sentença condenatória em pena efetiva de prisão, e não olvidando que "o defensor exerce os direitos que a lei reconhece ao arguido" - art. 66º nº 1 C.P.P. não podemos admitir que o arguido fique à mercê da posição do defensor oficioso, pelo que a tutela constitucional das efetivas garantias de defesa do arguido não só deve abranger a possibilidade do mesmo ser assistido por novo defensor como também permitir-lhe a pratica do ato - designadamente interpor o competente recurso."

31 - E, decorre do ponto 26 das suas Conclusões que: "Se a defensora oficiosa nomeada ao arguido se recusou a recorrer e pediu dispensa do patrocínio enquanto se encontra em curso o prazo para interpor o recurso, não pode ao arguido que pretendia recorrer ser coartado desse direito.

32 - Por conseguinte, o facto de no ponto 15 da reclamação não se encontrar expresso que a interpretação dada pelo Tribunal da Relação aos artigos em causa é inconstitucional, "mesmo no caso de recusa do defensor oficioso em interpor o competente recurso", atendendo a todo o sentido da reclamação e designadamente às demais conclusões da mesma, resulta inequivocamente que a questão de constitucionalidade que pretende ver apreciada por esse Venerando Tribunal Constitucional, foi suscitada de modo expresso, direta, clara e percetivelmente em sede de reclamação para a Conferência não podendo por conseguinte, considerar-se, tal qual o fez a Exmª Juíza Conselheira Relatora, uma questão nova à qual o Tribunal a quo não foi chamado a pronunciar-se, e por isso motivo de rejeição do recurso.

33 - Dúvidas não devem restar que não se trata de uma questão nova e que o Tribunal a quo teve a possibilidade de se pronunciar sobre constitucionalidade da interpretação que fez do nº 3, do art. 42.º da lei 34/2004, de 29 de Julho (na redação da Lei 4/ /200, de 28.08) e ao nº 4 do artigo 66.º do C.P.P. em consonância com o artigo 411.º do C.PP., no sentido de que o prazo para interposição do recurso não se interrompia e com o pedido de substituição de defensor, mesmo no caso de recusa de interposição do recurso por parte do seu defensor oficioso.

34 - Conforme se pronunciou no seu Acórdão onde se pode ler: "Do mesmo modo dispõe o nº 4 do art. 66º, que, independentemente das vicissitudes que possam ocorrer durante o processo, o defensor nomeado para um ato mantém-se para os atos subsequentes do processo enquanto não for substituído".

35 - Não existindo, por conseguinte, em nosso entendimento, falta de correspondência entre a interpretação normativa especificada pelo Recorrente em sede recurso para o Tribunal Constitucional e a interpretação do Tribunal a quo no julgamento do caso concreto, devendo o recurso interposto para esse venerando Tribunal Constitucional ser admitido e afinal ser proferida decisão que julgue inconstitucional a interpretação das normas em apreço tal como foi feita pelo Tribunal da Relação.

36 - No que concerne à alegada falta de coincidência entre a interpretação normativa especificada pelo Recorrente, no requerimento de recurso, como padecendo de inconstitucionalidade e a interpretação que o Tribunal a quo fez ao julgar o caso, resulta e em oposição com a posição defendida pela Exmª Juíza Conselheira Relatora, que foi, efetivamente, a interpretação dada pelo Tribunal da Relação ao nº 3 do art. 42º da Lei 34/2004 de 29 de Julho (na redação da Lei nº 47/2007, de 28/08) e o artigo 66º nº 4 do C.P.P., em consonância com o art. 411º do C.P.P., no sentido de que o prazo para interposição de recurso não se interrompia com o pedido de substituição de defensor, mesmo no caso de recusa do defensor em interpor o competente recurso, que determinou a não admissão do recurso pelo Tribunal da Relação, por o considerar extemporâneo.

37 - Por conseguinte, inexistindo a invocada falta de correspondência entre a interpretação normativa especificada pelo Recorrente no recurso para esse Venerando Tribunal Constitucional e a...

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