Acórdão nº 93/01 de Tribunal Constitucional (Port, 13 de Março de 2001

Magistrado ResponsávelCons. Tavares da Costa
Data da Resolução13 de Março de 2001
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 93/01

Processo nº 318/00

  1. Secção

Rel. Cons. Tavares da Costa

Acordam na 3ª Secção do Tribunal Constitucional

I

1. - C, identificado nos autos, foi condenado no Tribunal Judicial da comarca de Oeiras, em processo comum singular, por sentença de 13 de Maio de 1999, pela autoria material de:

a) um crime previsto e punido nas disposições combinadas dos artigos 115º, 1º, 3º e 4º do Decreto-Lei nº 422/89, de 2 de Dezembro – diploma conhecido por Lei do Jogo –, na pena de sete meses de prisão e na de noventa dias de multa, à taxa diária de 800$00, no total de 72.000$00, ou em sessenta dias de prisão subsidiária; b) um crime previsto e punido nas disposições combinadas dos artigos 108º, 1º, 3º e 4º do mesmo diploma legal, na pena de sete meses de prisão e na de noventa dias de multa, à taxa diária de 800$00, no total de 72.000$00, ou em sessenta dias de prisão subsidiária.

Operado o cúmulo jurídico, foi o mesmo condenado na pena única de doze meses de prisão, suspensa a pena pelo período de dois anos, ao abrigo do disposto no artigo 48º, nº 1, do Código Penal, e na pena de cento e oitenta dias de multa, à taxa diária de 800$00, o que perfaz a quantia de 188.000$00.

Interpôs o arguido recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa, tendo suscitado, na respectiva motivação, questões de constitucionalidade.

Assim, a decisão, ao considerar que a conduta atribuída ao arguido é subsumível aos dois tipos de crime previstos naqueles artigos 115º e 108º - importação ilícita de material de jogo e exploração ilícita de jogo de fortuna ou azar, respectivamente –, não ponderando que está em causa uma única resolução, hipoteticamente contrária à lei geral, violou não só o disposto no artigo 30º do Código Penal e naqueles dois preceitos da Lei do Jogo, mas, também, o artigo 29º da Constituição da República (CR).

De igual modo, a sentença recorrida terá violado o disposto nos artigos 497º e 498º do Código de Processo Penal –, bem como a garantia consagrada no nº 5 daquele artigo 29º: o princípio ne bis in idem impede que o recorrente seja julgado pelo mesmo crime ou tipo de crime, de novo, uma vez que transitaram em julgado os factos que integram a sua conduta, quer quando foi absolvido, quer quando foi condenado (isto porque já foi submetido a julgamento em diversos tribunais, consoante os locais de apreensão das máquinas).

Por sua vez, e em sede de controlo normativo de constitucionalidade, para o recorrente as normas dos artigos 1º, 3º, 4º, nº 1, alínea g), 108º e 115º da Lei do Jogo são materialmente inconstitucionais, face ao que dispõe o artigo 8º da CR, dado que "o Estado Português, fazendo parte da União Europeia e tendo subscrito os seus Tratados, não pode contrariar através da legislação ordinária o artigo 30º do Tratado Institutivo da União Europeia, que preceitua serem proibidas, entre os Estados-Membros, as restrições quantitativas à importação, bem como todas as medidas de efeitos equivalentes".

Finalmente, "a norma incriminadora do artigo 108º não especifica suficientemente os factos que constituem o tipo legal de crime", o que viola, "entre outros", o princípio da tipicidade que o artigo 29º da CR consagra.

O Tribunal da Relação de Lisboa negou provimento ao recurso, por acórdão de 14 de Março de 2000.

2. - Inconformado, interpôs o recurso para o Tribunal Constitucional do assim decidido, nos termos da alínea b) do nº 1 do artigo 70º da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro.

Pretende a apreciação da constitucionalidade das normas dos artigos 1º, 3º, 4º, nº 1, alínea g), 108º e 115º do Decreto-Lei nº 422/89, de 2 de Dezembro, por alegada violação dos artigos 8º e 29º da CR.

Foi o arguido notificado para alegar, não sem antes o ter sido para a eventualidade de não se conhecer da questão relativa àquele artigo 8º, que se recorta como de mera ilegalidade e, nessa medida, não subsumível à precisão da alínea b) do nº 1 do citado artigo 70º – sobre o que silenciou.

As alegações apresentadas concluíram assim:

"1- O princípio da tipicidade é uma das traves mestras do ordenamento jurídico penal, e do próprio Estado de Direito Democrático, tendo a normal penal de ser "certa e precisa" na determinação do facto que o legislador quis considerar como crime;

2- A norma incriminadora não pode ter validade constitucional, em face do artº 29º, nº 1, se o teor daquela se esgotar numa cláusula geral, imprecisa ou aberta que remeta o seu preenchimento para o arbítrio do julgador;

3- O artº 1º do DL. 422/89 não especifica suficientemente os factos que constituem o tipo legal de crime, pois o resultado de todos os jogos de diversão é contingente por assentar na sorte, desde os jogos de cartas ou jogo da glória e do monopólio, os quais estão à venda nos supermercados;

4- Sendo qualquer jogo constituído pela componente sorte e pela componente perícia, é impossível para qualquer intérprete, em face da redacção do artº 1º, traçar a fronteira entre a licitude/ilicitude, pois o advérbio "fundamentalmente" não constitui nenhum critério...

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