Acórdão nº 395/11 de Tribunal Constitucional (Port, 21 de Setembro de 2011

Magistrado ResponsávelCons. Carlos Fernandes Cadilha
Data da Resolução21 de Setembro de 2011
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 395/2011

Processo n.º 674/2011

Plenário

Relator: Conselheiro Carlos Cadilha

Acordam, em Plenário, no Tribunal Constitucional

  1. Relatório

    1. Empresa Jornal da Madeira, Lda. e João Henrique Pinto Correia, vêm, na qualidade respectiva de proprietária e director do Jornal da Madeira, interpor junto do Tribunal Constitucional, ao abrigo do disposto no artigo 102.º-B da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro (LTC), recurso da deliberação da Comissão Nacional de Eleições (CNE) de 13 de Setembro de 2011, que ordenou a notificação daquele último para «cumprir o disposto no n.º 2 do artigo 7.º do DL n.º 85-D/75, de 26 de Fevereiro, sob pena de, não o fazendo, cometer o crime de desobediência previsto e punido pelo artigo 348.º do Código Penal», requerendo, a final, a anulação da deliberação impugnada.

    Invocam, para tanto, que a referida deliberação, para além de ter sido notificada aos recorrentes em circunstâncias de tempo que consideram violadoras do deveres de boa fé e colaboração com os particulares a que a CNE está obrigada, padece de vícios formais, decorrentes da sua intempestividade e falta de fundamentação, e do vício de violação de lei, o que sintetizam, em sede de conclusões, do seguinte modo:

    I. A CNE violou os mais elementares deveres de boa fé (previsto no artigo 6°- A do CPA) e de colaboração com os particulares (previsto no artigo 7º do CPA) ao enviar uma vez mais, tarde e a más horas (depois de encerrados os serviços administrativos da EJM) a sua decisão, prejudicando, assim, os direitos de defesa dos Recorrentes, já que (na prática) reduziu a umas horas, o prazo para apresentação da defesa dos Recorrentes. Nem se podendo invocar o carácter de urgência da decisão da CNE, já que a CNE conseguiu levar 7 dias para elaborar uma deliberação e informação praticamente idênticas à anterior (proferida em 30/8/2010) e ainda assim, frise-se, padecendo, igualmente, do vicio de falta de fundamentação.

    Sem prescindir,

    II Nos termos do art. 141.° do CPA, ex vi do art. 137º, nº. 2 do CPA, os actos administrativos inválidos só podem ser renovados (“ratificados”) dentro do prazo do respectivo recurso contencioso ou até à resposta da entidade recorrida.

    III. A alegada “renovação” da Deliberação da CNE de 30/08/2011 em 13/09/2011 é intempestiva, porquanto em 1/09/2011 os ora Recorrentes interpuseram recurso para o Tribunal Constitucional daquela Deliberação, nos termos do art. 102.°-B da Lei n.° 28/82 de 15 de Novembro.

    IV. Pelo que se a CNE pretendesse ratificar a referida Deliberação, deveria tê-lo feito imediatamente após a remessa dos autos para o Tribunal Constitucional, mas nunca após o decurso do prazo que o Tribunal Constitucional dispunha para decidir.

    Sem prescindir,

    V. A Deliberação da CNE é ANULÁVEL (nos termos do artigo 135° do CPA), por falta de fundamentação nos termos do artigo 125° do CPA e 268° n° 3 da CRP, visto conter fundamentação insuficiente e contraditória.

    VI. Atendendo à natureza acusatória da Deliberação da CNE, a qual comina, inclusivamente, caso seja inobservada, a aplicação de um crime de desobediência ao Director do JM e uma vez que a CNE pretende suprimir e comprimir direitos, tão fundamentais e essenciais como o direito constitucionalmente garantido da liberdade de expressão e da liberdade de imprensa, a fundamentação da decisão da CNE deveria ser o mais circunstanciada e o mais completa possível, só sendo suficiente se esclarecesse concretamente os factos que integravam as condições legais da decisão e se não ignorasse os argumentos principais que os Recorrentes invocaram na suas sucessivas respostas às participações (vide documentos nos 7 a 11 juntos à Deliberação da CNE), o que a CNE pura e simplesmente não fez.

    VII. A CNE não fundamenta o porquê da aplicação do DL n° 85-D/75, de 26 de Fevereiro, ao período de 6 de Agosto a 26 de Agosto, uma vez que neste período não está ainda em causa o período da campanha eleitoral, o qual decorrerá de 25/9/2011 a 7/10/2011 e uma vez que este diploma legal aplica-se, apenas, ao período de campanha eleitoral. Sendo que, ainda que o DL nº 85-D/75, de 26 de Fevereiro, fosse aplicável ao período de pré- campanha, o que se admite apenas por mera questão de raciocino, sendo os deveres nesta fase mais ténues do que no período de campanha eleitoral, e estando o eleitorado a 1 mês do inicio do período de campanha eleitoral, a CNE devia ter tido o especial cuidado de fundamentar a sua decisão, uma vez que se trata de uma limitação à liberdade de expressão (artigo 37º da CRP) e à liberdade de imprensa (artigo 38° da CRP) e uma ingerência no alinhamento editorial de um órgão de comunicação social.

    VIII. A CNE não fundamenta o tipo de decisão que está aqui em causa nos termos do artigo 15° do Regimento da CNE, o que não é de todo irrelevante uma vez que só a partir dessa qualificação é que os Recorrentes conseguem entender se a decisão tem ou não carácter vinculativo.

    IX. A Deliberação da CNE não especifica como seria seu dever os factos que considera provados e não provados, nem tão pouco analisa criticamente os argumentos invocados pelos Recorrentes nas suas sucessivas defesas, bem como a prova documental e testemunhal que estes produziram nos vários processos.

    X. A Deliberação da CNE sustenta a sua “fundamentação” numa Informação que por sua vez remete para um mero documento anexo não assinado, nem rubricado) com excertos de alguns artigos de opinião, sem estabelecer um nexo causal entre estes (individualmente considerados e em conjunto) com a lei que supostamente consideram violada. A Deliberação deveria especificar concretamente quais os fundamentos de facto e a partir daí relacioná-los com o direito aplicável, não sendo suficiente para uma fundamentação clara e esclarecida, uma simples menção da violação de uma norma legal, sem que se estabeleça em que termos concretos de facto, a mesma norma foi violada, mais a mais tendo em conta que a Deliberação visa a supressão/limitação de direitos fundamentais como a liberdade de expressão (artigo 37º da CRP) e de imprensa (artigo 38° da CRP).

    XI. A fundamentação da CNE é contraditória, pois nos considerandos da Deliberação e na Informação que a sustenta refere simultaneamente aspectos relacionados com as publicações de carácter jornalístico e as matérias de opinião e depois conclui, apenas, no sentido de limitar os espaços de opinião, deixando em aberto para os Recorrentes e sem se perceber, qual a posição, no fim de contas, da CNE quanto ao tratamento jornalístico efectuado pelos Recorrentes e qual o sentido (se é que existe algum) da decisão da CNE quanto a esta matéria. Acresce que, a análise que a CNE efectua às edições do JM extravasa as participações apresentadas. Com efeito, nas participações intentadas junto à CNE contra a EJM referem-se, apenas, as edições do JM de 6 de Agosto de 2011 a 22 de Agosto de 2011. Ora, a CNE estende a sua ‘"análise” às edições do JM de 6 de Agosto de 2011 a 26 de Agosto de 2011, sem que se perceba porquê-!

    Sem prescindir.

    XII. As determinações do DL n° 85-D/75. de 26 de Fevereiro visam o período de campanha eleitoral (que terá inicio no dia 25/9/2011 e terminará no dia 7/10/2011). O que significa que no período analisado pela CNE (6 de Agosto a 26 de Agosto de 2011) e até ao dia 25/9/2011 este diploma legal não tem aplicação.

    Sem prescindir,

    XIII. A CNE analisou os artigos de opinião publicados no JM no período de 6 de Agosto a 26 de Agosto (o que equivale a 21 dias de edições), a 1 mês do período de campanha eleitoral. Ora, ainda que se considerasse aplicável ao período de pré-campanha eleitoral o DL n° 85-D/75, de 26 de Fevereiro, o que se admite apenas por mera hipótese de raciocínio, atendendo a que esta fase se iniciou em 28/7/2011 e terminará em 24/09/2011, estaríamos a falar de 59 dias de edições do JM que não foram integralmente analisadas pela CNE. Desse período de tempo, a CNE analisou, apenas, os artigos de opinião referentes a 21 dias de fase eleitoral, ou seja, apenas 21 edições do JM. E dessas 21 edições do JM analisadas pela CNE muitos dos artigos de opinião nem sequer fazem qualquer referência a candidaturas, partidos políticos ou eleições. Ora, para haver rigor na amostragem usada pela CNE e para que se pudesse concluir que efectivamente os Recorrentes não davam cumprimento ao nº 2 do artigo 7° do DL n° 85-D/75, de 26 de Fevereiro, teria sido necessário abranger, as edições do JM durante todo o período de pré campanha eleitoral, ou pelo menos, num período de tempo de “campanha eleitoral” mais alargado. Ora, não tendo a CNE feito isso não tem base factual e legal para considerar preenchido o n° 2 do artigo 7º do DL n° 83-D/75, de 26 de Fevereiro.

    XIV. E se a CNE considerasse que haveria o perigo do JM poder prevaricar tal disposição legal, então deveria ter optado por tomar medidas provisórias, nos termos do artigo 84° do CPA, antes de proferir uma decisão para a qual não tem qualquer sustento factual e legal.

    Sem prescindir,

    XV. Pelas contas da CNE, no período de tempo analisado, que, frise-se não corresponde sequer ao período de campanha eleitoral (o qual está ainda à distância de um mês), dos 57 artigos de opinião analisados, cerca de 19 não têm qualquer relação com candidaturas, partidos políticos ou eleições e dos cerca de 38 artigos de opinião que supostamente constituem, segundo a CNE, violação ao n° 2 do artigo 7° do DL n° 85-D/’5, de 26 de Fevereiro, pelo menos, 13 destes artigos de opinião não têm carácter partidário e/ou relacionado com a fase de campanha eleitoral em curso, o que uma vez mais, reduz a amostragem da CNE a uns poucos artigos de opinião dispersos no tempo, o que impede que se possa considerar preenchido o conceito de "forma sistemática de propaganda” do nº 2 do artigo 7° do DL n° 85-D/75, de 26 de Fevereiro.

    Sem prescindir,

    XVI. É FALSO e desprovido de qualquer fundamento o alegado pelos Participantes e o sentido da Deliberação proferida pela CNE: o JM sempre efectuou um tratamento jornalístico das campanhas...

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