Acórdão nº 69/21 de Tribunal Constitucional (Port, 22 de Janeiro de 2021

Magistrado ResponsávelCons. Lino Rodrigues Ribeiro
Data da Resolução22 de Janeiro de 2021
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 69/2021

Processo n.º 588/20

3.ª Secção

Relator: Conselheiro Lino Rodrigues Ribeiro

Acordam, em conferência, na 3.ª Secção do Tribunal Constitucional

I – Relatório

1. No âmbito dos presentes autos, vindos do Supremo Tribunal de Justiça, em que é recorrente A. e o recorrido o Ministério Público, o primeiro veio, ao abrigo do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (LTC), interpor recurso da decisão proferida por aquele Tribunal no dia 24 de junho de 2020, que não admitiu o recurso interposto pelo arguido da decisão do Tribunal da Relação de Guimarães que o condenou – pela prática de um crime de condução perigosa de veículo rodoviário, p. e p. pelo disposto no artigo 291.º, n.º 1, alínea b), do Código Penal, e de um crime de condução sem carta, p. e p. pelo disposto no artigo 3.º, n.os 1 e 2, do Decreto-Lei n.º 2/98, de 3 de janeiro – numa pena única de prisão efetiva de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses e na pena assessória de inibição de conduzir por um período de 12 (doze) meses, concedendo assim provimento parcial ao recurso interposto pelo Ministério Público da decisão da primeira instância que condenara o arguido numa pena de prisão de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses, mas suspensa na sua execução por igual período acompanhada a condição de frequentar ação de formação em condução segura, e naquela mesma pena assessória, mas com duração de 12 (doze) meses.

2. O arguido veio então interpor recurso de constitucionalidade (fls. 451 a 464 dos autos), por considerar que é inconstitucional a interpretação do artigo 400.º, n.º 1, alínea e) do Código de Processo Penal, segundo a qual «é irrecorrível o acórdão proferido pelas relações, em recurso, que aplique pena privativa da liberdade inferior a cinco anos, quando o tribunal de primeira instância tenha aplicado pena não privativa da liberdade».

3. Através da Decisão Sumária n.º 508/2020, foi decidido, ao abrigo disposto no artigo 78.º-A, n.º 1, da LTC, atenta a sólida jurisprudência já prolatada por este Tribunal sobre a norma ali em causa, julgar não julgar inconstitucional a norma contida no artigo 400.º, n.º 1, alínea e), do CPP, na redação introduzida pela Lei n.º 20/2013, de 21 de fevereiro, interpretado no sentido de ser irrecorrível o acórdão proferido, em recurso, pelo Tribunal da Relação que aplique pena privativa da liberdade não superior a cinco anos, revogando a suspensão da execução de pena de prisão decretada pelo tribunal de primeira instância. Consequentemente, negou-se provimento ao recurso interposto. Foi a seguinte fundamentação apresentada:

«3. A questão que constitui objeto do presente recurso foi já apreciada pelo Tribunal Constitucional, designadamente nos Acórdãos n.os 101/2018, de 21 de fevereiro, 804/2017, de 29 de novembro, e 357/2017, de 7 de julho, todos prolatados no sentido da não inconstitucionalidade. O último aresto referido foi o primeiro a pronunciar-se sobre esta questão depois de o Acórdão n.º 429/2016 ter vindo julgar inconstitucional a norma do artigo 400.º, n.º 1, alínea e), do Código de Processo Penal (o mesmo preceito que se coloca em crise nos presentes autos), resultante da revisão introduzida pela Lei n.º 20/2013, de 21 de fevereiro, na parte em que determina a irrecorribilidade de acórdão da Relação que, inovatoriamente em relação a absolvição proferida em 1.ª instância, condene o arguido em pena de prisão efetiva não superior a 5 anos.

No dito Acórdão n.º 357/2017, de 7 de julho, o Tribunal Constitucional, confirmando a Decisão Sumária n.º 290/2017, de que aí se reclamava, referiu que:

«4. A norma que constitui a ratio decidendi da decisão recorrida foi já objeto de vários arestos proferidos pelo Tribunal Constitucional, que têm afirmado que a garantia de recurso e demais garantias de defesa constantes do art. 32.º da CRP se bastam com a garantia de um grau – e não dois – de recurso (ver, entre muitos outros, os Acórdãos n.ºs 189/2001, 336/2001, 369/2001, 49/2003, 377/2003, 495/2003 e 102/2004, disponíveis, assim como a restante jurisprudência constitucional citada, em http://www.tribunalconstitucional.pt). Mais especificamente quanto à irrecorribilidade decorrente da alínea e) do n.º 1, do artigo 400.º, do CPP na redação introduzida pela Lei n.º 20/2013, de 21 de fevereiro, veja-se o que o Tribunal Constitucional decidiu nos Acórdãos n.º 276/2015, 516/2015 e 418/2016.

De facto, tem sido repetidamente afirmado, pela jurisprudência deste Tribunal, a este propósito, caber na discricionariedade do legislador definir os casos em que se justifica o acesso à mais alta jurisdição, desde que não consagre critérios arbitrários, desrazoáveis ou desproporcionados. E que não é arbitrário nem manifestamente infundado reservar a intervenção do STJ, por via de recurso, aos casos mais graves, aferindo a gravidade relevante pela pena que, no caso, possa ser aplicada. Essa limitação do recurso apresenta-se como “racionalmente justificada, pela mesma preocupação de não assoberbar o Supremo Tribunal de Justiça com a resolução de questões de menor gravidade (como sejam aquelas em que a pena aplicável, no caso concreto, não ultrapassa o referido limite), sendo certo que, por um lado, o direito de o arguido a ver reexaminado o seu caso se mostra já satisfeito com a pronúncia da Relação e, por outro, se obteve consenso nas duas instâncias quanto à condenação” (citado Acórdão n.º 451/03)» (cfr. Acórdão n.º 551/2009, n.º 7).

5. No que ao presente caso respeita, importa reiterar essa jurisprudência sedimentada. De facto, a mesma não é invalidada, no presente contexto, pelo Acórdão n.º 429/2016, o qual julgou inconstitucional a norma do artigo 400.º, n.º 1, alínea e), do Código de Processo Penal, resultante da revisão introduzida pela Lei n.º 20/2013, de 21 de fevereiro, que estabelece a irrecorribilidade do acórdão da Relação que, inovatoriamente face à absolvição ocorrida em 1.ª instância, condena os arguidos em pena de prisão efetiva não superior a cinco anos.

De facto, não está em causa, nos presentes autos, questão equivalente à decidida naquele aresto. Contrariamente ao caso que ditou o referido julgamento de inconstitucionalidade, nos presentes autos, a arguida foi condenada na 1ª instância. Ora, a decisão alcançada no referido Acórdão (…) fundamentou-se, precisamente, no específico caráter inovatório da condenação processada em 2.º instância.

Não ocorrendo semelhante circunstância no presente caso, resta concluir pela improcedência do juízo de inconstitucionalidade, e pela reafirmação da jurisprudência nesta matéria consolidada. À mesma conclusão tem o Tribunal Constitucional chegado em casos semelhantes, como decorre da recente Decisão Sumária n.º 37/2017 (disponível in http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/decsumarias.html), a qual decidiu não julgar inconstitucional a norma do artigo 400.º, n.º 1, alínea e), do Código de Processo Penal, na redação dada pela Lei n.º 20/2013, de 21 de fevereiro, interpretada no sentido de que é vedado o recurso para o Supremo Tribunal de Justiça de acórdão da Relação que, em recurso, imponha ao arguido não recorrente pena privativa de liberdade não superior a 5 anos, em substituição de outra que não continha tal privação.

A referida decisão tem o seguinte teor, no que ao presente caso releva:

“(...)

12. Importa ainda frisar que as razões que estiveram na base do julgamento de inconstitucionalidade alcançado no Acórdão 429/2016 não são transponíveis para a avaliação da norma ora em análise, precisamente porque existe uma diferença substancial entre as questões colocadas ao Tribunal Constitucional. Como se salientou no aludido acórdão, «os elementos caracterizadores da norma que cumpre apreciar são o facto de, no caso presente, ter existido uma decisão absolutória da primeira instância que é revertida pela decisão do Tribunal da Relação e essa reversão resultar na...

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