Acórdão nº 335/04 de Tribunal Constitucional (Port, 13 de Maio de 2004
Magistrado Responsável | Cons. Gil Galvão |
Data da Resolução | 13 de Maio de 2004 |
Emissor | Tribunal Constitucional (Port |
ACÓRDÃO N.º 335/04 Proc. n.º 240/04 3ª Secção Relator: Conselheiro Gil Galvão
Acordam, em Conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional:
I – Relatório
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A., ora reclamante, impugnou judicialmente, junto do Tribunal Tributário de 1ª instância de Braga, a liquidação de IRC relativa aos anos de 1997, 1998 e 1999. Subsidiariamente, pediu ainda o reconhecimento dos direitos decorrentes do pagamento do imposto no seu entender indevidamente liquidado e pago.
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Por decisão daquele Tribunal, de 18 de Março de 2003 (fls. 104 e 105), foi decidido não conhecer do pedido e, consequentemente, absolver a Fazenda Pública da instância, “por ilegalidade do meio de reacção utilizado, por falta de prévia reclamação”.
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Não se conformando com esta decisão a impugnante recorreu dela para o Supremo Tribunal Administrativo, que, por acórdão de 28 de Janeiro de 2004, decidiu negar provimento ao recurso (fls. 141 a 149).
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Desta decisão foi interposto, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do art. 70º da Lei do Tribunal Constitucional, o presente recurso, através de um requerimento que tem o seguinte teor:
“A recorrente considera que os arts. 7° dos decretos-lei n.º 264/92, de 24 de Novembro, e n.º 31/98, de 11 de Fevereiro, padecem de inconstitucionalidade por violação dos princípios da legalidade tributária, consagrado nos arts. 103°, n.º 2, e 165°, n.º 1, al. i), da Constituição, e da tributação pelo lucro real constante do n.º 2 do art. 104° da Constituição, na medida em que os preceitos em causa, sem estarem habilitados por competente autorização legislativa, estabelecem restrições à dedutibilidade fiscal de determinados custos - e bem assim, consequentemente, o direito fundamental consagrado no art. 103°, n.º 3, da Constituição.
A recorrente entende que os actos tributários praticados ao abrigo do preceituado naqueles artigos são nulos, pois violam o conteúdo essencial daquele direito fundamental, pelo que, invocando o disposto no n.º 3 do art. 102° do C.P.P.T. e na al. d) do n.º 2 do art. 133° do C.P.A., deduziu a impugnação judicial que deu origem aos presentes autos. Sucede que a pretensão da recorrente foi julgada improcedente pelo douto Acórdão do STA que afirmou que a «[n]ão sendo caso de actos nulos, é óbvio, face ao probatório, que a impugnação foi deduzida para além do respectivo prazo legal, pelo que é intempestiva», julgando, por isso, extemporânea a petição inicial, abstendo-se do conhecimento do mérito da causa.
A recorrente entende que é inconstitucional, por violação dos arts. 20°, 103° e 104° da Constituição, do art. 133° do C. P. A. e do art.102° do C.P.P.T., o entendimento, vertido no douto Acórdão do STA, de não considerar violado o conteúdo essencial do direito fundamental supra referido e que, em consequência, os actos tributários em apreço seriam meramente anuláveis, pois as inconstitucionalidades detectadas e invocadas ao longo dos autos geram a nulidade daqueles actos.
As questões de inconstitucionalidade acima elencadas decorrem passim das peças apresentadas pela recorrente, tendo sido expressamente invocadas nos artigos 1º, 6° a 8°, 11° a l5° da petição inicial e na parte II, ponto A, e parte m das alegações do recurso interposto da sentença do Tribunal Tributário de 1ª Instância de Braga”.
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Na sequência, foi proferida pelo Relator do processo neste Tribunal, ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 78º-A da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 13-A/98, de 26 de Fevereiro, decisão sumária no sentido do não conhecimento do objecto do recurso. É o seguinte, na parte decisória, o seu teor:
“[...] O recurso previsto na al. b) do n.º 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional pressupõe, designadamente, que o recorrente tenha suscitado, perante o Tribunal que proferiu a decisão recorrida e de forma processualmente adequada, a inconstitucionalidade de determinada norma jurídica - ou de uma sua dimensão normativa -, e que, não obstante, aquela decisão a tenha aplicado, como ratio decidendi, no julgamento do caso.
Importa, pois, começar por averiguar se a recorrente suscitou, perante o Supremo Tribunal Administrativo e de forma processualmente adequada, alguma questão de constitucionalidade normativa, em termos de permitir o recurso de constitucionalidade que pretendeu interpor.
Vejamos.
Se atentarmos no teor da parte II, ponto A e parte III das alegações do recurso interposto da sentença do Tribunal Tributário de 1ª instância de Braga - para que a recorrente remete no requerimento de interposição do recurso para o Tribunal Constitucional -, ou no teor das conclusões daquela peça processual, verificamos que ou pura e simplesmente não foi aí suscitada qualquer questão de constitucionalidade (parte II, ponto A) ou essa inconstitucionalidade foi indevidamente imputada à própria decisão recorrida e não a normas por ela aplicadas (parte III e conclusões).
Para o demonstrar convirá recordar aqui, nessas partes, o conteúdo daquela peça processual. É o seguinte o teor daquela parte II, ponto A:
“II - OBJECTO DA LIDE E DA CAUSA DE PEDIR, NA ORDEM PROCESSUAL
Conforme se referencia já, nas alíneas F e G do Capitulo I destas Alegações, o objecto da lide e da causa de pedir, do presente processo, compreende dois campos da ordem substantiva e igual dualidade de campos da ordem processual: o da nulidade dos actos de auto-liquidação e da correcção dos respectivos efeitos em termos de direito ao reembolso do que por tais actos foi indevidamente pago; e o da susceptibilidade de haver ou exigir eventualmente uma dualidade de meios ou regimes processuais para a reintegração dos direitos afectados:
A-A nulidade dos actos tributários de auto-liquidação
A instituição jurídica da auto-liquidação, como é do domínio comum, é um efeito da evolução da ordem tributária no sentido do relevo nela dado à pessoa do contribuinte, a quem se atribui a prioridade de funções e competência para a definição das situações individuais e concretas de obrigação fiscal e se relegou a função da Administração Fiscal para o campo predominante do controlo e da eventual reparação das situações de incumprimento do contribuinte faltoso.
Se, no regime anterior à actual ordem fiscal o acto tributário era uma instituição de natureza exclusivamente administrativa, diverso e obviamente mais amplo é hoje tal conceito e regime, pois que, designadamente no IRC, é do acto de auto-liquidação, quando efectivamente realizado, que emerge o efeito definitivo e executório da situação de obrigação fiscal, sem qualquer intervenção da Administração Fiscal que não seja a de exercício da função de controlo.
A auto-liquidação vale por si mesma. E a recepção da correspondente declaração pela Administração Fiscal nada lhe acrescenta nem tira quanto ao valor jurídico do acto vinculativo da situação de obrigação fiscal decorrente da auto-liquidação. Tem, pois a auto-liquidação por si mesma a qualidade e o...
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