Acórdão nº 276/05 de Tribunal Constitucional (Port, 25 de Maio de 2005

Magistrado ResponsávelCons. Benjamim Rodrigues
Data da Resolução25 de Maio de 2005
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 276/2005

Processo n.º 292/05

  1. Secção

Relator: Conselheiro Benjamim Rodrigues

Acordam, em conferência, no Tribunal Constitucional:

A – Relatório

1 – A. reclama para a conferência, ao abrigo do disposto no n.º 3 do art.º 78º-A da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, na sua actual versão (LTC), da decisão proferida pelo relator, no Tribunal Constitucional, que julgou não tomar conhecimento do recurso de fiscalização de constitucionalidade interposto pelo reclamante do acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa.

2 – A decisão reclamada tem o seguinte teor:

«1 – B. e A., identificados nos autos, interpuseram recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa da decisão proferida na 8.ª Vara Criminal de Lisboa que os condenou na pena de três anos e seis meses de prisão, pela prática de um crime de furto qualificado, previsto e punido pelos artigos 203.º, n.º 1, 204.º, n.º 2, alínea a), e 202.º, alínea b), do Código Penal.

Por Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa – de fls. 547 e seguintes –, foi decidido rejeitar, por manifesta improcedência, o recurso do arguido B. e negar provimento ao recurso interposto pelo arguido A..

2 – Inconformado, o arguido B. interpôs recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, o qual, por despacho do Desembargador Relator, foi considerado inadmissível, e, consequentemente, não foi recebido.

Notificado de tal decisão, veio o arguido “interpor recurso para o Tribunal Constitucional do despacho que decidiu não conhecer do recurso interposto para o STJ, onde se arguiu a inconstitucionalidade da aplicação do disposto no artigo 412.º, n.º 3, do CPP, da forma que foi interpretado pelo Tribunal da Relação de Lisboa, por violação do disposto no art. 32.º da Constituição da República Portuguesa”.

3 – Por sua vez, o arguido A., uma vez notificado do Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, requereu – fls. 588 e seguintes – a aclaração desse juízo decisório, tendo o Tribunal, por Acórdão de 15 de Fevereiro de 2005, indeferido “o pedido de aclaração (...) por não enfermar de qualquer contradição, erro, lapso, obscuridade ou ambiguidade”.

Dizendo-se inconformado, o arguido interpôs, ao abrigo do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 70º da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, na sua actual versão (LTC), recurso para o Tribunal Constitucional, pretendendo ver apreciada a «(in)constitucionalidade de: a) A norma do art. 123.º do CPP, na interpretação acolhida no douto acórdão recorrido de que a deficiente gravação de produção de prova produzida em audiência de julgamento de um co-arguido não põe em causa as garantias de defesa do arguido consagradas no artigo 32.º da Lei Fundamental, uma vez que “... o recorrente A. não se serviu como meio de prova do depoimento...”; b) A norma do n.º 1 do artigo 123.º do CPP, quando interpretada no sentido de que deve ser arguida no próprio acto a violação do artigo 138.º do CPP, por violação do n.º 2 do art. 32.º da Lei Fundamental; c) Violação do Princípio “In dubio pro reo”, ínsito no art. 32.º da Lei Fundamental ao valorar e contra o recorrente os artigos n.ºs 128.º, 129.º do CPP e Falsidade de testemunho (n.º 1 do art. 360.º do CP); d) Violação do Princípio de Presunção de Inocência, ínsito no n.º 2 do art. 23.º da Lei Fundamental, no douto acórdão ora recorrido, ao valorar, em detrimento, o falso testemunho; e) A norma do art. 203.º do CP, por violadora do art. 32.º da Lei Fundamental quando haja insuficiência de factos que conduzam, inabalavelmente, à consumação ou tentativa do ilícito», sendo que, na perspectiva do recorrente, «tais normas violam os artigos 32.º da CRP e os Princípios de Verdade Material, Presunção de Inocência e “In dubio pro reo” da Constituição da República Portuguesa» e “a questão de inconstitucionalidade foi, suscitada quando do recurso de primeira instância, foi praticada no douto acórdão proferido em 2.ª instância e foram suscitadas na aclaração por via do referido acórdão”.

4 – Ambos os recursos interpostos para o Tribunal Constitucional foram admitidos pelo tribunal a quo. Como, porém, o despacho que os admitiu não vincula o Tribunal Constitucional (art. 76.º, n.º 3, da LTC) e por, em qualquer dos casos, se configurar uma factispécie processual que se enquadra no âmbito normativo do artigo 78.º-A, n.º 1, da LTC, passa a decidir-se imediatamente.

5 – Recurso do arguido B.:

5.1 – São requisitos específicos para o conhecimento de um recurso de constitucionalidade interposto ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do art. 70.º da LTC: que a decisão judicial tenha aplicado a norma reputada de inconstitucional; que o juízo sobre a constitucionalidade da norma tenha sido uma verdadeira ratio decidendi e não um mero obiter dictum da decisão recorrida; que a questão de inconstitucionalidade haja sido suscitada “durante o processo”, entendida esta expressão em sentido funcional – em termos de tal invocação dever ser feita num momento em que o tribunal a quo ainda possa conhecer da questão, “antes [portanto] de esgotado o poder jurisdicional do juiz sobre a matéria a que respeita”, e, finalmente, que se encontrem esgotados todos os recursos ordinários.

Ora, in casu, é manifesto que este último requisito não se encontra verificado.

Na verdade, como resulta dos autos, o recorrente não reclamou para o Presidente do Supremo Tribunal de Justiça do despacho (proferido pelo Juiz Relator do Tribunal da Relação de Lisboa) que não admitiu o recurso interposto para aquele tribunal superior, como poderia ter feito nos termos do disposto no art.º 405º do Código de Processo Penal (CPP), tendo, ao invés, o arguido recorrido de imediato para o Tribunal Constitucional do despacho de não admissão do recurso para o Supremo Tribunal de Justiça.

5.2 – Ora, constitui jurisprudência reiterada deste Tribunal, desde o Acórdão nº 65/85 (D.R., II Série, de 31 de Maio de 1985), que a reclamação de despacho de não admissão de recurso desempenha função idêntica à de um recurso e deve ser qualificada como recurso ordinário para os efeitos do disposto no artigo 70º, n.º 2, da Lei do Tribunal Constitucional (cf., nomeadamente, os Acórdãos n.ºs 473/93, 83/94 e 323/94, D.R., II Série, de 19 de Janeiro, de 31 de Março e de 7 de Junho de 1994, respectivamente).

Com efeito, seguindo de perto tal jurisprudência, pode considerar-se que o princípio da exaustão dos recursos ordinários visa habilitar o tribunal que decide a causa a considerar, pelo menos na fase de recurso, a questão de inconstitucionalidade, dado o sistema de controlo difuso da constitucionalidade consagrado no artigo 207º da Constituição, pelo que, nessa medida, o Tribunal Constitucional apenas deve intervir, no âmbito da fiscalização concreta da constitucionalidade, quando já foi proferida a última decisão pela ordem judiciária a que pertence o tribunal que aplicou a norma cuja inconstitucionalidade foi suscitada.

Assim sendo, é certo que o despacho de não admissão do recurso proferido pelo juiz a quo não é uma decisão definitiva, na medida em que é ainda possível a reclamação para o presidente do tribunal ad quem e, em rigor, apenas a decisão deste resolve definitivamente a questão, daí decorrendo que deve considerar-se a reclamação um "recurso ordinário", em sentido material e funcional.

Tal jurisprudência mostra-se, hoje, de...

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