Acórdão nº 337/20 de Tribunal Constitucional (Port, 25 de Junho de 2020

Magistrado ResponsávelCons. Lino Rodrigues Ribeiro
Data da Resolução25 de Junho de 2020
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 337/2020

Processo n.º 221/20

3.ª Secção

Relator: Conselheiro Lino Rodrigues Ribeiro

Acordam, em conferência, na 3.ª Secção do Tribunal Constitucional

I – Relatório

1. Nos presentes autos, vindos do Tribunal Judicial da Comarca de Braga, em que é reclamante A. e reclamada B., Lda., o primeiro interpôs recurso de constitucionalidade ao abrigo do disposto no artigo 70.º, n.º 1, alínea b), da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (LTC), da decisão proferida por aquele Tribunal no dia 11 de julho de 2019, que julgou totalmente procedente a ação de processo civil comum intentada pela autora contra o réu, aqui reclamante.

Antes de interpor o dito recurso de constitucionalidade o réu arguiu a nulidade e requereu a reforma daquela sentença, pretensões estas que foram indeferidas por decisão datada de 21 de outubro de 2019 (cf. as fls. 22 s. dos autos).

2. O réu interpôs então recurso de constitucionalidade, que concluiu nos seguintes termos:

«(...)

Nos termos do disposto no art. 75.º - A, da LTC, o recorrente indica que o recurso é interposto ao abrigo da alínea b), do n.º 1, do artigo 70.º;

Ainda ao abrigo do disposto no n.º 2, do art. 75.º A, da LTC, indica que as normas cuja inconstitucionalidade ou ilegalidade se pretende que o Tribunal Constitucional aprecie versam sobre o artigo 8.º, número 3, alínea c) da Lei do Financiamento dos Partidos Políticos, o artigo 16.º, número 3 da Lei Orgânica n.º 1/2001, de 14 de agosto, o artigo 13.º da Constituição da República Portuguesa e os artigos 280.º, 286.º, 289.º, 798.º e 799.º, todos do Código Civil.

Mais indica que tais questões foram suscitadas na peça processual de reclamação de sentença e após a sua prolação que suscitou as ditas questões de inconstitucionalidade.

(...)

Com efeito, em súmula,

- O n.º 3, do artigo 16.º, da Lei orgânica n.º 1/2001, de 14 de agosto pressupõe uma total independência entre órgãos autárquicos e não pode ser interpretado sem que seja reconhecida a divisão administrativa e a independência que a própria lei reconhece no artigo 236.º, da Constituição;

- Interpretação alguma da citada norma jurídica do n.º 3, do artigo 16.º, da Lei orgânica n.º 1/2001, de 14 de agosto pode atribuir a terceiros a responsabilidade por gastos de outras candidaturas de outros cidadãos a diferentes órgãos;

- O n.º 3, do artigo 16.º, da Lei orgânica n.º1/2001, de 14 de agosto não pode ser interpretado, sob pena da incorrida inconstitucionalidade, em como ser candidato à Câmara Municipal é a mesma coisa que ser candidato à Assembleia Municipal ou até mesmo às sucessivas e diferentes Assembleias de Freguesia;

- A interpretação da alínea c), do n.º 3, do artigo 8.º, da Lei de Financiamento dos Partidos Políticos não abarca a possibilidade de imputar a terceiros a responsabilidade pelo pagamento dos serviços de fotografia e vídeo, ainda que considerando que estes possam ter contratado no seu interesse pessoal;

- Na verdade, ao admitir-se tal interpretação ignora-se a proibição legal de ofertas/donativos aos partidos políticos e as consequências jurídicas que derivam de eventualmente haver sido celebrado negócio com essa dimensão e causa;

- Não pode a interpretação destas normas diferenciar de entre os terceiros aqueles que sejam ou não sejam candidatos, proibindo a uns a oferta e condenando outros a pagar essa mesma oferta porque tal interpretação acomete total atropelo do princípio constitucional da igualdade, plasmado no artigo 13.º da Constituição da República Portuguesa;

- Uma interpretação que ignore a proibição legal de terceiros de ofertas e ou pagamento das despesas dos partidos políticos viola o disposto no artigo 203.º da Constituição da República Portuguesa porque permite aos tribunais desobedecerem à lei, afirmando um inexistente primado das regras gerais de direito (798.º e 799.º do Código Civil) em desaforo das regras gerais de nulidade (280.º, 286.º, 289.º do Código Civil) e das regras de natureza excecional (o artigo 8.º, n.º 3, alínea c) da Lei do Financiamento dos Partidos Políticos);

- Em razão de tudo o que antecede, ao decidir como decidiu, isto é, imputando ao R. a responsabilidade total pelo pagamento de todos os serviços de fotografia e vídeo prestados ao Partido, o tribunal a quo violou de forma flagrante a lei, concretamente, o artigo 8.º, n.º 3, alínea c) da Lei do Financiamento dos Partidos Políticos, o artigo 16.º, número 3 da Lei orgânica n.º 1/2001, de 14 de agosto, o artigo 13.º da Constituição da República Portuguesa e os artigos 280.º, 286.º, 289.º, 798.º e 799.º, todos do Código Civil.»

3. Por despacho datado de 9 de janeiro de 2020, o tribunal recorrido rejeitou a interposição do recurso, por entender que não fora adequadamente suscitada durante o processo uma questão de constitucionalidade de que o tribunal recorrido ficasse obrigado a conhecer (vd. a fl. 78, verso, e a fl. 79 dos autos), tendo acrescentado: «No caso vertente, o recorrente apenas suscitou a questão de inconstitucionalidade aquando do requerimento de reforma da sentença de 16.09.2019».

4. O recorrente deduziu então reclamação para a conferência no Tribunal Constitucional, o que fez nos seguintes termos:

«I – DO ENQUADRAMENTO DA QUESTÃO

̶ No processo sub judice, foi proferida sentença, em 11/07/2019, que julgou a ação totalmente procedente, por provada e, em consequência, condenou o réu a pagar à autora a quantia de € 3.994,41, acrescida dos respetivos juros de mora, contabilizados à taxa legal, desde a data de vencimento da fatura em dívida (10.11.2017) e até efetivo e integral pagamento;

̶ Não se conformando com a douta sentença, o R. e ora reclamante requereu a reforma da sentença, por entender que a mesma padecia de erro de análise e qualificação da situação sub judice e fez incorreta aplicação da lei, invocando a nulidade, manifestando também nessa peça processual arguida inconstitucionalidade de várias normas jurídicas;

̶ O caso sub judice não admitia recurso ordinário uma vez que a causa não tinha valor superior à alçada do tribunal de que se recorre (1.ª instância), isto é, era inferior a 5.000,00 € (cinco mil euros), ex vi do disposto no número 1 do artigo 629.º, do CPC.

̶ Por despacho proferido em 21/10/2019, o tribunal a quo indeferiu o pedido de reforma de sentença apresentado pelo R., referindo, além do mais, o seguinte:

“Salvo o devido respeito, a sentença proferida nestes autos afigura-se clara e evidente nos seus fundamentos e decisão.

Inexiste, com efeito, qualquer nulidade, mormente a apontada, que não traduz mais do que a discordância com a decisão relativa à matéria de facto, a coberto da invocação de algumas normas jurídicas (que não contendem, diga-se, com o decidido).

Quanto à inconstitucionalidade arguida, não se vislumbra, por um lado, onde é que ela terá sido cometida...

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