Acórdão nº 183/19 de Tribunal Constitucional (Port, 27 de Março de 2019

Magistrado ResponsávelCons. Joana Fernandes Costa
Data da Resolução27 de Março de 2019
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 183/2019

Processo n.º 60/2019

3ª Secção

Relator: Conselheira Joana Fernandes Costa

Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional

I. Relatório

1. No âmbito dos presentes autos, vindos do Supremo Tribunal de Justiça, em que é recorrente A. e recorridos os credores reconhecidos do insolvente/recorrente no processo de insolvência, foi interposto recurso, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei do Tribunal Constitucional (doravante, «LTC»), do acórdão proferido pela formação daquele Tribunal a que se refere o n.º 3 do artigo 672.º do Código de Processo Civil (doravante «CPC»), datado de 04 de Outubro de 2018, que não admitiu o recurso de revista excecional interposto do acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, datado de 10 de julho de 2018.

2. Através da Decisão Sumária n.º 104/2019, decidiu-se, ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 78.º-A da LTC, não tomar conhecimento do objeto do recurso.

Tal decisão tem a seguinte fundamentação:

«II. Fundamentação

9. O recurso interposto no âmbito dos presentes autos funda-se na previsão da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC, norma segundo a qual cabe recurso para o Tribunal Constitucional «das decisões dos tribunais (…) que apliquem norma cuja inconstitucionalidade haja sido suscitada durante o processo».

Considerando o modo como o recorrente definiu o objeto do presente recurso — isto é, por remissão para a questão de constitucionalidade suscitada no âmbito da reclamação apresentada junto do Supremo Tribunal de Justiça, em 11 de outubro de 2018 —, verifica-se que o mesmo se reporta à norma extraída da alínea b) do n.º 1 do artigo 672.º do CPC, de acordo com a qual cabe, excecionalmente, recurso de revista do acórdão da Relação referido no n.º 3 do artigo anterior (que confirme, sem voto de vencido e sem fundamentação essencialmente diferente, a decisão proferida na 1ª instância) quando estejam em causa interesses de particular relevância social.

Embora o recorrente não identifique a decisão de que interpõe o presente recurso — referindo-se somente à «decisão proferida por este Supremo Tribunal de Justiça que tacitamente decidiu julgar conformes com o texto constitucional a norma constante do artigo 672, nº 1, b) do CPC do Código de Processo Civil, na forma como foi interpretada pelo referido Tribunal» —, o certo é que, conforme passará a demonstrar-se, os respetivos pressupostos de admissibilidade não se mostram preenchidos nem em relação ao acórdão datado de 04 de outubro de 2018, que rejeitou o recurso de revista excecional, nem relativamente ao acórdão proferido em 22 de novembro de 2018, que indeferiu a reclamação apresentada relativamente àquele primeiro aresto.

10. Por força do disposto no n.º 2 do artigo 72.º da LTC, constitui pressuposto de admissibilidade dos recursos interpostos ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do respetivo artigo 70.º que a questão de constitucionalidade enunciada no requerimento de interposição do recurso haja sido suscitada «durante o processo» e «de modo processualmente adequado perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida, em termos de este estar obrigado a dela conhecer» (cf. artigos 70.º, n.º 1, alínea b), e 72.º, n.º 2, ambos da LTC). Para além de vincular o recorrente à antecipação da questão de constitucionalidade ulteriormente enunciada no requerimento de interposição do recurso, exigindo-lhe que a defina antes de esgotado o poder jurisdicional da instância recorrida, o requisito da suscitação atempada tem uma evidente dimensão formal, impondo ao recorrente um ónus de delimitação e especificação, perante o tribunal a quo, do objeto do recurso.

A suscitação prévia e adequada da questão de inconstitucionalidade perante o tribunal recorrido «em termos de este estar obrigado a dela conhecer» (n.º 2 do artigo 72.º LTC), «visa facultar a reapreciação de uma questão julgada pelas instâncias e não a apreciação pelo Tribunal Constitucional de uma questão nova que não fora suscitada atempadamente perante o tribunal recorrido» (Miguel Teixeira de Sousa, “Legitimidade e interesse no recurso de fiscalização concreta da constitucionalidade”, Estudos em Homenagem ao Prof. Doutor Armando M. Marques Guedes, Almedina, 2004, pp. 947 e ss.).

Por essa razão, é jurisprudência constante do Tribunal Constitucional não ser a arguição de nulidade do acórdão o momento atempado a suscitar, pela primeira vez, uma questão de constitucionalidade, salvo no que tange ao regime relativo ao objeto e aos pressupostos do próprio incidente pós-decisório (cf., entre muitos, Acórdãos 155/2000, 142/2001, 300/2002, 381/2002, 443/2002, 394/2005, 533/2007 e 55/2008).

Ora, compulsados os autos, com referência às conclusões formuladas no recurso de revista excecional interposto do acórdão da Relação de Guimarães, acima transcritas — que, nos termos prescritos no n.º 4 do artigo 635.º do CPC, delimitam o objeto do recurso —, verifica-se que o recorrente não enunciou, naquele momento processual, qualquer questão de constitucionalidade respeitante à alínea b) do n.º 1 do artigo 672.º do CPC. Como, aliás, reconhece no requerimento de interposição, o recorrente apenas enunciou a questão de constitucionalidade que integra o objeto do presente recurso depois de proferida a decisão que, na formação em que se refere o n.º 3 do artigo 672.º do CPC, rejeitou o recurso de revista excecional interposto do acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Guimarães.

Atentos os concretos contornos processuais elencados supra, não se verifica, além do mais, qualquer fundamento para considerar o recorrente dispensado do ónus de suscitação prévia da questão de constitucionalidade, uma vez que a decisão recorrida em caso algum pode ser qualificada como “decisão-surpresa”, para aqueles efeitos. Têm sido repetidamente assinaladas na jurisprudência constitucional, as condições para que assim seja. Nas...

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