Acórdão nº 167/18 de Tribunal Constitucional (Port, 05 de Abril de 2018

Magistrado ResponsávelCons. Joana Fernandes Costa
Data da Resolução05 de Abril de 2018
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 167/2018

Processo n.º 1115/2017

3ª Secção

Relator: Conselheira Joana Fernandes Costa

Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional

I – Relatório

1. Nos presentes autos, em que é recorrente a A., S. A., e recorrida a B., S. A., foi interposto recurso, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei do Tribunal Constitucional («LTC»), (i) do acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa, em 20 de setembro de 2016, que julgou improcedente o recurso de apelação que a ora recorrente havia interposto da sentença condenatória proferida em primeira instância; (ii) do acórdão proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça, em 9 de março de 2017, que não admitiu o recurso de revista excecional interposto pela ora recorrente do acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa; e (iii) do acórdão proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça, em 25 de maio de 2017, que julgou improcedente a nulidade imputada ao acórdão precedentemente proferido e indeferiu o pedido da sua reforma quanto a custas, bem como o pedido, subsidiariamente formulado, de suprimento da respetiva nulidade.

2. Através da Decisão Sumária n.º 2/2018, decidiu-se, ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 78.º-A da LTC, não tomar conhecimento do objeto dos recursos.

Tal decisão tem a seguinte fundamentação:

«4. Conforme relatado supra, são dois os recursos de constitucionalidade interpostos no âmbito dos presentes autos: (i) o primeiro incide sobre o acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa, em 20 de setembro de 2016, que julgou improcedente o recurso de apelação interposto da sentença condenatória proferida em primeira instância; (ii) o segundo tem como objeto formal o acórdão proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça, em 9 de março de 2017, que não admitiu o recurso de revista excecional interposto do acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa, bem como o acórdão proferido por aquele Supremo Tribunal, em 25 de maio de 2017, que julgou improcedente a nulidade imputada ao acórdão precedentemente proferido e indeferiu o pedido da sua reforma quanto a custas, bem como o pedido, subsidiariamente formulado, de suprimento da respetiva nulidade.

Ambos os recursos foram interpostos ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC, norma segundo a qual cabe recurso para o Tribunal Constitucional «das decisões dos tribunais (…) que apliquem norma cuja inconstitucionalidade haja sido suscitada durante o processo».

Conforme vem sendo reiteradamente afirmado na jurisprudência deste Tribunal, os recursos interpostos no âmbito da fiscalização concreta da constitucionalidade, não obstante incidirem sobre decisões dos tribunais, têm um objeto estritamente normativo no sentido em que apenas podem visar a apreciação da conformidade constitucional de normas ou dimensões normativas.

Não incumbindo ao Tribunal Constitucional sindicar o resultado da atividade ponderativa e/ou subsuntiva própria instâncias, nem a estas se substituir na apreciação dos factos materiais da causa, na definição da correta conformação da lide e/ou na determinação da melhor interpretação do direito ordinário (cf. Acórdão n.º 466/16), os seus poderes de cognição, para além de circunscritos à questão jurídico-constitucional que lhe é colocada, apenas podem ser exercidos sobre normas jurídicas.

Contrariamente ao que sucede com a figura do recurso de amparo, o acesso à jurisdição constitucional no âmbito da fiscalização concreta, tal como perspetivado no artigo 280.º da Constituição, não se destina, pois, à sindicância “da possível e direta violação de direitos fundamentais, especificamente tutelados pela Constituição, por concretos atos ou decisões, maxime do poder jurisdicional” (cf. Carlos Lopes do Rego, Os recursos de Fiscalização Concreta na Lei e na Jurisprudência do Tribunal Constitucional, Almedina, 2010, p. 26), mas apenas do critério ou padrão normativo que lhes subjaza: conforme se escreveu no Acórdão n.º 17/2017, «o que verdadeiramente interessa para a construção de um objeto idóneo de um recurso de fiscalização concreta (…) é que se questione “[…] um juízo que o juiz há de retirar [retirou] de uma norma (isto é, […] um critério heterónomo de decisão) de que [ele, juiz] é apenas o mediador”, e não “[…] um juízo que [o juiz] há de emitir [emitiu] segundo o seu próprio critério (para o qual o legislador devolve – na grande massa das situações, até porque não pode ser de outro modo – e no qual confia)” (cfr. José Manuel M. Cardoso da Costa, “Justiça constitucional e jurisdição comum…”, cit., p. 209, nota 12)».

Constituindo embora um pressuposto central dos recursos interpostos ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC, a idoneidade do respetivo objeto, aferida pelo seu caráter necessariamente normativo, não é, todavia, o único.

Conforme igualmente salientado na jurisprudência deste Tribunal, a admissibilidade de tais recursos supõe ainda que a decisão recorrida haja feito aplicação, como sua ratio decidendi, da norma ou conjunto de normas cuja constitucionalidade é posta em causa pelo recorrente.

Trata-se de um pressuposto que decorre do caráter instrumental dos recursos de fiscalização concreta da constitucionalidade: não visando tais recursos dirimir questões meramente teóricas ou académicas, um eventual juízo de inconstitucionalidade, formulado nos termos reivindicados pelo recorrente, deverá poder “influir utilmente na decisão da questão de fundo” (cf. Acórdão n.º 169/92), o que apenas sucederá se o critério normativo cuja validade constitucional se questiona corresponder à interpretação feita pelo tribunal a quo dos preceitos legais indicados pelo recorrente, isto é, ao modo como o comando destes extraído foi efetivamente perspetivado e aplicado na composição do litígio. Por isso, quando seja requerida a apreciação da constitucionalidade de uma norma segundo uma certa interpretação, esta deverá coincidir, em termos efetivos e estreitos, com o fundamento jurídico do julgado.

Por último, é necessário que a questão de constitucionalidade enunciada no requerimento de interposição do recurso haja sido suscitada “durante o processo” e “de modo processualmente adequado perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida, em termos de este estar obrigado a dela conhecer” (cf. artigos 70.º, n.º 1, alínea b), e 72.º, n.º 2, ambos da LTC).

Conforme vem sendo igualmente afirmado por este Tribunal, a questão de constitucionalidade só se considera suscitada “durante o processo” quando o recorrente a houver enunciado perante o tribunal recorrido antes de proferida a decisão final, de modo a habilitá-lo a sobre ela exercer os respetivos poderes de cognição e, em consequência, a incluí-la no âmbito do respetivo pronunciamento.

A não verificação dos pressupostos acabados de referir impede, nos termos que seguidamente se exporão, o conhecimento do objeto de ambos os recursos de constitucionalidade interpostos nos presentes autos, relativamente à totalidade das questões suscitadas no âmbito de cada um deles.

Recurso do Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa

5. Com o recurso de constitucionalidade interposto do acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, proferido em 20 de setembro de 2016, a recorrente pretende ver reconhecida: (i) a inconstitucionalidade da interpretação extraída dos artigos 320.º, 619.º e 621.º do CPC, com o sentido de que «se forma caso julgado sobre todas as asserções constantes de uma decisão final transitada em julgado proferida noutro processo relativamente a uma parte que foi chamada a intervir nesse outro processo ainda que essas asserções não constituam a motivação nem a decisão propriamente dita», por violação do princípio do acesso ao direito e aos tribunais, constante do artigo 20.º da Constituição; e ii) a inconstitucionalidade da interpretação extraída do artigo 2.º do CPC, com o sentido «de que um Tribunal pode não conhecer uma questão que lhe foi submetida – a eficácia e validade das declarações de compensação e bem assim a determinação do montante de um crédito - por entender que a mesma depende de uma decisão a proferir por uma autoridade administrativa, não fazendo intervir essa autoridade, de maneira nenhuma, nos autos», por violação dos artigos 2.º e 20.º, n.os 1 e 4, da Constituição.

Vejamos, então, cada uma das questões assim enunciadas.

6. Conforme se viu, a recorrente reputa de inconstitucional a interpretação extraída dos artigos 320.º, 619.º e 621.º do CPC, com o sentido de que «se forma caso julgado sobre todas as asserções constantes de uma decisão final transitada em julgado proferida noutro processo relativamente a uma parte que foi chamada a intervir nesse outro processo ainda que essas asserções não constituam a motivação nem a decisão propriamente dita».

Tal como dos seus termos impressivamente resulta, a asserção em tais termos impugnada encontra-se estruturada em torno das particulares circunstâncias do caso concreto, exprimindo as incidências da situação sub judice em termos totalmente incompatíveis com a possibilidade de nela se reconhecer um qualquer critério normativo de decisão suscetível de fiscalização por parte deste Tribunal. Um tal modo de colocar a questão é, pelo contrário, revelador de que a pretensão da recorrente é apenas a de ver sindicado o acerto do ato de julgamento levado a cabo pelo Tribunal a quo, no segmento do acórdão recorrido em que considerou abrangida pelo âmbito do caso julgado formado no Processo n.º 723/20011, que correu termos no Tribunal Judicial da Maia, a dimensão do litígio concernente tanto à fixação do preço entre a (então) TMN e a (então) Optimus, como à competência da Anacon para a fixação dos preços de interligação.

A questão suscitada pela recorrente não reveste, por isso, caráter...

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