Acórdão nº 66/10 de Tribunal Constitucional (Port, 04 de Fevereiro de 2010

Magistrado ResponsávelCons. Benjamim Rodrigues
Data da Resolução04 de Fevereiro de 2010
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 66/2010

Processo n.º 912/09

  1. Secção

Relator: Conselheiro Benjamim Rodrigues

Acordam na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional:

A – Relatório

1 – A. reclama para a conferência, ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 78.º-A da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, na sua actual versão, da decisão sumária proferida pelo relator, no Tribunal Constitucional, que decidiu não conhecer das questões de constitucionalidade apontadas nas alíneas c) a e) do seu requerimento de interposição de recurso e negar provimento ao recurso na parte restante [alíneas a) e b) do mesmo requerimento], ou seja, no tocante à norma obtida do artigo 2020°, n.º 1 do Código Civil, conjugadamente com o disposto da Lei n.º 7/2001, do Decreto–Lei n.º 322/90 de 18/10 e do Decreto–Regulamentar n.º 1/94 de 18/01, quando interpretado no sentido de que no tipo de acções como a que deu causa aos presentes autos, ser necessário a alegação e a prova, por parte da Autora, da impossibilidade de obtenção de alimentos da herança do falecido e da norma extraída dos artigos 6.° da Lei n.º 7/2001 de 11.5, 8.° n.º 1 do DL 322/90 de 18.10 e 3.° n.º 1 do Dec. Reg 1/94 de 18.1, quando interpretados no sentido de fazer depender a atribuição das prestações sociais à verificação dos requisitos exigíveis pela lei civil para a atribuição da pensão alimentar, julgando-as constitucionais.

2 – Fundamentando a sua reclamação, a reclamante esgrime do seguinte modo:

[…]

Conforme consta dos autos, a reclamante apresentou recurso para o Tribunal Constitucional.

Aduzindo os seguintes argumentos:

“…

1. Nos autos em referência, foram proferidas decisões as quais aplicaram normas cuja inconstitucionalidade já havia sido suscitada durante o processo, a saber:

1.1 Foi suscitada a inconstitucionalidade da norma do artigo 2020° n.º 1 do Código Civil; a inconstitucionalidade da norma do artigo 6° da Lei n.º 7/2001; a inconstitucionalidade da norma do artigo 8°, n.º 1 do Decreto — Lei n.º 322/90 de 18/10; a inconstitucionalidade da norma do artigo 3°, n.º 1 do Decreto — Regulamentar n.º 1/94 de 18/01;

1.2 E as peças processuais em que foram invocadas as inconstitucionalidades apontadas em 1.1 são as seguintes: Réplica (cfr. artigo 20°); Reclamação para a Conferência do Tribunal da Relação de Coimbra (cfr. artigo 13°); Resposta às Alegações perante o Tribunal da Relação de Coimbra (cfr. conclusão n.º 45); Alegações de Revista perante o Supremo Tribunal de Justiça (cfr. conclusão 35);

Perante o Tribunal Constitucional, nos termos do artigo 70° e seguintes da Lei do Tribunal Constitucional, requer-se a apreciação do seguinte:

a) É inconstitucional a norma do artigo 2020°, n.º 1 do Código Civil, quando interpretada no sentido de que no tipo de acções como a que deu causa aos presentes autos, ser necessário a alegação e a prova, por parte da Autora, da impossibilidade de obtenção de alimentos da herança do falecido; O artigo 2020° do Código Civil está regulado nos termos da Lei n.º 7/2001, do Decreto-Lei n.º 322/90 de 18/10 e do Decreto — Regulamentar n.º 1/94 de 18/01. Analisando este diploma regulamentar constata-se que os requisitos para que se beneficie de pensão de sobrevivência por parte da Segurança Social, basta apenas demonstrar o estado civil do falecido e a existência de uma relação de união de facto que perdura há mais de 2 anos (cfr. art. 2° DR 1/94) não incorrendo sobre o interessado o ónus da prova, quer da necessidade de alimento, quer da impossibilidade para os pagar por parte da herança ou dos familiares — os regimes legais que vieram fundamentar a disposição do artigo 2020° do CC resulta de forma inequívoca que, de acordo com a aplicação daqueles regimes existe uma equiparação total relativamente às medidas de protecção social quer em caso de agregado familiar unido pelo casamento, quer em caso de agregado familiar unido pela união de facto — os pressupostos para atribuição da pensão de sobrevivência são os mesmos seja para um, seja para o outro caso. Pelo que a norma do artigo 2020° interpretado em sentido diferente do supra explanado está a desvirtuar o espírito da Lei e a sua própria regulamentação — estando ainda a violar os artigos n.º 2°, 18° n.º 2, 13°, 63°, n.º 1 e 3 e 67° todos da Constituição da República Portuguesa, violando ainda o disposto nos artigos 9° e 21° da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia;

b) São inconstitucionais as normas dos artigos: artigo 6° da Lei n.º 7/2001; artigo 8°, n.º 1 do Decreto — Lei n.º 322/90 de 18/10; artigo 3°, n.º 1 do Decreto — Regulamentar n.º 1/94 de 18/01, quando interpretadas fora da concepção de que existe uma equiparação total relativamente às medidas de protecção que são atribuídas aos membros do agregado familiar unidos pela via do casamento com os membros do agregado familiar unidos pela via da união de facto — estando ainda a violar os artigos n.º 2°, 18° n.º 2, 13°, 63°, n.º 1 e 3 e 67° todos da Constituição da República Portuguesa, violando ainda o disposto nos artigos 9° e 21° da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia;

c) Inconstitucionalidade do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, proferido nos presentes autos, na medida em que faz uma interpretação inconstitucional do artigo 2020° do Código Civil e dos diplomas legais regulamentadores da união de facto — estando ainda a violar os artigos n.º 2°, 18° n.º 2, 13°, 63°, n.º 1 e 3 e 67° todos da Constituição da República Portuguesa, violando ainda o disposto nos artigos 9° e 21° da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia;

d) Inconstitucionalidade do Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, proferido nos presentes autos, na medida em que faz uma interpretação inconstitucional do artigo 2020° do Código Civil e dos diplomas legais regulamentadores da união de facto — estando ainda a violar os artigos n.º 2°, 18° n.º 2, 13°, 63°, n.º 1 e 3 e 67° todos da Constituição da República Portuguesa, violando ainda o disposto nos artigos 9° e 21° da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia;

e) Diz-se no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça que a Autora não alegou a impossibilidade de obtenção de alimentos da herança do falecido, referindo-se naquele Acórdão que a Autora não invocou nem demonstrou essa impossibilidade. Todavia, antes que fosse apreciada esta questão, nunca a recorrente foi notificada por qualquer tribunal para os efeitos previstos no artigo 508° do CPC, nomeadamente para a parte aperfeiçoar os seus articulados para depois o Tribunal poder decidir em conformidade. Note-se que ao decidir-se por um juízo com base numa falta de alegação — juízo esse efectuado em sede de recurso — nunca podia o Tribunal decidir antes de dar à parte prazo para esta, caso quisesse, poder aperfeiçoar o seu articulado. Ao não proceder deste modo, o Tribunal cometeu uma ilegalidade, proferindo uma decisão surpresa — proibida nos termos da nossa Lei, na medida em que decidiu sem assegurar a igualdade de meios e de recursos entre as partes — estando ainda a violar os artigos n.º 13° da Constituição da República Portuguesa;

Todavia, através da Decisão Sumária agora reclamado o Tribunal Constitucional, decidiu:

“… Não tomar conhecimento do objecto do recurso relativamente à matéria constante das alíneas c) a e) do requerimento de interposição de recurso (...) negar provimento ao recurso …”

Salvo o devido respeito, tal decisão não acautela devidamente os direitos da recorrente, na medida em que não foi proferida de acordo com todas as normas legais aplicáveis ao caso em concreto.

Nos presentes autos, a Autora (aqui alegante) intentou contra o ISS, Centro Nacional de Pensões acção visando a condenação daquela entidade a reconhecer a Autora, enquanto unida de facto de B., falecido em Janeiro de 2006, o direito a auferir as prestações por morte referidas nos artigos 3ª, al. e) e 6° da Lei n.º 7/2001 de 11 de Maio.

A acção interposta pela Autora mereceu provimento junto do, aliás douto, Tribunal de primeira instância.

Inconformado, o ISS — Centro Nacional de Pensões recorreu para as instâncias superiores, obtendo decisão de provimento quanto à sua pretensão.

Todavia, não obstante a prolação de tais decisões, a verdade é que as mesmas foram proferidas ao longo do processo em atropelo à Lei Fundamental do nosso sistema jurídico.

Isto é, ao longo de todo este processo verificaram-se várias situações de inconstitucionalidade, que foram devidamente invocadas e alegadas por parte da Autora.

Bem como se verificaram ilegalidades que, apesar de devidamente invocadas, ainda não foram corrigidas de modo a assegurar a regularidade e o equilíbrio da presente instância.

Irregularidades estas que não foram devidamente apreciadas e decididas pela decisão ora reclamada.

Ora, conforme consta do requerimento de interposição de recurso apresentado pela reclamante perante o Tribunal Constitucional, nunca a recorrente foi notificada por qualquer tribunal para os efeitos previstos no artigo 508° do CPC, no que diz respeito à questão invocada de que a Autora não alegou a impossibilidade de obtenção de alimentos da herança do falecido, referindo-se naquele Acórdão que a Autora não invocou nem demonstrou essa impossibilidade.

Tanto mais que, neste caso, compulsando os autos, verificamos que a Autora na parte final da p.i., alega inclusive que “não tem meios de subsistência”,

Todavia, sem concretizar se tal falta de meios de subsistência derivava da sua incapacidade pessoal, da sua família ou da própria herança do falecido.

Pelo que se impunha que a Autora fosse convidada a concretizar e a esclarecer o seu articulado sobre esta matéria a fim e antes do Tribunal proferir qualquer decisão.

Note-se que ao decidir-se por um juízo com base numa falta de alegação — juízo esse efectuado em sede de recurso — nunca podia o Tribunal decidir antes de dar à parte prazo para, caso quisesse, poder aperfeiçoar o seu articulado.

E, ao não proceder deste modo, o Tribunal cometeu uma ilegalidade, proferindo uma decisão surpresa...

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