Acórdão nº 42/20 de Tribunal Constitucional (Port, 16 de Janeiro de 2020

Magistrado ResponsávelCons. Gonçalo Almeida Ribeiro
Data da Resolução16 de Janeiro de 2020
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 42/2020

Processo n.º 736/2019

3ª Secção

Relator: Conselheiro Gonçalo de Almeida Ribeiro

Acordam, em conferência, na 3ª secção do Tribunal Constitucional

I. Relatório

1. Nos presentes autos, vindos do Tribunal da Relação do Porto, em que é reclamante A. e reclamado o Ministério Público, o primeiro reclamou, ao abrigo do artigo 76.º, n.º 4, da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (Lei do Tribunal Constitucional, referida adiante pela sigla «LTC»), do despacho de 29 de maio de 2019, daquele Tribunal, que não admitiu o recurso para o Tribunal Constitucional.

2. O ora reclamante, na qualidade de arguido em processo-crime, interpôs recurso para o Tribunal da Relação do Porto do acórdão do Tribunal de 1.ª instância que o condenou pela prática de um crime de recebimento indevido de vantagem agravado numa pena de um ano e oito meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período e sob condição de realizar determinado pagamento pecuniário ao Estado.

Por acórdão datado de 8 de março de 2019, o Tribunal da Relação do Porto, não obstante ter introduzido uma modificação num ponto da matéria de facto, negou provimento ao recurso, confirmando o acórdão recorrido.

Notificado de tal decisão, o ora reclamante arguiu a sua nulidade e requereu a sua retificação.

Com interesse para os autos, pode ler-se em tal peça processual:

«A., Recorrente melhor identificado nos autos à margem referenciados, notificado que foi do Acórdão proferido em 08/03/2019, de fls. que negou provimento ao seu recurso vem, nos termos e para os efeitos dos artigos 379º do Cód. Proc. Penal, 666º, n.º 1, 615º, n.º 1, al. d) e n.º 4 do Cód. Proc. Civil, aplicados ex vi artigo 4º do Cód. Proc. Penal, arguir a nulidade do Acórdão por omissão de pronúncia e por violação do preceito constitucional previsto no artigo 32º, bem como nos termos do disposto no artigo 380º, n.º 1, al. b) do Cód. Proc. Penal, aplicado por remissão do artigo 425º, n.º 4 do mesmo diploma, requerer a correção do referido Acórdão, o que faz nos termos e com os fundamentos seguintes:

I - DA NULIDADE POR VIOLAÇÃO DO ARTIGO N.º 32º DA CRP

Em momento anterior à apresentação das Alegações finais de Recurso do Acórdão da 1ª instância, apresentadas pelo Recorrente para este Tribunal, o mesmo deduziu dois recursos interlocutórios de dois despachos proferidos pelo Tribunal Recorrido, em 22/06/2018 e em 26/06/2018.

Ambos os recursos, atento à disposição conjugada dos artigos 406º nº. 1, 407º nº. 3 e 408º, n.º 1, al. a), todos do Cód. Proc. Penal, têm efeito meramente devolutivo e são de subida a final e nos próprios autos.

A este respeito, o Acórdão proferido por esta Relação, aqui sob resposta, decidiu o seguinte:

“Relativamente aos recursos interlocutórios intentados pelo arguido A. (relativos às decisões que indeferiram irregularidades arguidas relativamente à disponibilização de uma cópia escrita de um ato judicial e da concessão de determinado prazo) o mesmo, nas suas conclusões artigo 412% nºs, do Código de Processo Penal não especificou (dever de natureza obrigatória) que mantinha o interesse na sua apreciação, motivo pelo qual não serão considerados.” Vide pág. 43 do Acórdão sob resposta.

Ora, dispõe o artigo 417º, nº 3 do Cód. Proc. Penal o seguinte:

“3 - Se das conclusões do recurso não for possível deduzir total ou parcialmente as indicações previstas nos n.os 2 a 5 do artigo 412.º, o relator convida o recorrente a completar ou esclarecer as conclusões formuladas, no prazo de 10 dias, sob pena de o recurso ser rejeitado ou não ser conhecido na parte afetada. Se a motivação do recurso não contiver as conclusões e não tiver sido formulado o convite a que se refere o n.º 2 do artigo 414.º, o relator convida o recorrente a apresentá-las em 10 dias, sob pena de o recurso ser rejeitado.”, sublinhado e realce nosso.

Sucedeu que, no caso sub judice, tal não aconteceu.

Pelo contrário, o Tribunal Recorrente, indeferiu liminarmente a apreciação de ambos os recursos interlocutórios, nos termos supratranscritos.

Com efeito, o Tribunal Recorrente, em face da omissão da declaração da vontade do Recorrente na apreciação dos referidos recursos interlocutórios, não cumpriu a obrigação do convite ao aperfeiçoamento nos termos deste normativo legal.

Sucede que, interpretar o artigo 412º do Cód. Proc. Penal no sentido de que a falta de indicação, nas conclusões da motivação, de qualquer das menções contidas nesse preceito, tem como efeito a rejeição liminar do recurso do arguido, sem que ao mesmo seja facultada a oportunidade de suprir tal deficiência, consubstancia uma nulidade por violação do preceito constitucional previsto no artigo 32º da CRP, o que desde já se e expressamente se argui, com todas as demais consequências legais.

(…)»

3. Por acórdão de 8 de maio de 2019, o Tribunal da Relação do Porto julgou improcedente a arguição de nulidade e de retificação.

Notificado desta decisão, o reclamante interpôs recurso para o Tribunal Constitucional, através de requerimento onde se pode ler o seguinte:

«A., Arguido nos autos à margem referenciados, notificado que foi do teor do Acórdão deste Tribunal da Relação do Porto a fls..., bem como do Acórdão subsequente que se pronunciou sobre o pedido de declaração de nulidade e correção do Acórdão proferido, a fls..., vem, ao abrigo do disposto no art." 72º/n.º 1, al. b) e n.º 2, 75º/n.º 1, e com o fundamento previsto pela alínea b) do n.º 1 do art.º 70º da Lei n.º 28/82, de 15/11, com as alterações que lhe foram introduzidas pela Lei n.º 143/85, de 26/11, pela Lei Orgânica n.º 85/89, de 07/09, pela Lei n.º 88/95, de 01/09 e Lei n.º 13-A/98, de 26/02, interpor RECURSO para o

TRIBUNAL CONSTITUCIONAL

O qual, no cumprimento das formalidades de interposição a que alude o art.º 75º-A do mesmo diploma legal, faz nos seguintes termos:

A)

O Recorrente, em momento anterior à apresentação das Alegações finais de Recurso do Acórdão proferido pela 1ª instância, apresentadas pelo Recorrente para o Tribunal da Relação do Porto, o mesmo deduziu dois recursos de dois despachos interlocutórios proferidos pelo Tribunal Recorrido, em 22/06/2018 e em 26/06/2018.

Sucede que, por manifesto lapso, nas alegações de recurso da decisão final da instância, não se fez constar nas respetivas conclusões que o Recorrente mantinha interesse na apreciação daqueles recursos dos despachos interlocutórios.

O Tribunal da Relação do Porto interpretou e aplicou o artigo 412º do Cód. Proc. Penal no sentido de que a falta de indicação, nas conclusões da motivação, de qualquer das menções contidas nesse preceito, tem como efeito a rejeição liminar do recurso do arguido, sem que ao mesmo tenha de ser facultada a oportunidade de suprir tal deficiência.

Assim, o Tribunal da Relação do Porto interpretou e aplicou o artigo 412º do Cód. Proc. Penal em violação do artigo 417º/3 do mesmo diploma, consubstanciando tal interpretação igualmente uma violação do preceito constitucional previsto no artigo 32º/1 da GRP.

O Recorrente suscitou a questão da inconstitucionalidade da interpretação adotada pelo Tribunal recorrido, no seu Requerimento datado de 21/03/2019, com a Referência Citius n.º 31929097, que aqui se dá integralmente por reproduzida.

B)

O Tribunal recorrido da instância procedeu à alteração dos factos imputados ao Arguido e procedeu á alteração da sua qualificação jurídica, determinando que tal alteração se tratou de uma alteração não substancial, com todas as inerentes e decorrentes implicações para o exercício do direito de defesa do Arguido, entendimento este em que foi sufragado pelo Tribunal da Relação do Porto no âmbito do recurso que este conheceu da decisão precedente.

Assim, o Tribunal da instância, bem como o Tribunal da Relação do Porto interpretou e aplicou o artigo 358º, n.º 1 e 3, 359º e 1º, al. f) do Código de Processo Penal em absoluta desconformidade com o espírito e letra da lei, violando nessa sequência o disposto no artigo 32º/l e 5 da GRP.

O Recorrente suscitou a questão da ilegalidade e da inconstitucionalidade da interpretação adotada pelos Tribunais recorridos, no seu Requerimento datado de 28/06/2018, com a Referência Citius n.º 29572161, bem como nas suas Alegações de Recurso apresentadas em 09/10/2018, com a Referência Citius n.º 30328919, que aqui se dão integralmente por reproduzidas.

C)

O Tribunal da 1ª instância considerou como provados factos com base em presunções que fez de factos já por si presumidos (dupla indução), tendo igualmente considerado provados factos sem respeitar o Princípio In Dúbio Pro Reu no processo de produção de prova.

Este entendimento foi igualmente sufragado pelo Tribunal da Relação do Porto no âmbito do Acórdão proferido que se pronunciou sobre o recurso que se lhe apresentou.

Deste modo, o Tribunal da 1ª instância, bem como o Tribunal da Relação do Porto, violaram os artigos 349º do Cód. Civil, 127º do Cód. Proc. Penal e artigo 32º/2 da C.R.P.

O Recorrente suscitou a questão da inconstitucionalidade da interpretação adotada pelo Tribunal recorrido, nas suas Alegações de Recurso apresentadas em 09/10/2018, com a Referência Citius n.º 30328919, que aqui se dão integralmente por reproduzidas.

Assim, porque em tempo, ser a decisão recorrível e ter o Recorrente legitimidade {cfr. art.º 75º/1, alínea b) do n.º 1 e n.º 2 do art.º 70º e 72º/n.º 1 al. b) da Lei n.º 28/82 de 15/11}, vem requer a Vª. Exª. Se digne admitir o presente recurso.»

4. Foi então proferido o despacho de não admissão do recurso de constitucionalidade, com o seguinte teor:

«Requerimento do arguido A. (refª. 32524967).

Não cabe recurso para o Tribunal Constitucional das deliberações que apliquem norma cuja inconstitucionalidade não haja sido suscitada...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT