Acórdão nº 610/20 de Tribunal Constitucional (Port, 11 de Novembro de 2020

Magistrado ResponsávelCons. Pedro Machete
Data da Resolução11 de Novembro de 2020
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 610/2020

Processo n.º 825/20

2.ª Secção

Relator: Conselheiro Pedro Machete

Acordam, em conferência, na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional:

I. Relatório

1. A., notificado da Decisão Sumária n.º 578/2020, que não conheceu do mérito do recurso de constitucionalidade por aquele interposto, vem reclamar para a conferência ao abrigo do disposto no artigo 78.º-A, n.º 3, da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (Lei do Tribunal Constitucional – “LTC”).

O reclamante, recorrente nos presentes autos, em que é recorrido o Ministério Público, foi condenado em primeira instância pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes, previsto e punido pelo artigo 21.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de janeiro, na redação dada pela Lei n.º 18/2009, de 11 de maio, na pena de cinco anos e três meses de prisão. Inconformado com esta decisão, o arguido recorreu para o Tribunal da Relação do Porto, que, por acórdão de 8 de julho de 2020, negou provimento ao recurso, confirmando a decisão recorrida.

Deste acórdão o recorrente, ora reclamante, interpôs o presente recurso de constitucionalidade, ao abrigo do artigo 70.º, n.º 1, alínea b), da LTC.

2. É a seguinte a fundamentação da decisão sumária reclamada:

«5. Do requerimento de interposição de recurso resulta que o recorrente pretende que seja apreciada «a inconstitucionalidade normativa decorrente da aplicação do artigo 127.º do Código de Processo Penal», por considerar que «tal interpretação ora colocada em crise viola as garantias de defesa e da presunção de inocência e o princípio in dubio pro reo, consagrado no art. 32.º, bem como o dever de fundamentar, estatuído no artigo 205º ambos da Constituição da República Portuguesa».

Embora o recorrente, no seu requerimento de recurso, não identifique qualquer “interpretação”, «decorrente da aplicação do artigo 127.º do Código de Processo Penal» cuja conformidade constitucional pretenda sindicar, tendo o presente recurso sido interposto ao abrigo do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC, o conhecimento do seu objeto pressupõe a suscitação da inconstitucionalidade normativa durante o processo, isto é, a respetiva questão deve ter sido suscitada durante o processo, de modo a confrontar a instância recorrida com esse problema, e criando, quanto à mesma, um dever de decisão (cf. também o disposto no artigo 72.º, n.º 2, daquele diploma). No caso, tal questão de constitucionalidade normativa terá de ter sido suscitada nas alegações do recurso interposto pelo arguido para o Tribunal da Relação do Porto e, mais concretamente, nas respetivas conclusões.

Ora, analisadas as conclusões desse recurso, a única questão de constitucionalidade normativa aí suscitada pelo arguido, reportada ao artigo 127.º do CPP, encontra-se enunciada na conclusão 26: «O recorrente entende que deve ser apreciada a inconstitucionalidade da interpretação normativa do artigo 127.º do CPP, acolhida na decisão recorrida, de que a apreciação da prova segundo as regras da experiência e a livre convicção do julgador permite o recurso a presunções de prova previstas nos artigos 349.º e 350.º do Código Civil» (cf. fls. 574/v.º). Na perspetiva do recorrente, tal interpretação «viola as garantias de defesa e da presunção de inocência e o princípio in dubio pro reo, consagrado no art. 32.º, n.º 2 da Constituição da República Portuguesa, bem como, o dever de fundamentar, estatuído no artigo 205.º, n.º 1 da Constituição da República Portuguesa» (cf. conclusão 27, ibidem).

Assim, entendendo-se que, não obstante a referência que consta do requerimento de interposição de recurso para o Tribunal Constitucional à «inconstitucionalidade normativa decorrente da aplicação do artigo 127.º do Código de Processo Penal», o que o recorrente pretende é questionar a aludida interpretação deste preceito, suscitada perante o tribunal a quo, não se poderá tomar conhecimento do recurso, atenta a sua inutilidade, uma vez que o Tribunal da Relação do Porto não aplicou, no acórdão recorrido, o referido preceito ou qualquer interpretação extraída do mesmo, enquanto ratio decidendi da sua pronúncia.

Em tal aresto, o tribunal a quo, a respeito da questão suscitada pelo ora recorrente, refere o seguinte (cf. fls. 956, pág. 380 do acórdão recorrido):

«O recorrente, na discordância que expõe relativamente à deliberação proferida sobre matéria de facto (ter a prova de factos – que não concretiza – ter sido exclusivamente obtida através de...

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