Acórdão nº 143/14 de Tribunal Constitucional (Port, 13 de Fevereiro de 2014

Magistrado ResponsávelCons. Maria José Rangel de Mesquita
Data da Resolução13 de Fevereiro de 2014
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 143/2014

Processo n.º 261/12

  1. Secção

Relator: Conselheira Maria José Rangel de Mesquita

Acordam, na 3.ª Secção do Tribunal Constitucional

I – Relatório

  1. Nos presentes autos, vindos do Tribunal da Relação do Porto, em que é recorrente A. e recorrido o Ministério Público foi interposto recurso, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 280.º da Constituição e da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei do Tribunal Constitucional (LTC), aprovada pela Lei n.º 28/82, de 15 de novembro, na redação que lhe foi dada pela Lei n.º 13-A/98, de 26 de fevereiro, do acórdão proferido pelo Tribunal da Relação do Porto, em 7 de março de 2012 (fls. 823 a 832), que julgou improcedentes as nulidades invocadas pelo ora recorrente quanto a precedente acórdão do mesmo Tribunal datado de 7 de dezembro de 2011.

  2. O recorrente submeteu à apreciação do Tribunal Constitucional a «inconstitucionalidade da aplicação do art.º 105.º do RGIT quando se extinguiu a responsabilidade tributária, por violação do disposto no art.º 32.º da CRP» e a «nulidade, por manifesta violação do art.º 20.º n.º 4 da CRP, por violação do princípio do processo equitativo e da imposição de decidir por não se apreciar na decisão a suscitada inconstitucionalidade supra» (cfr. fls. 839-840), como se retira do requerimento de interposição do recurso de constitucionalidade apresentado:

    A.,

    Com sinais nos autos,

    Notificado do Ac. de Fls.

    Vem dele

    RECORRER

    Para o Tribunal Constitucional, concedendo-se ao recurso efeito suspensivo, e subida imediata nos próprios autos (Art.º 78º nº 4 da Lei n.º 28/82 de 15 de novembro), processando-se o recurso nos termos da al b) do Art.º 70º da Lei n.º 28/82 de 15 de novembro,

    O recurso tem por base as seguintes questões:

    -A inconstitucionalidade da aplicação do Art.º 105º do RGIT quando se extinguiu a responsabilidade tributária, por violação do disposto no Art.º 32º da CRP;

    -A nulidade, por manifesta violação do Art.º 20º n.º 4 da CRP, por violação do principio do processo equitativo e da imposição da obrigação de decidir, por não se apreciar na decisão a suscitada inconstitucionalidade enunciada supra:

    Para os devidos efeitos, esclarece que as questões em causa, foram suscitadas:

    - Na interposição de recurso, e nas alegações respetivas;

    - Nos requerimentos de declaração de nulidade por omissão de pronúncia formulados nos autos, em 4.10.2010, 03.02.2011, 30.05.2011, e 18.01.2012.

    Que não obstante ter sido suscitada em todas as ocasiões indicadas supra, não houve decisão sobre as questões suscitadas.

  3. O recurso de constitucionalidade foi admitido por despacho do Tribunal recorrido de 28/03/2012 (cfr. fls. 841) e prosseguiu neste Tribunal para alegações (cfr. fls. 848), delimitado o respetivo objeto às questões de inconstitucionalidade invocadas (cfr. Despacho do Juiz Relator de 23/04/2012, a fls. 847).

  4. Nessa sequência o recorrente apresentou alegações com o seguinte teor (cfr. fls. 849 a 857 e fls. 863 a 868):

    A questão de inconstitucionalidade que se coloca no presente recurso reporta-se à violação do Art. 32º da CRP, quando se procede à aplicação do disposto no Art.º 105º do RGIT, ou seja, criminalizando a conduta omissiva quando a responsabilidade tributária se extinguiu.

    Questão central para a decisão, é no fundo decidir se tipo criminal do Art.º 105º do RGIT é autónomo da concreta existência da responsabilidade criminal estabelecida pelo Art.º 105º do RGIT, e bem assim, determinar quais os efeitos da extinção da responsabilidade tributária sobre a criminalização da conduta.

    Nos presentes autos, e para os períodos de imposto em crise, os Recorrentes apenas foram constituídos como Arguidos e julgados, e posteriormente condenados, porque ao tempo da sua constituição como Arguidos, os juros contados nos processos de execução e as coimas correspondentes ao atraso no pagamento dos tributos ( mas que não se encontravam aplicadas), ainda não se encontravam pagas quer ao tempo da constituição como Arguidos, quer ao tempo da notificação nos termos da al. b) do n. 4 do Art.º 105º do RGIT.

    Entendem os Recorrentes que no caso concreto a interpretação conforme à constituição, maxime do Art.º 32º da CRP do tipo criminal previsto no Art.º 105º do RGIT não pode ser alheia ao regime da responsabilidade tributária dos visados. Com efeito, a responsabilidade tributária do devedor e a responsabilidade tributária dos seus gerentes têm recortes distintos, e quadros distintos, nomeadamente, porque a responsabilidade dos gerentes é subsidiária, e a responsabilidade criminal dos gerentes é autónoma da responsabilidade das sociedades.

    Resulta de forma clara da formulação do Art.º 105º do RGIT que a criminalização da conduta depende da existência de obrigação tributária, ou seja, o agente tem que estar obrigado ao pagamento de um determinado tributo. E nos termos e para efeitos do disposto no Art.º 105º n. 4 al.b), o pagamento dos juros e da coima que for devida, pressupõe igualmente que no caso, ainda se possam verificar os pressupostos para a aplicação da coima ao tempo da notificação operada para o cumprimento da obrigação fiscal, e que sejam devidos os juros.

    Tal aplicação da norma não pode de todo ser alheia ao regime da concreta responsabilidade tributária subsidiária dos gerentes.

    Tem especial relevo o disposto no Art.º 23º n. 5 da LGT, na medida em que, aos gerentes não é imposto o pagamento dos juros, dado que os gerentes estão isentos do pagamento de juros se for pago o imposto em causa.

    Assim, o Art.º 23º n.º 5 define a concreta obrigação fiscal dos gerentes, isentando-os do pagamento dos juros se o imposto tiver sido pago. No caso concreto, ao tempo da notificação para o disposto no Art.º 105º n.º 4 al. b) do RGIT, apenas a sociedade e não os gerentes tinham obrigação fiscal de pagamento do imposto, relevando em sede criminal, a inexistência de obrigação tributária dos gerentes no pagamento dos juros, por se encontrar devidamente pago o imposto em causa.

    E porque o tipo criminal não pode impor ou criar uma nova obrigação fiscal, que se encontra devidamente circunscrita ao conteúdo da concreta obrigação tributária, não pode ser imposto para a eventual extinção da responsabilidade criminal o cumprimento de obrigações alheias, no caso, de obrigação fiscal que pertence à sociedade, mas não aos seus gerentes.

    E vale o mesmo para a questão atinente às coimas. O Art.º 105º do RGIT não pode ser interpretado como norma isolada, e como se não existisse a norma do Art.º 7º n.º 4 do RGIT.

    Assim, no caso concreto em que o imposto devido estava pago, a notificação operada nos termos do Art.º 105º n.º 4 al. b) do RGIT apenas comportava a obrigação de pagamento dos juros e das coimas para a sociedade, mas não para os seus gerentes.

    Quer porque sobre os gerentes, nos termos do Artº 23 n.º 5 da LGT não impende a concreta obrigação de pagamento de juros,

    Quer porque nos termos do Art.º 7º n.º 4 do RGIT a responsabilidade pelas coimas por parte da sociedade exclui a responsabilidade individual dos gerentes

    A obrigação tributária e a garantia criminal do seu cumprimento são um todo indissociável.

    Por tal facto, a procedência de impugnação judicial ou de oposição ou de outra providência da qual venha a ocorrer a extinção da obrigação fiscal, extinguem a responsabilidade criminal, porque não há responsabilidade criminal sem que haja responsabilidade tributária.

    E no caso dos gerentes, a sua responsabilidade tributária subsidiária não integra a obrigação de pagamento de juros em caso de pagamento integral do imposto.

    E não integra a obrigação de pagamento de coimas, dado que, a responsabilidade por coimas das sociedade exclui a responsabilidade individual dos seus gerentes nos termos do n.º 4 do Art.º 7º do RGIT.

    Razão pela qual, não estando obrigados os gerentes ao pagamento de juros e coimas, tal pagamento não lhes pode ser imposto nos termos do Art.º 105º n.º 4 al. b) do RGIT, sendo clara a violação do Art.º 32º da CRP.

    E M C ON C L U S Õ E S:

    A – Nos termos do Art.º 23º n.º 5 da LGT, sendo efetuado o pagamento integral do imposto, a responsabilidade subsidiária dos gerentes não comporta a obrigação do pagamento de juros referentes ao tributo;

    B- Da mesma forma, nos termos do n.º 4 do Art.º 7 do RGIT, a responsabilidade contra ordenacional das pessoas coletivas exclui a responsabilidade individual dos respetivos gerentes;

    C – A medida da responsabilidade individual dos gerentes em sede criminal decorre da medida da sua responsabilidade tributária e contraordenacional;

    D- A extinção ou inexistência da responsabilidade tributária dos gerentes, exclui a responsabilidade criminal dos gerentes, na medida em que apenas há crime se houver obrigação tributária;

    E- A notificação nos termos da al. b) do n.º 4 do Art.º 105º do RGIT para proceder ao pagamento do imposto acrescido de juros e coimas não pode ser imposta aos gerentes, ou aos responsáveis subsidiários, na medida em que lhe imporia o cumprimento de uma obrigação fiscal a que os gerentes se não encontram adstritos;

    F – A imposição do cumprimento de obrigação própria da empresa aos seus gerentes, e ao...

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