Acórdão nº 348/06 de Tribunal Constitucional (Port, 31 de Maio de 2006

Data31 Maio 2006
Órgãohttp://vlex.com/desc1/2000_01,Tribunal Constitucional (Port

Processo nº 10/CPP

Plenário

ACTA

Aos trinta e um dias do mês de Maio do ano de 2006, achando-se presentes o Excelentíssimo Conselheiro Vice-Presidente Rui Manuel Gens de Moura Ramos e os Ex.mos Conselheiros Gil Manuel Gonçalves Gomes Galvão, Maria João da Silva Baila Madeira Antunes, Vítor Manuel Gonçalves Gomes, Mário José de Araújo Torres, Carlos José Belo Pamplona de Oliveira, Maria Helena Barros de Brito, Maria Fernanda dos Santos Martins Palma Pereira, Maria dos Prazeres Couceiro Pizarro Beleza, Paulo Cardoso Correia da Mota Pinto, José Manuel de Sepúlveda Bravo Serra e Benjamim Silva Rodrigues, foram trazidos à conferência os presentes autos, para neles ser apreciado o que o Ministério Público nos mesmos promove, em matéria de responsabilidade contra-ordenacional dos dirigentes partidários pelas ilegalidades das contas dos partidos políticos, relativas ao ano de 2002.

Após debate e votação, foi ditado o seguinte:

ACÓRDÃO N.º 348/2006[1]

I – RELATÓRIO

1. O Acórdão n.º 288/2005 deste Tribunal aplicou aos partidos políticos coimas pelas infracções cometidas por estes em matéria de financiamento e organização contabilística, no ano de 2002, e determinou a continuação dos autos com vista ao Ministério Público, de forma a promover o que tivesse por conveniente relativamente à responsabilidade pessoal dos dirigentes dos partidos políticos pelas ditas infracções, em conformidade com o preceituado nos artigos 14.º, n.º3, e 14.º-A, n.º 1, da Lei n.º 56/98, de 18 de Agosto (com as alterações resultantes da Lei n.º 23/2000, de 23 de Agosto), e no artigo 103.º-A da Lei do Tribunal Constitucional.

2. Na sequência dessa decisão, veio o Ministério Público, em 7 de Julho de 2005, promover, em suma, o seguinte:

  1. As contas dos partidos do ano de 2001 foram as primeiras a que foi aplicado o regime legal decorrente das alterações introduzidas na Lei n.º 56/98 pela Lei n.º 23/2000, no que respeita à previsão da responsabilidade pessoal dos dirigentes dos partidos políticos que participem no não cumprimento das obrigações legalmente impostas àquelas entidades colectivas, em sede de organização das respectivas contas, colocando-se, no essencial, problemas semelhantes quanto ao ano de 2002.

  2. A circunstância de os resultados da auditoria e diligências complementares promovidas não serem inteiramente concludentes quanto à cabal imputação de todas as infracções e irregularidades financeiras cometidas – bem como a eventual insuficiência dos estatutos e regulamentos financeiros então em vigor nos partidos, quanto à precisa e categórica delimitação dos vários níveis de responsabilidade pelas infracções cometidas – não pode conduzir a uma sistemática e inaceitável “diluição” das possíveis e plausíveis responsabilidades dos dirigentes partidários nas infracções que motivaram a condenação dos partidos, já que tal implicaria a evidente frustração dos objectivos prosseguidos pela Lei n.º 23/2000.

  3. Os elementos coligidos nos autos não permitem responsabilizar, a título de dolo, dirigentes partidários determinados, quanto às infracções ao dever genérico de os partidos possuírem contabilidade organizada (violado pelo facto de ocorrer falta de suficiente ou adequado suporte ou informação documental, justificativa de receitas, despesas e mapas contabilísticos) e quanto às infracções aos deveres específicos consistentes: (I) na não adopção do procedimento de depósito integral dos donativos de natureza pecuniária em contas exclusivamente destinadas a esse efeito; (II) na não adopção da prática do pagamento de despesas superiores a dois salários mínimos nacionais por cheque ou outro meio de pagamento que permita a identificação do montante e da entidade destinatária e a não realização das necessárias reconciliações bancárias; (III), na não realização das necessárias reconciliações bancárias; bem como (IV) na não apresentação da lista de receitas decorrentes das actividades de angariação de fundos.

  4. O mesmo não ocorre, porém, com outras infracções que, por estarem inquestionavelmente ligadas a aspectos estruturais e essenciais da organização financeira e contabilística dos partidos, não poderiam, ao menos numa análise liminar e indiciária, deixar de ter escapado ao controlo dos titulares dos órgãos a quem estava cometido, segundo os estatutos e regulamentos financeiros em vigor, o domínio da gestão financeira dos partidos, nomeadamente:

    I) a falta de apresentação de contas (verificada quanto ao PSN e ao PDA);

    II) a ausência de contas abrangendo todo o universo partidário (verificada quanto ao PPD/PSD, ao PS e ao CDS-PP);

    III) e as deficiências ou insuficiências na organização e actualização do inventário do património do partido (verificadas quanto ao CDS-PP).

  5. Relativamente à imputação ao PSN da não apresentação de contas, trata-se de uma infracção que, pela sua essencialidade, relevância e reiteração (já que ocorreu também nos anos de 2000 e 2001), não poderá deixar de imputar-se – pelo menos– ao presidente do próprio partido, enquanto preside à Direcção Nacional, órgão a que está cometida a elaboração do orçamento e contas do partido [artigos 33.º, n.º 1, alínea a), e 34.º, n.º 7, dos Estatutos]. No ano de 2002, a função de Presidente era exercida, conforme os registos existentes neste Tribunal Constitucional, por António Barbosa da Costa. Este, presidindo à Direcção Nacional, não elaborou nem apresentou, nesse ano, a respectiva conta, apesar de bem saber, face ao teor da lei e aos precedentes jurisprudenciais, resultantes de acórdãos já anteriormente proferidos pelo Tribunal Constitucional, que estava obrigado a apresentá-las, nos termos legais. Participou, pois, com dolo, no cometimento da infracção prevista no artigo 14.º, n.º 2, da Lei n.º 56/98 (na redacção resultante da Lei n.º 23/2000), decorrente da omissão de cumprimento, quanto ao ano de 2002, da obrigação consignada no artigo 13.º, n.º 1, da mesma lei, indiciando-se que seja pessoalmente responsável – na qualidade de Presidente do Partido e da respectiva Direcção Nacional – por tal infracção, pelo que se promove a aplicação da coima prevista no artigo 14.º, n.º 3, da referida lei.

  6. O mesmo ocorre com a falta de apresentação de contas, em 2002, pelo PDA, afigurando-se que tal infracção será de imputar ao Presidente da Comissão Política Nacional, tendo em conta que a Comissão Política Nacional é o mais elevado órgão “directivo e executivo do Partido” (artigo 43.º dos Estatutos), cabendo ao respectivo Presidente, como “chefe supremo do executivo do Partido”, a principal responsabilidade pela orientação, disciplina e acção partidária, competindo-lhe, nomeadamente, “cumprir e fazer cumprir as normas legais e estatutárias”, bem como “a representação suprema do Partido” (artigo 50.º) – e cabendo a tal órgão a “administração dos fundos” partidários (artigo 70.º). No ano de 2002, a função de Presidente da Comissão Política Nacional era exercida por José Francisco Nunes Ventura, que deixou, nesse ano, de elaborar e apresentar as contas do PDA, apesar de bem saber, face ao teor da lei, às disposições legais e aos precedentes jurisprudenciais, que estava obrigado a apresentá-las. Participou, pois, com dolo, no cometimento da infracção prevista no artigo 14.º, n.º 2, da Lei n.º 56/98 (na redacção resultante da Lei n.º 23/2000), decorrente da omissão de cumprimento, quanto ao ano de 2002, da obrigação consignada no artigo 13.º, n.º 1, da mesma lei, indiciando-se que seja pessoalmente responsável – na qualidade de Presidente da Comissão Política Nacional – por tal infracção, pelo que se promove a aplicação da coima prevista no artigo 14.º, n.º 3, da referida lei.

  7. Quanto ao CDS-PP, os responsáveis das suas estruturas, organizações e organismos estão obrigados a prestar informação regular das suas contas aos responsáveis nacionais, bem como a acatar as respectivas instruções e inspecções, sob pena de responsabilização individual e pessoal pelas infracções ao regulamento financeiro, cumprindo a cada nível organizatório um processo faseado de prestação das contas resultantes da sua actividade financeira ao nível subsequente, de modo a permitir a apresentação de “contas consolidadas” (artigos 10.º, 15.º e 21.º, n.º 1, do Regulamento Financeiro), sendo ainda as Comissões Políticas Distritais e regionais responsáveis pela actualização do inventário das estruturas concelhias, cabendo-lhes remeter o respectivo inventário actualizado ao Secretário-Geral (artigo 14.º, n.ºs 1 a 3, do dito Regulamento) – e resultando, aliás, idêntico dever expressamente do preceituado no artigo 11.º, n.º 2, da Lei n.º 56/98. Exerciam, em 2002, as funções de presidentes das Comissões Políticas Distritais de Bragança, Castelo Branco e Leiria, respectivamente, António Mário Pegado Lemos Mendonça, João Manuel Próspero dos Santos e Isabel Maria Gonçalves dos Santos. O incumprimento por tais responsáveis dos deveres estatutários que os oneravam, no que respeita às obrigações de execução financeira a que estavam vinculadas segundo o Regulamento Financeiro do Partido, por parte do órgão a que presidiam, impossibilitou os órgãos nacionais de apresentarem uma conta consolidada, bem como o inventário devidamente organizado e actualizado. Estes titulares dos órgãos descentralizados do CDS-PP bem sabiam, face ao teor dos preceitos legais e das disposições estatutárias, que estavam vinculados ao cumprimento tempestivo e adequado das obrigações de execução financeira por parte das estruturas a que presidiam, pelo que, não o tendo feito, participaram, com dolo, no cometimento das infracções previstas nos artigos 10.º, n.º 3, alínea a), e n.º 4, conjugados com os n.ºs 4 e 5 do mesmo preceito legal, promovendo-se a aplicação da coima prevista no artigo 14.º, n.º 3, da citada lei.

  8. Quanto ao PPD/PSD, compete ao Secretário-Geral elaborar e submeter à Comissão Política Nacional o orçamento e as contas do Partido, podendo ser coadjuvado por Secretários-Gerais Adjuntos [artigo 25.º, n.º 1, alíneas c) e e), dos Estatutos]...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT