Acórdão nº 783/19 de Tribunal Constitucional (Port, 19 de Dezembro de 2019

Magistrado ResponsávelCons. Teles Pereira
Data da Resolução19 de Dezembro de 2019
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 783/2019

Processo n.º 295/2019

1.ª Secção

Relator: Conselheiro José António Teles Pereira

Acordam na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional

I – A Causa

1. “A., S.A.” (ora Recorrente) reclamou para o Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu do ato de levantamento da suspensão de um processo de execução fiscal que corre os seus termos no Serviço de Finanças de Viseu. O processo correu os seus termos naquele tribunal com o número 242/18.2BEVIS.

Por sentença de 29/19/2018, a reclamação foi julgada improcedente.

1.1. Desta decisão recorreu a referida sociedade comercial para o Supremo Tribunal Administrativo (STA), invocando, inter alia, a inconstitucionalidade da norma contida no artigo 169.º, n.º 1, do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT).

Por acórdão de 16/01/2019, o STA negou provimento ao recurso.

1.2. A Recorrente interpôs, então, recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC, tendo em vista um juízo de inconstitucionalidade da norma contida no n.º 1 do artigo 169.º do CPPT.

1.2.1. Pela relatora originária do processo foi proferido despacho de convite à indicação precisa da interpretação normativa a sindicar através do recurso.

1.2.2. Após a prolação do referido despacho, sobreveio a cessação de funções da relatora originária no Tribunal Constitucional, sendo o processo redistribuído ao ora relator.

1.2.3. Após ter sido redistribuído o processo, esclareceu a Recorrente, em resposta ao despacho de convite indicado em “1.2.1.”, que pretendeu questionar a interpretação do n.º 1 do artigo 169.º do CPPT no sentido de excluir do seu âmbito os pedidos de revisão de atos tributários apresentados após o prazo de 120 dias, previsto para a reclamação graciosa.

1.2.4. Na sequência do aperfeiçoamento, foi determinada a notificação das partes para alegarem.

1.2.5. A Recorrente ofereceu as suas alegações, assim concluindo:

“[…]

1. Não há nenhuma distinção relevante entre o pedido de revisão apresentado dentro do prazo de reclamação graciosa e o mesmo pedido apresentado para lá desse prazo. Isto, segundo a grelha de análise que aqui importa — ou seja, tendo em consideração os princípios que formam a razão de ser do enquadramento do pedido de revisão no n.º 1 do artigo 169.º do CPPT.

2. Se se queria evitar aquela dualidade de efeitos relativamente a meios legais com a mesma razão de ser (o pedido de revisão e a reclamação graciosa, nomeadamente), em nome dos princípios da igualdade e da tutela jurisdicional efetiva de direitos e interesses legalmente protegidos, então o pedido de revisão oficiosa também deveria ser considerado dentro do âmbito daquele dispositivo.

3. Com efeito, a lei, devidamente explicada e densificada pela doutrina e pela jurisprudência, trata este pedido como um expediente normal, próprio, típico e principal de contestação da legalidade de atos tributários, tanto quanto o pedido de revisão dentro do prazo de reclamação administrativa.

4. A doutrina em que nos vimos apoiando, assim como a Sentença recorrida, diz que, do ponto de vista da natureza, da função e dos efeitos, as duas versões do pedido de revisão de atos tributários são iguais, uma vez que a razão material de ser, de uma e de outra, é exatamente a mesma.

5. É por isso que, segundo a doutrina e a jurisprudência, em ambas as versões do pedido de revisão os contribuintes podem contestar os atos com base em matéria de facto ou de direito. É por isso que em ambas as versões o erro de direito ou de facto se presume imputável aos serviços da AT. É por isso que em ambas versões o indeferimento expresso ou tácito abre a via da impugnação contenciosa.

6. Dúvidas não restam de que, na ausência do pedido de revisão da letra do n.º 1 do artigo 169.º do CPPT, o seu conteúdo, devidamente integrado, teria de prever quer o pedido de revisão apresentado dentro prazo de "reclamação administrativa" quer o pedido deduzido para lá desse prazo, porque, à luz das razões de justiça material que recomendam a inclusão do primeiro, não é legitimamente possível deixar de fora o segundo, relativamente ao qual se aplicam as mesmas razões de justiça material.

7. E não se diga que a inclusão do primeiro tem arrimo na letra da lei (que fala em “reclamação administrativa”) e que o princípio da interpretação segundo o qual não se pode fazer uma interpretação que não tenha um mínimo de correspondência na letra da lei recomendava a abertura da norma apenas ao pedido feito dentro do prazo de “reclamação administrativa”.

8. É que, em primeiro lugar, o pedido de revisão também não é uma reclamação administrativa: a sua inclusão no âmbito de aplicação do n.º 1 do artigo 169.º do CPPT não decorre de uma interpretação sobre o seu respaldo literal, mas sim de um raciocínio de equiparação à natureza, função e efeitos da reclamação graciosa, com base nos princípios da igualdade no acesso ao direito, conjugado com o da tutela jurisdicional efetiva de direitos e interesses legalmente protegidos (se o pedido de revisão é a mesma coisa que a reclamação graciosa, então se for apresentado no mesmo prazo pode suspender a execução). Daí que não haja qualquer razão para afastar da previsão da norma o pedido de revisão deduzido em momento posterior ao fim do prazo de reclamação graciosa: este, quanto à sua natureza, função e efeitos, também já é equiparado à reclamação graciosa.

9. De resto, em segundo lugar, obviamente que aquele princípio de interpretação da lei, por muito relevante que seja, não se pode sobrepor aos princípios constitucionais de primeiríssima importância que aqui em jogo.

10. Nestes termos, o n.º 1 do artigo 169.º do CPPT é inconstitucional, por violação dos princípios constitucionais da igualdade, na dimensão de igualdade no acesso ao direito, consagrado no artigo 13° da CRP, e da tutela jurisdicional efetiva de direitos e interesses legalmente protegidos, consagrado no artigo 200.º e no n.º 4 do artigo 268.º da CRP.

Termos em que o presente recurso deve ser julgado procedente, por provado, com todas as consequências legais, designadamente a declaração de inconstitucionalidade do n.º 1 do artigo 169.º do CPPT, na sua específica dimensão aqui em apreço.

[…]” (sublinhados conforme original).

1.2.6. A Recorrida não apresentou contra-alegações.

Cumpre apreciar e decidir.

II – Fundamentação

2. A questão da inconstitucionalidade da norma contida no artigo 169.º, n.º 1, do CPPT, na interpretação segundo a qual os pedidos de revisão de atos tributários apresentados pelo sujeito passivo ao abrigo do artigo 78.º da Lei Geral Tributária (LGT) para além do prazo de 120 dias previsto no n.º 1 do artigo 70.º do CPPT não suspendem a execução foi já apreciada pelo Tribunal Constitucional, por cinco vezes, em jurisprudência recente.

2.1. No Acórdão n.º 501/2019, o Tribunal pronunciou-se no sentido de não julgar inconstitucional o n.º 1 do artigo 169.º do CPPT, na interpretação segundo a qual o pedido de revisão do ato tributário, acompanhado de prestação de garantia, apresentado pelo sujeito passivo nos termos do artigo 78.º da LGT, após o prazo de 120 dias a que se refere o artigo 70.º do mesmo CPPT, não suspende o processo de execução fiscal, juízo que foi reiterado nos Acórdãos n.os 579/2019, 580/2019, 590/2019 e, por último, 687/2019, desta 1.ª Secção.

Os...

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