Acórdão nº 85/20 de Tribunal Constitucional (Port, 05 de Fevereiro de 2020

Magistrado ResponsávelCons. Maria José Rangel de Mesquita
Data da Resolução05 de Fevereiro de 2020
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 85/2020

Processo n.º 1122/18

3.ª Secção

Relator: Conselheira Maria José Rangel de Mesquita

Acordam, em conferência, na 3.ª Secção do Tribunal Constitucional

I – Relatório

1. Nos presentes autos, vindos do Supremo Tribunal de Justiça, em que é recorrente A. e recorrido o ministério Público, o primeiro, notificado do Acórdão n.º 504/2019 deste Tribunal que indeferiu a reclamação para a conferência apresentada pela recorrente da Decisão Sumária n.º 484/2019 –, na qual se decidiu não conhecer do objeto do recurso de constitucionalidade por si interposto, por falta de preenchimento dos pressupostos, essenciais e cumulativos, de que depende a admissibilidade do recurso interposto ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (Lei do Tribunal Constitucional, adiante designada pela sigla LTC) – apresentou requerimento de arguição de inconstitucionalidade e de reforma do mesmo Acórdão quanto a custas.

2. Na Decisão Sumária n.º 484/2019 foi o recorrente condenado em custas, nos termos do artigo 84.º, n.º 3, da LTC, que se fixaram em 7 Unidades de Conta, nos termos do n.º 2 do artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 303/98, de 7 de outubro, ponderados os critérios previstos no n.º 1 do artigo 9.º do mesmo diploma e a prática do Tribunal em casos semelhantes (cf. III) e, no Acórdão n.º 504/2019, que indeferiu a reclamação dirigida contra aquela Decisão Sumária, foi o recorrente condenado em custas, nos termos do disposto nos artigos 7.º e 9.º, n.º 1, do referido Decreto-Lei n.º 303/98, de 7 de outubro, e tendo em conta a prática do Tribunal em casos semelhantes, que se fixaram em 20 Unidades de Conta.

3. Notificado do Acórdão n.º 504/2019, veio o recorrente pugnar pela inconstitucionalidade do regime de custas neste Tribunal e, também, cautelarmente, pela reforma desse Acórdão no que às custas aplicadas diz respeito (cf. fls. 176-178, reiterada a fls. 181-183 e 191-193).

O Ministério Público junto deste Tribunal pronunciou-se no sentido do indeferimento da reclamação (cf. fls. 196-197).

O requerimento de invocação de inconstitucionalidade do regime de custas neste Tribunal e de pedido de reforma do Acórdão n.º 504/2019 em matéria de custas e de não execução da conta de custas elaborada de acordo com o aí decidido foi indeferido pelo Acórdão n.º 678/2019.

4. Notificado do Acórdão n.º 678/2019, veio o recorrente apresentar requerimento nos seguintes termos (cfr. 215-219):

«A., recorrente nos Autos à margem epigrafado, tendo sido notificado em 15/11/2019, do acórdão 678/2019, em que foi condenado em 15 UNIDADES DE CONTA, com invocação dos artigos 7.º e 8.°, do Decreto-Lei n.° 303/98, de 7 de Outubro, VEM, nos termos e para efeitos do disposto no artigo 84.°, do LFTC (1982), e artigos 1.°, 2.°, 9.°, alínea b), 13.°, 18.°, n.ºs 2 e 3, 20.°, n.ºs 1, 4 e 5, 62.°, n.° 1, 202.°, n.ºs 1 e 2, e 204.°, 205.°, 266.° a 268.°, n.° 3, 280.° e 282.°, da CRP 1976, requerer o seguinte.

RECLAMAÇÃO DA CONTA - CUSTAS PROFERIDAS NOS PRESENTES AUTOS E DEMAIS (RECLAMAÇÕES CONEXAS)

Com os FUNDAMENTOS de FACTO e de DIREITO que se passam a expor

PARTE I - DA FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO E DE DIREITO

1- O reclamante, não obstante ser cidadão estrangeiro, paga e vive, de forma legalmente permitida peias Leis da República Portuguesa em Portugal, gozando, consabidamente, de iguais direitos dos cidadãos nacionais. Ora,

2- Após calcorrear «a via sacra» da pirâmide dos Tribunais, posta no artigo 209.°, da CRP 1976, viu-se, por tais questões de constitucionalidade não terem sido abordadas ou atendidas, convenientemente, em contexto de «juiz constitucional difuso» (artigo 204.°, da CRP 1976), a recorrer para o chamado «juiz constitucional concentrado», isto é, este egrégio Tribunal a que nos dirigimos, com respeito e elevada consideração, não obstante os termos postos, pelo mesmo, nas várias respostas e acórdãos proferidos. De facto,

3- Constata-se que em 19 de Julho de 2019, no contexto do Decisão Sumária n.° 484/2019, foi o arguido condenado em 7 UCs, com a convocação do 84.°, n.° 3, da LFTC, e 6.°, n.° 2, e 9.°, n.° 1, do Decreto-Lei 303/98, referindo-se:

(...)

74- Em suma, o Tribunal Constitucional, ao mesmo arguido, no contexto do mesmo assunto penal, relativo à inconstitucionalidade material da não permissão de pagamento de multa criminal em prazo superior ao indicado e por quantias inferiores, por míngua de «posses», veio o Tribunal Constitucional, contra o disposto no artigo 84.°, do LFTC, e artigos 6, 7.°, 8.° e 9.°, do Decreto-Lei n.° 303/98, de 7 de Outubro, a aplicar:

Total: 7 + 15 + 20 = 42 UCs, ou seja, o valor de € 4.284,00

8- Importa notar que o Decreto-Lei n° 303/98, de 7 de Outubro, foi alterado pela Lei n.° 27/2019, de 28 de Março.

9- O Decreto-Lei n.° 303/98, de 7 de Outubro, foi adoptado à luz do artigo 198.°, n.° 1, alínea c), e 112.°, n.° 5, da CRP 1976, pelo XIII Governo da República, liderado pelo Engenheiro ANTÓNIO GUTERRES.

10- O dito diploma regulava a taxa de justiça, na Secção III, artigos 6.° a 9.°, impondo que os julgadores, combinando as normas da LTC (1982), mormente o seu artigo 84.°, procedessem, caso a caso, à fundamentação de facto e de Direito, isto é, fazendo notar ao recorrente ou reclamante as «razões» da condenação em custas, quer pelo decaimento, quer por qualquer outra razão justiçada, em termos de proporcionalidade e proibição de excesso, já que, consabidamente, a condenação tem de ser «justa e legal», pois trata-se de ablar ou restringir o direito de propriedade, somente tal podendo ocorrer mediante «justa causa», que será sempre uma conduta processual reprovável. Ocorre que,

11- Ao tocar com o direito de propriedade e possuir, inequivocamente, uma natureza sancionatória (e ablativa do direito de propriedade), exige-se que o diploma tenha prévia autorização legislativa da Assembleia da República, visto que tal é reserva da competência relativa de tal órgão de soberania, como inequivocamente o refere o artigo 165.°, n.° 1, alíneas b), c) e d), já que estas «custas» possuem, inequivocamente, natureza sancionatória. Além disso,

12- Verifíca-se que é o Tribunal Constitucional que beneficia destas «receitas» o que significa que, nesta matéria, pode incorrer-se no «risco de terrorismo sancionatório, criminal, contraordenacional ou "multa", processual-civil-administrativo- e-penal. E, se dúvidas existissem sobre a inconstitucionalidade ORGÂNICA, FORMAL e MATERIAL do actual regime das custas, junto do Tribunal Constitucional, bastaria atentar no teor justificativo da Lei n.° 27/2019, de 28 de Março, que alterou o regime executivo das multas e custas processuais não pagas. De facto,

13- O legislado indica que o diploma é adoptado à luz do disposto no artigo 161.°, alínea c), da CRP 1976, mas, note-se, poderia tê-lo feito à luz do disposto no artigo 165.°, n.° 1, alíneas a), b), c) e d), da CRP 1976, já que se contende com direitos fundamentais e se está ao nível de um direito sancionatório especial (civil, administrativo, penal e constitucional), ligado aos processos e «boa ordem nos mesmos». E, portanto,

14- Este regime especial, de difícil compreensão numa Sociedade Democrática, já que é um «favor discriminatório e inconstitucional», para um Tribunal que é, lamentavelmente, «político», como avisadamente o disse e escreveu GOMES CANOTILHO, no n.° 1, da Revista Julgar, em que se reescrevem as normas constitucionais pela «pena ou mão» dos sempre muito prestigiados Juízes-Conselheiros que nele têm assento. E, assim sendo,

15-A não ser por um proteccionismo de classe é que se pode compreender esta posição excessiva quanto á condenação em custas . Para mais.

16- Como o Tribunal Constitucional o reconheceu, recentemente, em contexto muito similar, o cidadão não pode «ter de pagar» para reclamar das custas, nem no civil (acórdão n." 73/2019, Diário da República n° 37/2019, Série I de 2019-02-21, páginas 1394-1397). na URL: https://dre.Pt/apDlication/File/a/i 19975816>]. nem no Constitucional ou penal (ou administrativo), E, por isso.

17- Na Decisão Sumária e nos dois acórdãos, relativos a este Recorrente, acima indicados, nunca poderia a condenação em CUSTAS deixar de ser DISCRIMINADA, quer relativamente ao decaimento do assunto, a tribunal de uma forma; quer a essoutras relativamente à reclamação das custas, onde o Tribunal, maquiavelicamente, aplicou 35 UCs. E, por isso,

18- Logrou granjear, para a Biblioteca do TC, legião de assessores e ostensivas e ociosas viagens, custeadas, indevidamente, avultados réditos. Acresce, ainda, que

19- No sistema jurídico português, o legislador constituinte, no artigo 62.°, da CRP 1976, protegeu o património do cidadão, aí não se prevendo, como se devia, por força do exigido no artigo 18.°, n,° 2, da CRP 1976, que existisse uma autorização legislativa à «perda da propriedade», em contexto criminal, punitivo, ou em contexto sancionatório processual penal, civil, administrativo ou constitucional. O que significa que

20- Inexiste autorização constitucional expressa que permita, quer dentro, quer fora de sentença judicial, a ablação, total ou parcial, do direito de propriedade. E, por isso,

21- Todos os aplicadores do Direito fazem uma ficção ou toleram, contra o disposto nos artigos 204.°, 280.° e 282.°, da CRP 1976, que se verifique a perda de objectos e instrumentos, a aplicação de multas criminais e coimas, sem que tal esteja "autorizado" pelo legislador constituinte. Ora,

22- Está na altura de o Tribunal Constitucional «re-escrever», o artigo 62.°, da CRP 1976, à luz dos artigos 1.°, 13.°, 18.°, n.°®2 e 3, da CRP 1976, de tal modo que se deva considerar deslegitimada toda a ablação de património, sempre que inexistir uma «JUSTA CAUSA», prevista na Grundnorm, em termos claros e inequívocos. Além disso,

23- Exige-se que, em cada...

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