Acórdão nº 205/09 de Tribunal Constitucional (Port, 29 de Abril de 2009

Magistrado ResponsávelCons. Gil Galv
Data da Resolução29 de Abril de 2009
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 205/2009

Processo n.º 139/09

  1. Secção

Relator: Conselheiro Gil Galvão

Acordam, em conferência, na 1ª Secção do Tribunal Constitucional:

I – Relatório

  1. Por acórdão da 1ª Vara Mista de Loures foram os ora reclamantes, A. e B., condenados, como co-autores materiais de um crime de tráfico de estupefacientes agravado, nas penas de oito e sete anos de prisão, respectivamente. Inconformados, interpuseram recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa que confirmou a decisão relativamente ao arguido B. e, no que se refere ao arguido A. revogou a mesma, mas apenas na parte em que esta havia declarado perdidos a favor do Estado certa quantia e um determinado veículo.

  2. Sempre inconformados, os arguidos recorreram para o Supremo Tribunal de Justiça. Na sua resposta o Ministério Público veio, em síntese, suscitar as seguintes questões prévias: (i) impossibilidade de conhecer do recurso interposto pelo arguido B. quanto à matéria de facto, uma vez que o recurso para o STJ de Acórdão proferido, em recurso, pela Relação apenas pode visar o reexame da matéria de direito; (ii) impossibilidade de conhecer do recurso interposto pelo arguido A. na parte em que sindica a decisão da Relação sobre questão suscitada em recurso interlocutório, ainda que o mesmo tenha subido com o que foi interposto da decisão final e tenha sido apreciado e decidido na mesma peça processual em que foi o principal.

  3. Notificados para responder à questão prévia suscitada pelo Ministério Público, veio o arguido A. alegar, em síntese e para o que especificamente importa ao presente recurso de constitucionalidade, que “Interpretar o artigo 400º, nº 1, al. c) do CPP, na redacção anterior à Lei 48/2007, de 29.08, no sentido de esta alínea incluir as decisões proferidas pelas relações, em sede de recurso, que «per se» não ponham termo à causa, mas que decidam sobre questões de natureza processual e que constituem parte integrante de uma decisão que põe termo à causa e que é recorrível para o Supremo Tribunal de Justiça, consubstancia interpretação normativa claramente inconstitucional por violação do disposto nos arts. 32º, nº 1, e 18º, nº 1, da CRP”.

  4. O Supremo Tribunal de Justiça, por Acórdão de 12 de Novembro de 2008, decidiu rejeitar os recursos dos arguidos no segmento em que foi impugnada a matéria de facto e arguidas invalidades já conhecidas pelo Tribunal da Relação e negar provimento aos mesmos, na parte em que vêm impugnadas as penas aplicadas.

  5. Novamente inconformados, os recorrentes vieram arguir a nulidade do Acórdão. Por Acórdão de 19 de Janeiro de 2009, foram indeferidas as arguições de nulidade.

  6. Notificados deste Acórdão, vieram os recorrentes interpor recursos, ao abrigo da alínea b) do nº 1 do artigo 70º da LTC, através de requerimentos que, no essencial, têm o seguinte teor:

    6.1. O recurso apresentando pelo arguido A.:

    “[...], tendo sido notificado do acórdão proferido por esse venerando Tribunal, vem do mesmo interpor RECURSO PARA O TRIBUNAL CONSTITUCIONAL, nos termos dos artigos 70º, nºs 1, al. b) e 2, 72º nºs 1, al. b) e 2, 75º, nº 1 e 75º-A, nºs 1 e 2, todos da Lei do Tribunal Constitucional, o que faz nos termos e com os seguintes fundamentos: [...]

  7. Entendia e entende o requerente que não foram observados todos os requisitos legais para a legitimação da intervenção do “agente infiltrado”, cuja actuação violou as mais elementares garantias de defesa dos arguidos conforme se demonstra no excerto do recurso interposto infra parcialmente transcrito: [...]

  8. Pronunciando-se sobre o objecto do recurso interposto pelo ora requerente, entendeu o Tribunal da Relação de Lisboa que «no caso, embora falte o relatório previsto no n.º 4 do artigo 59º do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, o terceiro que interveio na acção compareceu em audiência de julgamento e foi interrogado pelos arguidos sem quaisquer limitações», considerando que tal presença em julgamento supriria a necessidade de cumprir as exigências previstas no aludido preceito legal.

  9. Ora, o estatuído no referido n.º 4 do artigo 59º-A do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, na redacção introduzida pelo Decreto-Lei n.º 81/95, de 22 de Abril, nos termos do qual «a Polícia Judiciária fará o relato da intervenção do funcionário ou do terceiro à autoridade judiciária competente no prazo máximo de quarenta e oito horas após o termo daquela», foi interpretado pelo Tribunal da Relação de Lisboa no sentido de que a inexistência do referido relato poderá ser suprida e, por isso, relevada, se o “agente infiltrado” comparecer em audiência de discussão e julgamento, sendo inquirido na qualidade de testemunha.

  10. A referida interpretação constitui violação expressa do estatuído nos artigos 1º, 18º nºs 1 e 2 e 32º nºs 1 e 8 da Constituição da República Portuguesa, pondo em causa o princípio da dignidade da pessoa humana e o direito de defesa do arguido, «traduzidos na omissão de elaboração do relatório de intervenção do infiltrado ao magistrado do Ministério Público que autorizou a operação».

  11. A referida omissão colocou o ora requerente na «impossibilidade de aferir da validade da acção», restringindo inconstitucionalmente direitos inerentes à pessoa humana, de forma desequilibrada e desadequada, no confronto entre a prevenção e a repressão criminais e os direitos fundamentais que com ela se verão constrangidos, ou seja, entre os direitos das pessoas enquanto fontes ou detentoras da prova e as exigências públicas do inquérito e da investigação.

  12. [sic] Do acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa interpôs o ora requerente recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, no qual foi suscitada a violação pelo tribunal recorrido do princípio constitucional da equidade, previsto no artigo 20º, nº 4 da Constituição da República Portuguesa, e das garantias de defesa previstas nos nº s 1 e 8 do artigo 32º do Diploma Fundamental, conforme demonstram os excertos infra transcritos das conclusões do aludido recurso: [...]

  13. Sobre o referido recurso decidiu o Supremo Tribunal de Justiça rejeitar todas as questões submetidas à sua apreciação pelo ora requerente, com excepção da invocada aplicação do instituto da atenuação especial, invocando o disposto na al. c) do n.º 1 do artigo 400º do Código de Processo Penal e desta decisão arguiu o ora requerente a respectiva nulidade por omissão de pronúncia, porquanto o acórdão recorrido se limitou «a apreciar a questão da medida da pena não tendo sequer apreciado as «invocadas nulidades que consubstanciam proibições de prova».

  14. Sucede que, nos termos do artigo 126º, nº 1, 119º corpo, ambos da C.R.P. e 32º, nº 8 da C.R.P., «as proibições de prova podem ser arguidas a todo o tempo, até ao trânsito em julgado da decisão [...]. «Logo, sendo o recurso interposto pelo ora recorrente para o STJ admissível, em função da pena abstractamente aplicável (...) tinha esse Venerando Supremo Tribunal de Justiça [...) estrita obrigação, também, de conhecer das proibições de prova tempestiva e expressamente arguidas nas motivações daquele recurso e expressamente mencionadas nas conclusões do mesmo».

  15. Não o tendo feito, restringiu o Supremo Tribunal de Justiça os seus poderes de cognição, sendo a interpretação normativa que o mesmo preconiza inadmissível, face aos motivos supra expostos, «por comprimir o direito de defesa do arguido e o seu direito constitucional ao recurso de forma manifestamente excessiva, desnecessária e desproporcionada, violadora, pois, dos artigos 32º, nº 1 e 18º, nº 2, da CRP». «Interpretar o artigo 400º, nº 1, al. c), do CPP, na redacção anterior à Lei nº 48/2007, de 29.08, no sentido de esta alínea incluir as decisões proferidas pela Relações que decidem sobre questões relativas a proibições de prova, quando o acórdão é, em si, recorrível, consubstancia violação flagrante do disposto nos arts. 32º, nº 1 e 18º nº 1 da CRP».

    Deve, pois, ser interpretado o art. 400º, nº 1, al. c), do CPP, na redacção anterior à lei 48/2007, de 29.08, em conformidade com o defendido, i.e., admitindo-se o recurso de decisões da Relação sobre proibições de prova que se encontram integradas numa decisão final que põe termo à causa e da qual foi interposto recurso, quer por ser esta a interpretação imposta pela ratio da norma, quer porque a interpretação contrária, preconizada no parecer a que ora se responde, padece de inconstitucionalidade por violação dos artigos 32º, n. 1 e 18º nº 2 da CRP

    .

    Termos em que, por terem sido aplicadas normas (artigo 59º do Decreto-Lei nº 15/93, de 22 de Janeiro, na redacção introduzida pela Lei nº 45/96, de 3 de Setembro; artigo 59.9-A do Decreto-Lei nº 15/93, de 22 de Janeiro, na redacção introduzida pelo Decreto-Lei nº 81/95, de 22 de Abril; artigo 6., nº 1 da Convenção Europeia dos Direitos do Homem e artigos 125º, 126º, nºs 1 e 2, 340º, nº 4, al. a) e 400º, nº 1, al. c) - redacção anterior à Lei nº 48/2007, de 29.08 -, todos do Código de Processo Penal) cuja interpretação normativa é patentemente inconstitucional, por violação dos artigos 1º, 18º, nºs 1 e 2, 32º, nºs 1 e 8 e 20º, nº 4, todos da Constituição da República Portuguesa, inconstitucionalidade essa que foi suscitada nos recursos pelo requerente interpostos para o Tribunal da Relação de Lisboa e para o Supremo Tribunal de Justiça, neste último caso em sede de recurso e de arguição de nulidade, sendo este parte legítima e o recurso ora interposto legal e tempestivo, se requer a sua admissão, seguindo-se os demais termos até final”.

    Já neste Tribunal o recorrente juntou aos autos um parecer.

    6.2. O recurso apresentando pelo arguido B.:

    “[...], tendo sido notificado do acórdão proferido por esse Supremo Tribunal, o qual indeferiu as arguições de nulidade apresentadas pelo arguido, vem interpor recurso para o Tribunal Constitucional, nos termos do disposto nos artigos 70º n. 1/b) e 2, 71 nº 1, 72, nº 1/b, 75º nº 1 e 75º-A nºs 1 e 2 da Lei do Tribunal Constitucional o que se faz nos termos e com os fundamentos seguintes: [...]

  16. O arguido...

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