Acórdão nº 332/16 de Tribunal Constitucional (Port, 19 de Maio de 2016
Magistrado Responsável | Cons. Fernando Vaz Ventura |
Data da Resolução | 19 de Maio de 2016 |
Emissor | Tribunal Constitucional (Port |
ACÓRDÃO Nº 332/2016
Processo n.º 1157/15
2.ª Secção
Relator: Conselheiro Fernando Ventura
Acordam na 2.ª secção do Tribunal Constitucional
I. Relatório
1. Por decisão de 30 de outubro de 2015, a Vice-Presidente do Tribunal da Relação do Porto indeferiu a reclamação apresentada pelo A., a qual versou despacho do Tribunal de Execução de Penas do Porto, que não lhe admitiu o recurso interposto da decisão de indeferimento da concessão de adaptação à liberdade condicional.
2. Inconformado, o recluso A. interpôs recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º, da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (LTC), peticionando a fiscalização da constitucionalidade de interpretação normativa do artigo 179.º, n.º 1, do Código de Execução das Penas e Medidas Privativas da Liberdade, segundo a qual é irrecorrível a decisão que indefere o pedido de concessão do período de adaptação à liberdade condicional, a qual considera violar o artigo 32.º, n.º 1, da Constituição.
3. Admitido o recurso, foi determinado neste Tribunal o prosseguimento do recurso para alegações, as quais foram apresentadas por recorrente e recorrido.
3.1. O recorrente pugnou por que seja julgada inconstitucional a norma que colocou a controlo, com a seguinte síntese conclusiva:
«A) O art.º 399.º do CPP prevê serem passíveis de recurso todos os despachos cuja irrecorribilidade não esteja prevista na lei, o que não sucede no caso em apreço.
B) O processo atributivo da Adaptação à Liberdade Condicional é em tudo semelhante ao que se encontra previsto para a Liberdade Condicional o que desde logo revela a similitude de objetivos com a atribuição duma e de outra, pese embora na primeira se possa dizer que a continuação do cumprimento da pena privativa de liberdade passe a ser executada em meio não institucional (na habitação do recluso) e através de meios técnicos de controlo à distância.
C) Em ambos os casos está em causa a ressocialização do recluso e a finalidade de se ir avaliando a forma como aquele evolui em meio não institucional.
D) Do ponto de vista da sistemática e do conteúdo das duas figuras não se veem razões suficientes para que num caso se admita o recurso da decisão de indeferimento (Liberdade Condicional) e noutro se negue tal direito (Adaptação à Liberdade Condicional).
E) A estas razões de ordem sistemática e de modelo, há ainda que acrescentar as que resultam da existência do princípio da recorribilidade de todas as decisões penais, com exceção das que o legislador entenda que não devam ser alvo de sindicabilidade por tribunal superior.
F) Afigura-se insuficiente a ilação que foi retirada pelo Tribunal Recorrido ao ter entendido que o facto do art.º 179.º do CEP apenas falar expressamente na possibilidade de recurso do despacho que negar a liberdade condicional, implicaria a insusceptibilidade de recurso da decisão que indefira a atribuição da adaptação à liberdade condicional.
G) Pela natureza das duas figuras em causa (como acima deixámos expresso), afigura-se-nos que o legislador terá pretendido abranger as duas situações na mesma expressão - Liberdade Condicional -, sendo assim ambas passíveis de recurso.
H) Todavia, mesmo que assim se não entendesse, a suscetibilidade de recurso decorreria do disposto no art.º 399.º do Código de Processo Penal e da não verificação de nenhuma das situações previstas nas alíneas do n.º 1, do art.º 400.º, desse mesmo diploma legal.
I) Nenhuma norma faz referência à irrecorribilidade de tal decisão, sendo certo que o legislador quando entende que uma decisão não é passível de recurso indica-o expressamente.
J) Pelo que teremos que concluir que a decisão que indefere a pretensão do recluso no sentido de lhe ser atribuída a adaptação à liberdade condicional é passível de recurso.
K) Acresce que o artigo 32.º, n.º 1, da Constituição da Republica Portuguesa inclui expressamente o direito ao recurso nas garantias de defesa assegurado em sede de processo penal, sendo identificado como garantia do duplo grau de jurisdição, quanto a decisões penais respeitantes à situação do arguido face à privação ou restrição da liberdade ou de quaisquer outros direitos fundamentais.
L) O instituto da adaptação à liberdade condicional tem como finalidade primacial o estabelecimento de uma fase de transição entre a reclusão em meio prisional e a liberdade condicional, permitindo ao delinquente retomar o sentido de orientação social enfraquecido por efeito de reclusão (finalidade preventivo - especial de reintegração do agente na sociedade) permitindo-lhe uma melhor reinserção social, sob controle apertado e evitando que o mesmo continue sujeito ao ambiente deletério do meio prisional.
M) A margem da exata qualificação dos processos de execução de penas, encontrando-se jurisdicionada a execução das penas e abrangendo as garantias de defesa todo o processo criminal, a negação do direito ao reexame, em via de recurso, da decisão denegatória da adaptação à liberdade condicional, com base na interpretação que foi dada ao artigo 179.º, n.º 1 do, Código de Execução de Penas, pelo Tribunal de Execução de Penas do Porto, traduz-se na imposição de um encurtamento inadmissível das garantias de defesa do recluso, sendo inconstitucional por violação do artigo 32.º, n.º 1 da Constituição da Republica Portuguesa.
Pelo que deve ser declarada inconstitucional por violação do art.º 32.º n.º 1 da CRP a interpretação do art.º 179.º n.º 1 do CEP no sentido da não admissão do recurso da decisão que indefere o pedido de adaptação à liberdade condicional, por considerar tratar-se de decisão irrecorrível.
3.2. Por seu turno, o Ministério Público entende que o recurso não merece provimento, deixando as seguintes conclusões:
«Crê-se poder, assim, concluir-se, por todo o exposto ao longo das presentes contra-alegações:
a) não ser inconstitucional “a interpretação normativa, extraída do artigo 179.º, n.º 1, do Código de Execução de Penas, segundo a qual é irrecorrível a decisão que indefira o pedido de concessão do período de adaptação à liberdade condicional”;
b) pelo que deverá manter-se a decisão recorrida, da Ilustre Vice-Presidente do Tribunal da Relação do Porto, de 30 de outubro de 2015, que confirmou a decisão do digno Juiz de Execução das Penas do Porto, de 3 de setembro de 2015, que rejeitou o pedido de concessão do regime de adaptação à liberdade condicional, formulado pelo recluso A..»
Cumpre apreciar e decidir.
II. Fundamentação
4. Como relatado, a norma em fiscalização decorre do disposto no n.º 1 do artigo 179.º do Código de Execução das Penas, onde se lê que “o recurso é limitado à questão da concessão ou recusa da liberdade condicional”. Sustenta o recorrente que o tribunal a quo aplicou sentido normativo inconstitucional, extraído por via interpretativa dessa disposição, segundo o qual é irrecorrível a decisão jurisdicional que denegue pretensão do recluso, com vista a beneficiar de período de adaptação à liberdade condicional. Para tanto, considera ofendida a garantia do direito ao recurso, contida no artigo 32.º, n.º 1, da Constituição.
5. Importa preliminarmente afastar o conhecimento de grande parte da argumentação que o recorrente levou às alegações (cfr. alíneas A) a I) das conclusões), votada a convencer que a interpretação acolhida e aplicada na decisão recorrida não é a correta, culminando na alínea J) das conclusões, onde defende que o legislador positivou a admissibilidade de recurso da decisão denegatória da concessão de período de adaptação à liberdade condicional. Essa é, porém, uma questão de legalidade, que não compete ao Tribunal Constitucional sindicar, cingido que está na sua cognição à norma efetivamente aplicada na decisão recorrida (artigo 280.º, n.º 1, da Constituição, e 70.º, n.º 1, da LTC).
6. A questão normativa de constitucionalidade aqui colocada foi já objeto de apreciação pelo Tribunal Constitucional, através do Acórdão n.º 150/2013, concluindo pelo afastamento do julgamento de inconstitucionalidade. Os fundamentos em que assentou tal Acórdão foram os que seguem:
«A questão de constitucionalidade a resolver no âmbito do presente recurso é, conforme se alcança do requerimento de recurso formulado e das respetivas alegações apresentadas pelo recorrente, a de saber se a norma resultante do artigo 179.º, n.º 1 do Código da...
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Acórdão nº 1119/13.3TXPRT-A.P1 de Tribunal da Relação do Porto, 2023-10-18
...da reclamação que o aceitou. Por outro lado, ainda quanto à invocação do art. 32º, n.º 1, e 20 da CRP escreveu-se no Acórdão do TC n.º 332/2016 , com relevo para questão posta «não se vê, mau grado o direito ao recurso consagrado no artigo 32.º, n.º 1 da Constituição, que tal norma possa se......
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