Acórdão nº 254/08 de Tribunal Constitucional (Port, 30 de Abril de 2008

Magistrado ResponsávelCons. Benjamim Rodrigues
Data da Resolução30 de Abril de 2008
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 254/2008

Processo n.º 159/08

  1. Secção

    Relator: Conselheiro Benjamim Rodrigues

    Acordam, em conferência, na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional:

    A – Relatório

    1 – A. reclama para a conferência, ao abrigo do disposto no n.º 3 do art.º 78.º-A da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, na sua actual versão (LTC), da decisão sumária proferida pelo relator que decidiu não conhecer do recurso de constitucionalidade interposto do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça.

    2 – Fundamentando a reclamação, a reclamante argumenta do seguinte jeito:

    I – INTRODUÇÃO

    1. A Requerida, ora Reclamantes, interpôs recurso para este Tribunal da decisão final proferida pelo Supremo Tribunal de Justiça no âmbito dos autos de recurso nº 4850/07, que correu os seus termos na 3ª Secção.

    2. No dia 4 de Março de 2008 foi proferida decisão sumária de rejeição do recurso interposto pelos recorrentes, nos termos e para os efeitos constantes do no art. 78º-A, nº 1 da L.T.C..

    3. Essa decisão sumária entendeu, em suma, o seguinte:

    “(...) a recorrente não suscitou durante o processo qualquer questão de constitucionalidade normativa, tendo apenas controvertido a decisão judicial qua tale, enquanto momento de aplicação do direito a uma dada factualidade, razão pela qual não pode o Tribunal Constitucional tomar conhecimento do objecto do recurso.

    (...)

    Por isso conclui-se que, contrariamente ao alegado, a recorrente não suscitou junto do tribunal recorrido qualquer questão de (in)constitucionalidade normativa, nem podia a recorrente considerar-se dispensada de o fazer à luz das incidências constantes dos autos que afastam, quanto à matéria em causa, a possibilidade de se poder configurar o Acórdão recorrido como uma “decisão surpresa”

    Além do exposto, diga-se ainda que os preceitos do direito positivo à luz dos quais se definiu a questão de “constitucionalidade” acabam inclusivamente por não tocar na ratio decidendi que esteve subjacente ao juízo posto em crise e que se colhe da norma que permitiu ao tribunal indeferir um requerimento de produção de prova na consideração de que a mesma não se afigura útil ou necessária “à descoberta da e à boa decisão da causa” – cf. Despacho de fls. 253 v. e artigo 340º do Código de Processo Penal

    4. Atenta a fundamentação da decisão sumária, a qual contra todas as legítimas expectativas da ora Reclamante, decidiu não conhecer do objecto do recurso, e por não se conformarem manifestamente com o teor de tal decisão, apresentam os recorrentes a seguinte reclamação:

    II – DA RECLAMAÇÃO

    5. A decisão sumária proferida nos presentes autos e ora em apreço, na parte relevante para a apreciação da presente reclamação, cuja parte decisória se cinge aos consagrado de fls. 24 a 27, avança, em 1º lugar, que a Recorrente não suscitaram a questão “durante o processo”.

    6. Com todo o respeito, não é correcta tal asserção, porquanto a Recorrente logo que confrontada com a interpretação que reputa de inconstitucional arguiu tal vício.

    7. Concretamente, fizeram-no logo no recurso interposto para o Supremo Tribunal de Justiça uma vez que a Lei nº 65/2003, de 23 de Agosto, – Lei do Mandado de Detenção Europeu – apenas admite recurso da decisão final.

    8. E fizeram-no de modo a que o tribunal se pudesse pronunciar sobre a inconstitucionalidade de tal interpretação, embora a decisão recorrida se tenha limitado a acolher na íntegra a tese exposta na decisão do Tribunal da Relação de Lisboa, escusando-se a dilucidar a questão da interpretação normativa que lhe foi concretamente colocada pela Recorrente.

    9. Optando por referir somente que “a prova pretendida (dos factos integradores da causa de recusa facultativa invocada), como se viu, era de todo inoperante e irrelevante, atendendo à solução do art. 7º, nº 2 do Código Penal

    10. Deixando inclusivamente de se pronunciar relativamente uma outra questão de constitucionalidade que a Recorrente havia levantado no seu requerimento de interposição de recurso que era a de saber se assistia ou não à Requerida o direito a ser ouvida após a junção aos autos do original do MDE em obediência ao nº1 do art. 32º da CRP.

    11. Considerou a Recorrente que o Tribunal da Relação de Lisboa havia levado a cabo uma interpretação inconstitucional das normas constantes nos nºs 1, 2 e 3 do art. 21º da Lei 65/2003, de 23 de Agosto, conjugadas com a alínea h) do nº 1 do art. 12º da mesma lei não apenas por ter negado a produção de prova da causa de recusa invocada mas também por ter lhe negado o direito a ser ouvida pessoalmente após a junção aos autos do original do MDE.

    12. Ou seja, a Recorrente colocou perante o Supremo Tribunal de Justiça duas concretas questões de constitucionalidade normativa, fundamentando a sua arguição com a violação do art. 32º, nº 1 da Lei Fundamental.

    13. Não obstante, confrontada com o acórdão, mais uma vez a Recorrente, em sede de aclaração, chamaram a atenção do Tribunal recorrido para a essencialidade de ser proferida uma decisão que cabalmente esclarecesse qual a interpretação que o Supremo Tribunal de Justiça adoptava, pretendendo evitar que o citado Tribunal se escudasse em considerações acerca da matéria de facto furtando-se a responder às questões de constitucionalidade que concretamente lhe foram colocadas.

    14. Inclusivamente a Recorrente sublinhou a essencialidade de tal esclarecimento face aos requisitos de recorribilidade impostos pela Lei Orgânica do Tribunal Constitucional.

    15. O Supremo Tribunal de Justiça, apesar de indeferir o requerimento aclaratório, elaborou resposta que ocupa 8 páginas, mas na qual, novamente, se furta a concretamente responder à interpelação da Recorrente quanto às arguidas interpretações inconstitucionais das normas constantes nos nºs 1, 2 e 3 do art. 21º da Lei 65/2003, de 23 de Agosto, conjugadas com a alínea h) do nº 1 do art. 12º da mesma lei.

    16. O que é facto é que os Recorrentes criaram todas as condições para que o Tribunal se pronunciasse sobre a inconstitucionalidade da interpretação que fez vencimento.

    17. E fizeram-no de forma a que o Tribunal pudesse apreciar as questões que, posteriormente, motivaram a interposição de recurso para o Tribunal Constitucional.

    18. Ora, suscitar uma inconstitucionalidade “durante o processo” não pode implicar que as partes que a suscitam tenham de, imediatamente, interpor o recurso e alegar, com todo o formalismo e desenvolvimento, como se, no Tribunal Constitucional, o processo já se encontrasse.

    19. Não é exigível às partes tal comportamento.

    20. Mas tão só colocar a questão à entidade decisória, de forma a prevenir a inconstitucionalidade na interpretação das normas.

    21. No presente caso, os Recorrentes fizeram-no e o Tribunal recorrido, não só não apreciou tal questão, porque não quis, pois tinha todos os elementos e fundamentos para não proferir tal decisão, essa sim “contra legem”.

    22. Por outro lado, não é verdade que os Recorrentes não invoquem questões de inconstitucionalidade normativa, e que apenas acusem a decisão de que recorrem de inconstitucional.

    23. É a interpretação (e só a interpretação) das normas que fundamentam a decisão que está em causa.

    24. Pelo que a Recorrente não concorda ainda com a decisão sumária ao concluir que “a recorrente não suscitou durante o processo qualquer questão de constitucionalidade normativa, tendo apenas controvertido a decisão judicial qua tale, enquanto momento de aplicação do direito a uma dada factualidade”

    25. Pois o que resulta dos autos é precisamente que a Recorrente suscitou e enquadrou devidamente a questão de constitucionalidade normativa que pretendia ver apreciada.

    26. Mas que, naturalmente, tinha reflexo directo e necessário na “aplicação do direito a dada factualidade” pois, de outro modo, sempre seria inútil a sua arguição.

    27. De facto, a Recorrente expressamente deixou consignadas quais as normas legais que o tribunal interpretava de forma não consentânea com os ditames constitucionais.

    28. Na verdade, o Tribunal recorrido é que se recusou a apreciar as questões de constitucionalidade que lhe foram colocadas de uma perspectiva normativa.

    29. Pelo que não pode a Recorrente conformar-se com a afirmação de que “apenas provocou uma sindicância do juízo aplicativo (...) sem questionar o critério interpretativo, que, a montante desse juízo, o justifica normativamente.”

    30. Na verdade, a Recorrente entende que as interpretações inconstitucionais por si arguidas foram suscitadas de acordo com a Lei Orgânica do Tribunal Constitucional e gostaria de ter a oportunidade de explicar em sede de alegações os princípios constitucionais violados, visto ser esta a sede própria para o fazer após o recurso ser admitido.

    Nestes termos, vem a Recorrente requerer a V. Ex.as seja o teor da presente reclamação atendido e a decisão sumária proferida revogada, concluindo-se, a final, pela admissibilidade e consequente conhecimento do recurso interposto.

    3 – Pronunciando-se sobre a reclamação o Procurador-Geral Adjunto, no Tribunal Constitucional, respondeu dizendo:

    A presente reclamação é manifestamente improcedente.

    Efectivamente, a argumentação da reclamante em nada abala os fundamentos da decisão reclamada, relativamente à inverificação dos pressupostos do recurso interposto, como decorrência de não ter sido questionado, em termos processualmente adequados, qualquer critério normativo, extraído dos preceitos legais arrolados pela recorrente – e por ela claramente enunciado.

    .

    4 – A decisão reclamada tem o seguinte teor:

    «1 – A., melhor identificada nos autos, recorre para o Tribunal Constitucional ao abrigo do disposto no artigo 70.º, n.º 1, alínea b), da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, na sua redacção actual (LTC), mediante requerimento no qual deixa consignadas as seguintes indicações:

    “(...)

    A Recorrente pretende ver apreciada a constitucionalidade das normas conjugadas dos nºs 1, 2 e 3 do art. 21º, e da alínea h) do nº 1 do art. 12º da Lei nº 65/2003 de 23 de Agosto, por ir contra o...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT