Acórdão nº 64/20 de Tribunal Constitucional (Port, 04 de Fevereiro de 2020

Magistrado ResponsávelCons. Maria de Fátima Mata-Mouros
Data da Resolução04 de Fevereiro de 2020
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 64/2020

Processo n.º 866/19

1.ª Secção

Relator: Conselheira Maria de Fátima Mata-Mouros

Acordam, em Conferência, na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional,

I – Relatório

1. Nos presentes autos, A., S.A. interpôs recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo das alíneas b), c) e i) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (Lei da Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional, doravante designada por LTC), delimitando o objeto respetivo nos seguintes termos:

«A inconstitucionalidade da interpretação que o Acórdão recorrido e consequente decisão sobre as nulidades fazem da norma constante da alínea a) do n.º 1 do artigo 1091.º do Código Civil, na redação introduzida pela Lei n.º 6/2006, de 27.Fev. (direito de preferência), por manifesta violação do disposto nos artigos 12.º e 13.º da Constituição (…) mas também por manifesta violação dos artigos 209.º, 223.º e 227.º da Constituição (…) por ter o Acórdão recorrido inclusive interpretado a referida norma da alínea a) do n.º 1 do artigo 1091.º do Cód. Civil à revelia do que foi já decidido pelo Tribunal Constitucional no Acórdão n.º 583/2016 e pelo Supremo Tribunal de Justiça no Acórdão de 21/01/2016 2.ª Secção;

(…) O Tribunal da Relação de Coimbra, ao decidir, no Acórdão recorrido, que “não tem aqui, pois, cabimento a aplicação do regime da propriedade horizontal” (pág. 29), e que “…não se pode considerar a fração arrendada como parte de um edifício, que careça de ser constituído em propriedade horizontal” para sustentar o reconhecimento do direito de preferência à autora, cai irremediavelmente (…) em manifesta contradição com a decisão do Tribunal Constitucional (…) Acórdão n.º 583/2016.

(…) Ao alinhar o Tribunal da Relação de Coimbra em sentido contrário entrou em flagrante violação com a Constituição da República Portuguesa, a competência e a interpretação que desse artigo já fez o Tribunal Constitucional, a hierarquia e organização dos Tribunais e a competência do Supremo Tribunal de Justiça, cometendo manifesta inconstitucionalidade na interpretação que fez de tal norma.

(…) [I]nconstitucionalidade da interpretação que o Acórdão recorrido faz da norma constante do artigo 615.º, n.º 1 do Código de Processo Civil, ao considerar que não existe contradição entre a matéria de facto provada – mesmo após profunda reformulação da mesma que realizou – e a decisão.

(…)[I]nconstitucionalidade da interpretação que o Tribunal recorrido faz da norma constante dos artigos 3.º e 609.º, n.º 1 e 5.º do Código de Processo Civil, respetivamente, princípios do pedido e do dispositivo (…), no sentido de considerar que condenar a vendedora a autonomizar juridicamente o locado (se inclusive na Conservatória do Registo Predial tal autonomia não existe, nem existem sequer certezas ou informação oficial quanto às áreas das partes que o compõem) está dentro da liberdade de gestão processual e não a condenar em objeto diferente do pedido, é uma interpretação inconstitucional da norma constante de tal artigo.

(…) [I]nconstitucionalidade da interpretação que o Acórdão recorrido faz da norma constante do artigo 607.º, n.º 5 do Código de Processo Civil, por manifesta violação do artigo 205.º da Constituição da República Portuguesa (…), no sentido de que o julgador pode afastar, sem justificação fundamentada e apoiada em razões de ciência, prova pericial produzida.»

3. Na Decisão Sumária n.º 735/2019, proferida ao abrigo do disposto no artigo 78.º-A, n.º 1, da LTC, decidiu-se não conhecer do objeto do recurso, com base na fundamentação que, de seguida, se transcreve:

«(…)3. Nos termos do n.º 1 do artigo 75.º-A da LTC, o requerimento de interposição de recurso para o Tribunal Constitucional deve indicar a alínea do n.º 1 do artigo 70.º ao abrigo da qual o recurso é interposto.

Em cumprimento de tal norma, a recorrente indica as alíneas b), c) e i).

No que se refere à alínea c) é manifesto que tal previsão não tem qualquer relação com a concreta situação dos autos. Na verdade, o presente recurso não se baseia em qualquer recusa de aplicação de norma constante de ato legislativo, com fundamento na sua ilegalidade por violação de lei com valor reforçado.

Quanto à indicação da alínea i), igualmente se dirá que a situação dos autos não se enquadra na respetiva previsão normativa, porquanto, por um lado, não se verifica uma qualquer recusa de aplicação de norma constante de ato legislativo com fundamento na sua contrariedade com uma convenção internacional, e, por outro lado, não estamos perante um caso de aplicação de norma, constante de ato legislativo, em desconformidade com um juízo, anteriormente formulado pelo Tribunal Constitucional, acerca da sua conformidade com uma convenção internacional.

Resta-nos, pois, a apreciação do presente recurso, à luz da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC.

4. Começa-se por recordar que o Tribunal Constitucional tem entendido, de modo reiterado e uniforme, serem requisitos cumulativos do recurso previsto na alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC, a existência de um objeto normativo – norma ou interpretação normativa – como alvo da apreciação, o esgotamento dos recursos ordinários (artigo 70.º, n.º...

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