Acórdão nº 63/11 de Tribunal Constitucional (Port, 02 de Fevereiro de 2011

Magistrado ResponsávelCons. Maria João Antunes
Data da Resolução02 de Fevereiro de 2011
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 63/2011

Processo n.º 251/2010

  1. Secção

Relator: Conselheira Maria João Antunes

Acordam na 1ª secção do Tribunal Constitucional

  1. Relatório

    1. Nos presentes autos, vindos do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, em que é recorrente o Ministério Público e recorrido A., foi interposto recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo da alínea a) do nº 1 do artigo 70º da Lei da Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional (LTC), da decisão daquele Tribunal de 25 de Setembro de 2009.

    2. A decisão recorrida recusou a aplicação da norma do artigo 9.º da Lei nº 60/2005, de 29 de Dezembro, na parte em que revoga a obrigatoriedade de inscrição na Caixa Geral de Aposentações, estabelecida pelo artigo 1.º do Decreto-Lei nº 134/79, de 18 de Maio, por violação do n.º 4 do artigo 63.º da Constituição da República Portuguesa, com a seguinte fundamentação:

      Com a instauração da presente acção pretende o Autor que a Ré Caixa Geral de Aposentações seja condenada a conceder-lhe o subsidio vitalício, previsto no Decreto- lei nº 134/79 de 18 de Maio, requerido em 19 de Setembro de 2008, o qual foi indeferido por despacho da Ré, datado de 14 de Novembro de 2008, com fundamento na circunstância de tal diploma já não se encontrar em vigor no ordenamento jurídico nacional.

      Estamos pois perante uma acção administrativa especial que visa obter a condenação da entidade competente à prática de um acto administrativo recusado.

      O objecto do presente processo é, nos termos do art. 66º nº 3 do CPTA, a pretensão do interessado e não o acto de indeferimento.

      Para apreciar da bondade da pretensão, importa necessariamente proceder à análise das normas jurídicas invocadas.

      Estabelece o art. 1°, nº 1 do Decreto-Lei nº 134/79 de 18.05 - que revogou o Decreto-lei nº 45/76 de 20.01 - que (…)

      Acrescenta o nº 2 da referida norma que (…)

      A Lei 60/2005 de 29.12, com entrada em vigor a 01.01.06, estabelece mecanismos de convergência do regime de protecção social da função pública com o regime geral da segurança social no que respeita às condições de aposentação e cálculo das pensões.

      Preceitua o artigo 2º daquele diploma que “1 - A Caixa Geral de Aposentações deixa, a partir de 1 de Janeiro de 2006, de proceder à inscrição de subscritores.

      2 - O pessoal que inicie funções a partir de 1 de Janeiro de 2006 ao qual, nos termos da legislação vigente, fosse aplicável o regime de protecção social da função pública em matéria de aposentação, em razão da natureza da instituição a que venha a estar vinculado, do tipo de relação jurídica de emprego de que venha a ser titular ou de norma especial que lhe conferisse esse direito, é obrigatoriamente inscrito no regime geral da segurança social.”

      Por sua vez, determina o art. 9º do mesmo diploma a revogação do artigo 1º do Estatuto da Aposentação, aprovado pelo Decreto-Lei nº 498/1972, de 9 de Dezembro, e todas as normas especiais que confiram direito de inscrição na Caixa Geral de Aposentações.

      A entidade demandada, Caixa Geral de Aposentações defende que com a entrada em vigor da Lei nº 60/2005 de 29/12, o Decreto-lei 134/79 de 18/05 foi tacitamente revogado, dado que, a partir de 1 de Janeiro de 2006, já não são admitidas inscrições ao abrigo, quer do Estatuto da Aposentação, quer daquele regime quer de qualquer outro que, até então, tivesse sido gerido pela CGA.

      O Autor argumenta que a legislação agora em vigor não opera qualquer revogação do Decreto-lei 134/79 de 18 de Maio; e que a CGA faz uma interpretação literal e arbitrária da Lei 60/2005, impedindo-o de aceder a uma prestação que sempre foi legalmente reconhecida como contrapartida do tempo prestado ao Estado.

      A ser aceite o entendimento da CGA, estaria a lei 60/2005 ferida de inconstitucionalidade, no seu art. 9º, por violação do art. 63º, nº 4 da CRP.

      Em geral, o Autor reproduz e adere à Recomendação nº 4/B/2007 de 27.07 do Provedor de Justiça.

      O subsídio vitalício é uma prestação atribuível a todos aqueles que, tendo atingido a idade de 70 anos, tenham prestado pelo menos cinco anos de serviço seguidos ou interpolados para a Administração Central, Regional ou Local ou para outras pessoas colectivas de direito público, independentemente de terem sido ou não subscritores da Caixa Geral de Aposentações, desde que não tenham contribuído, naquela qualidade, para outra instituição de previdência.

      O preenchimento destes requisitos pelo Autor é pacífico.

      Sucede que a atribuição do subsídio pressupõe, naturalmente, a inscrição prévia dos respectivos beneficiários na CGA.

      E é aqui que reside a discórdia.

      O art. 1º, nº 1 do Decreto-Lei nº 134/79 de 18.05 preceitua que quem preencher os já referidos pressupostos é “obrigatoriamente inscrito” na CGA.

      Esta é uma norma especial que confere o direito de inscrição na CGA.

      Em nosso entendimento, é inevitável concluir (como o fez a entidade demandada) que o direito de inscrição na CGA aí previsto foi revogado pelo art. 9º da Lei 60/2005 de 29/12.

      De facto, a Lei 60/2005 de 29/12 (art. 2º) veio impossibilitar a CGA de admitir novos subscritores a partir de 1 de Janeiro de 2006, independentemente da finalidade e da fonte legal dessa inscrição e definiu para o pessoal que inicie funções a partir dessa data a obrigatoriedade de inscrição no regime geral da Segurança Social.

      Do que até aqui vem exposto, deparamo-nos com a seguinte situação: o decreto lei nº 134/79, a nosso ver, foi revogado apenas e só na parte em que estabelece o direito de inscrição na CGA.

      Todavia, aderindo às palavras do Sr. Provedor de Justiça, a inscrição prévia do beneficiário na CGA mais não é do que um acto burocrático com vista à concessão de um direito legalmente consagrado.

      Assim, não houve uma manifestação clara e expressa da intenção de revogar a concessão do subsídio vitalício.

      Não se extinguiu o direito, eliminou-se a possibilidade de levar a cabo um acto burocrático do qual depende a concessão do direito. E sem criar alternativa.

      Em síntese, não há uma norma a revogar a concessão do subsídio vitalício (nem tal parece ter sido a intenção do legislador atenta a finalidade da Lei 60/2005), há sim uma norma revogatória que impede a inscrição na CGA e uma norma que não permite a inscrição no regime geral da Segurança Social (cfr. art. 2º da Lei 60/2005), na medida em que os futuros beneficiários do subsídio vitalício não cumprem os requisitos aí previstos.

      Assim, para aqueles que iniciem funções a partir de 1 de Janeiro de 2006, foi criada uma alternativa, foi garantida uma protecção social.

      Porém para os futuros beneficiários do subsídio vitalício não foi criada essa ou outra alternativa que permita ver considerado e contado o tempo de serviço prestado ao Estado.

      Nesta medida, consideramos que a revogação, operada pelo art. 9º da Lei 60/2005, do art. 1º do Decreto-lei nº 134/79 de 18 de Maio na parte em que estabelece a obrigatoriedade de inscrição na Caixa Geral de Aposentações, padece de inconstitucionalidade por violação do nº 4º do art. 63º da Constituição da República Portuguesa (CRP), nos termos do qual “Todo o tempo de trabalho contribui, nos termos da lei, para o cálculo das pensões de velhice e invalidez, independentemente do sector de actividade em que tiver sido prestado.”

      O referido preceito constitucional pretende salientar o princípio do aproveitamento total do tempo de trabalho para efeitos de pensão de velhice e de invalidez, acumulando-se os tempos de trabalho prestados em várias actividades e respectivos descontos para os diversos organismos de segurança social.

      A aludida revogação sem a criação de mecanismos alternativos acarreta que o tempo de serviço prestado ao Estado pelos potenciais beneficiários do subsídio vitalício não seja considerado para quaisquer efeitos, designadamente para a protecção na velhice.

      O artigo 204.º da CRP impõe que os tribunais, nas suas decisões, não apliquem normas que infrinjam o disposto na Constituição ou princípios nela consignados.

      O disposto no art. 9º da Lei 60/2005, no tocante à revogação do art. 1º do Decreto-lei nº 134/79 de 18 de Maio na parte em...

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