Acórdão nº 92/06 de Tribunal Constitucional (Port, 07 de Fevereiro de 2006

Magistrado ResponsávelCons. Mota Pinto
Data da Resolução07 de Fevereiro de 2006
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 92/2006

Processo n.º 599/05

  1. Secção

Relator: Conselheiro Paulo Mota Pinto

Acordam, em conferência, na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional:

  1. Relatório

    AUTONUM 1.A. vem reclamar para a conferência, ao abrigo do disposto no n.º 3 do artigo 78.º-A da Lei de Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional (Lei do Tribunal Constitucional), da decisão sumária de 24 de Outubro de 2005, que decidiu julgar não inconstitucionais as normas dos artigos 3.º, al. f), 20.º, n.º 1, e 24.º, n.º 1, do Regime Jurídico da Cessação do Contrato Individual de Trabalho e da Celebração e Caducidade do Contrato de Trabalho a Termo, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 64-A/89, numa sua interpretação meramente enunciativa, e condená-la em custas, com sete unidades de conta de taxa de justiça. Tal decisão teve o seguinte teor:

    1. Por acórdão de 14 de Abril de 2005, o Tribunal da Relação de Lisboa decidiu negar provimento ao recurso interposto por A. do saneador-sentença do Tribunal do Trabalho do Funchal, datado de 15 de Julho de 2004, que julgou totalmente improcedente a acção de [impugnação de] despedimento colectivo intentada por ela e outro contra B., L.da. Consequentemente, o Tribunal da Relação de Lisboa confirmou a decisão recorrida. Pode ler-se nesse aresto:

    II – Fundamentação.

    O Tribunal a quo considerou como assentes os seguintes factos:

    1. Os Autores entraram ao serviço da Ré em 1/11/97, sendo-lhes ultimamente atribuída a categoria profissional de “Jornalista – II Grupo” e paga a retribuição-base de € 1.020,34, acrescida de € 23,23 de diuturnidades;

    2. Em 31/3/2003 a Ré despediu os Autores, invocando um processo de despedimento colectivo;

    3. Ao iniciar esse processo, a Ré tinha ao seu serviço sete jornalistas;

    4. Tendo previamente seleccionado os dois Autores, como os únicos que iriam ser abrangidos por esse despedimento;

    5. E, por isso, ao iniciar o processo, a Ré apenas notificou os Autores;

    6. Embora referisse como seu objectivo obter a redução do “pessoal do sector da redacção”, que era composto por sete elementos;

    7. A decisão final refere, além do mais que consta de fls. 11/12, quanto ao Autor e de fls. 13/14, quanto à Autora, que: “o motivo do presente despedimento consiste na redução de pessoal da secção de Redacção, determinada por motivos de carácter económico-financeiro, nos termos que constam da fundamentação entregue no dia 21 de Janeiro de 2003 aos trabalhadores que poderiam vir a ser abrangidos pelo despedimento colectivo, e enviada no dia 28 de Janeiro de 2003 à comissão representativa dos trabalhadores a despedir, cuja cópia se junta e se dá por integralmente reproduzida para todos os efeitos legais.

    A presente decisão de despedir V. Ex.ª resulta ainda do facto de V. Ex.ª ter ficado incluído nos dois trabalhadores da secção de Redacção desta empresa a abranger pelo despedimento colectivo, por aplicação dos critérios de selecção dos trabalhadores a despedir naquela secção de Redacção, conforme cópia que se junta e aqui se dá por integralmente reproduzida”.

    8. Da aludida cópia consta que os trabalhadores a despedir “serão seleccionados mediante a aplicação dos seguintes critérios, pela ordem estabelecida:

    1.º Inexistência de filhos menores;

    2.º Menor número de filhos menores;

    3.º Menor antiguidade na empresa em caso de igual número de filhos menores.”;

    9. As declarações para os fins do art.º 92.º do Código do IRS datadas pelos Autores em 24/11/1997, não referem o nome de qualquer familiar dependente;

    10. Cada uma das declarações para os fins do art.º 92.° do Código do IRS relativas aos restantes jornalistas da Redacção da Ré refere a existência de dependentes menores;

    11. Não existia na Ré comissão de trabalhadores, comissão intersindical ou sindical;

    12. Os Autores constituíram-se em comissão representativa deles próprios;

    13. A Ré entregou aos Autores no dia 21 de Janeiro de 2003 e enviou a essa comissão, por carta de 28/1/2003, a comunicação da intenção de proceder ao despedimento;

    14. E comunicou a decisão de despedimento aos Autores por cartas de 25 de Março de 2003.

    *

    Posto isto, e considerando que são as conclusões formuladas nas alegações de recurso que delimitam o respectivo objecto (cfr. art.ºs 684.º, n.º 3, e 690.º, n.º 1, do C.P.C., aqui aplicável por força do art.º 87.º, n.º 1, do C.P.T.), à excepção de outras cujo conhecimento oficioso a lei permita ou imponha (art.º 660.º, n.º 2, do C.P.C.), verificamos que, entre outras, se coloca à nossa apreciação saber:

    1. Se no âmbito do processo de despedimento colectivo que desenvolveu, a ré poderia adoptar como critério de despedimento a existência ou a inexistência de filhos por parte dos trabalhadores a ele sujeitos e se este critério viola ou não os princípios de respeito pela pessoa humana, entre eles o respeito pela intimidade ou reserva da vida privada e o respeito pela intimidade da vida familiar, e, por outro lado;

    2. Se a ré desenvolveu ou não diligências tendentes à verificação de um tal critério.

    Acontece, porém, que, constituindo esta uma acção de impugnação de despedimento colectivo (atendendo ao número de trabalhadores ao serviço da Ré/Apelada e ao número dos trabalhadores despedidos e ainda às razões comuns inerentes à organização produtiva daquela, justificativas dos despedimentos efectuados), muito embora a lei imponha à entidade empregadora que, no âmbito do processo tendo em vista a concretização daquele despedimento e mais propriamente nas comunicações a que alude no art.º 17.º da LCCT introduzida pelo Dec.-Lei n.º 64-A/89, de 27-02, indique quais os critérios que serviram de base à selecção dos trabalhadores a despedir [cfr. a al. c) do n.º 2 do referido normativo], não permite, depois, que tais critérios sirvam de base à impugnação judicial desse despedimento. Com efeito, as únicas situações que, uma vez verificadas, determinam a verificação da ilicitude do despedimento colectivo são apenas as que, taxativamente, surgem enunciadas nas diversas alíneas do n.º 1 do art.º 24.º daquele diploma, nelas não figurando os critérios de selecção dos trabalhadores a despedir adoptados pelo empregador, mas apenas a inobservância de certos formalismos legais atinentes ao próprio processo de despedimento colectivo, bem como os fundamentos invocados para o despedimento, fundamentos estes que se não podem confundir com tais critérios, como parece suceder nas posições sustentadas pela Apelante ao longo da presente acção.

    Na verdade, como doutamente se decidiu no Acórdão da Relação do Porto de 05/05/1997, “Fundamentos do despedimento e critérios de selecção são coisas diferentes. Só os primeiros podem constituir fundamento de impugnação judicial do despedimento colectivo. Os segundos são insindicáveis, o que se compreende, uma vez que, contrariamente ao que acontecia com o Dec.-Lei n.º 372-A/75, de 16 de Julho, na redacção dada pelo Dec.-Lei n.º 84/76, de 28/1, a actual lei não estabelece critérios de preferência na manutenção dos postos de trabalho (Manuel Cavaleiro Brandão, RDES, ano XXXIV, n.ºs 1-2-3, pág.160), deixando essa selecção (como claramente é referido no preâmbulo do Dec.-Lei n.º 64-A/89) aos critérios de gestão definidos pela entidade empregadora, sem prejuízo, embora, do que se dispuser em instrumentos de regulamentação colectiva”.

    Não faz, pois, qualquer sentido, por extravasar, por completo, os fundamentos de ilicitude e, portanto, de impugnação judicial do despedimento colectivo estabelecidos na lei, pretender questionar e pretender que os Tribunais, designadamente esta Instância de recurso, apreciem a validade e a constitucionalidade dos critérios de selecção adoptados pela Ré, ora Apelada, no âmbito do processo de despedimento colectivo que resolveu levar a cabo e que conduziu ao despedimento da aqui Apelante, razão pela qual se não procede à análise das referidas questões de recurso.

    Ainda assim, não deixaremos de referir que, de modo algum os critérios de selecção adoptados pela Apelada poderão integrar situações de violação da intimidade da vida privada ou da vida familiar da Apelante, sendo meros critérios objectivos de selecção como quaisquer outros que poderiam ter sido adoptados que revelam uma preocupação de discriminação positiva, de cariz social, na medida que em benefício dos trabalhadores com filhos menores, ou com maior número de filhos menores, ou ainda dos trabalhadores com maior antiguidade no seio da empresa Apelada. Não mais do que isso.

    Posto isto, caberá apreciar no âmbito do presente recurso outras questões nele colocadas, tais como:

    3. Se aquando das comunicações a que se alude no art.º 17.º da mencionada LCCT pode ou não existir a identificação dos...

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