Acórdão nº 320/19 de Tribunal Constitucional (Port, 29 de Maio de 2019

Magistrado ResponsávelCons. Fernando Vaz Ventura
Data da Resolução29 de Maio de 2019
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 320/2019

Processo n.º 47/19

2.ª Secção

Relator: Conselheiro Fernando Ventura

Acordam, em conferência, na 2.ª secção do Tribunal Constitucional

I. Relatório

1. A recorrente A., ao abrigo do disposto no n.º 3 do artigo 78.º-A Lei de Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional (Lei n.º 28/82, de 15 de novembro, doravante LTC), deduziu reclamação para a Conferência da Decisão Sumária n.º 245/2019, que decidiu não conhecer do recurso pela mesma interposto para o Tribunal Constitucional.

2. Releva para a apreciação da reclamação que o recurso interposto é incidente de oposição à execução fiscal, deduzida pela aqui recorrente e outro, que corre termos no Serviço de Finanças da Amadora, para cobrança de dívida à B., S.A., na qual figura como exequente a Fazenda Pública. Por sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, em 22 de maio de 2017, foi decidido absolver parcialmente a Fazenda Pública da instância, quanto aos pedidos de declaração de nulidade da citação no processo de execução fiscal e de cancelamento da penhora, e, ainda, julgar procedente a exceção perentória de caducidade do direito de ação, absolvendo, em consequência, a Fazenda Publica do pedido de extinção do processo de execução fiscal.

Inconformada, a recorrente interpôs recurso para o Supremo Tribunal Administrativo, o qual, por acórdão proferido em 28 de fevereiro de 2018, negou provimento ao recurso e confirmou a sentença recorrida.

Veio então a recorrente interpor recurso, com fundamento em oposição de julgados, ao abrigo do artigo 284.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, e arguir a nulidade do acórdão. Por acórdão de 20 de junho de 2018, o Supremo Tribunal Administrativo decidiu indeferir a arguida nulidade.

3. Inconformada, a recorrente interpôs recurso para o Tribunal Constitucional, através de requerimento onde inscreve o seguinte:

«[S]em prejuízo do requerimento apresentado, em 13.03.2018, nos termos e para os efeitos do disposto no art. 284º do CPPT, cujo interesse mantém e teor se reitera e cuja admissão se requer, tendo sido notificada do acórdão proferido, e com o mesmo não se conformando, vem (…) do mesmo interpor recurso para o Tribunal Constitucional (…).

O recurso que a Recorrente interpõe, perante o Colendo Tribunal Constitucional. Nos termos e ao abrigo do disposto nas als. b) e f) do n.º 1 do art. 70º da LTC, visa a fiscalização concreta da (in)constitucionalidade decorrente da aplicação e da interpretação das normas contidas nos arts. 203°, nº 1, al. b) e n° 3, 98°, n°4, 97º, nº 1, 113°, n° 1, 120°, 121°, 122°, 123°, n° 1, 125°, n° 1, 151°, n° 1 e 278°, n°3, todos do CPPT, nos arts. 97°, n° 3, 101°, al. d) e 103°, n°2, lodos da LGT, nos arts. 3º, n°3, 193°, 195°, 579°, 615° e 620º, todos do CPC, ex vi art. 2°, al. e) do CPPT, art. 9°, 303° e 333°, todos do CC e art. 2°, 20°, n°4 e 5, 202°, n° 1 e 205° n° 1, todos da CRP (…).

Concretamente, (…) no entendimento da Recorrente, e salvo o devido respeito por melhor opinião, a decisão recorrida procedeu, em manifesto prejuízo para aquela e nessa medida, em flagrante violação e/ou interpretação e aplicação ilegal e inconstitucional dos preceitos legais supra referidos, à:

a) Aplicação e interpretação inconstitucional e ilegal, por violação do art. 20°, n° 4 da CRP, do art. 3°, n° 3 do CPC. no sentido plasmado na sentença proferida em 1.ª Instância e confirmada pelo Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de que “revela-se manifestamente desnecessário conferir aos Oponentes a possibilidade de se pronunciarem sobre a referida exceção dilatória já que, em bom rigor a solução a conferir à oposição resulta expressamente e de forma absolutamente incontroversa do teor das disposições legais aplicáveis e da jurisprudência e doutrina que, de forma incontestada, se pronunciou sobre a matéria, donde a notificação dos oponentes para exercício do contraditório sobre esta matéria afigurar-se-ia um ato espúrio e dilatório da prolação de decisão final do litígio, destituído de utilidade efetiva para a defesa da sua pretensão jurídico-subjetiva.”, na medida em que não pode o Tribunal afastar a aplicação do principio do contraditório, cuja previsão emana da própria Lei Fundamental, cfr. art. 20°, n° 4 da CRP e proferir uma “decisão surpresa”, porquanto, na estruturação de um processo justo o Tribunal deve prevenir e, na medida do possível, obviar a que os pleiteantes sejam surpreendidos com decisões para as quais as suas exposições, factuais e jurídicas, não foram tomadas em consideração.

b) Aplicação e interpretação inconstitucional e ilegal, por violação dos arts. 2° e 205°, n° 1, ambos da CRP, do art.° 620° do CPC, que deve ser julgada inconstitucional quando interpretada no sentido de que “O Juiz não está vinculado às decisões proferidas nos respetivos processos, mesmo sobre aspetos de natureza adjetiva, podendo sobre uma mesma questão e ao abrigo de um mesmo preceito legal, tomar uma decisão e posteriormente outra, em sentido absolutamente diverso.”, na medida em que ao julgar procedente a exceção de caducidade do direito de oposição, quando já havia sido proferida decisão, transitada em julgado, que, admitiu liminarmente a oposição à execução, e nessa medida, necessariamente decidiu da tempestividade da mesma, por força do disposto no ad. 209°, n° i, ai. a) do CPPT, incorre a decisão em apreço na violação do caso julgado, na violação dos principias da confiança e da segurança jurídica, pilares fundamentais do Estado de Direito Democrático, e que implicam um mínimo de certeza e segurança nos direitos das pessoas e nas expectativas juridicamente criadas a que está imanente uma ideia de proteção da confiança dos cidadãos e da comunidade na ordem jurídica e na atuação do Estado e cuja violação se concretiza quando haja uma afetação inadmissível, arbitrária ou demasiadamente onerosa de expectativas legitimamente fundadas dos cidadãos (Acórdãos do Tribunal Constitucional n.os 287/90, 303/90, 625/98, 634/98, 186/2009, disponíveis em www.tribunalconstítucional.pt)

c) Aplicação e interpretação inconstitucional e ilegal da al. b) n° 1 e n° 3 do art. 203° e als. a), c), e), f), g), h) e i) do n° 1 do ad. 204°, ambos do CPPT, quando interpretada no sentido de que “o alegado conhecimento da realização de nova penhora sobre o mesmo imóvel, não constitui citação no processo de execução fiscal, nem pode operar como termo inicial do prazo processual de interposição do presente meio processual” conforme plasmado na sentença proferida em 1ª Instância e confirmada pelo Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo.

d) Aplicação e interpretação inconstitucional e ilegal dos arts. 97°, n°3. art. 101°, n° 1 al. d), e art. 103°, n°2, todos da LGT, art. 98º, n°4 do CPPT e art. 193°, n° 3 do CPC, por violação dos arts. 20°, n° 4 e 202°, n° 1, ambos da CRP, quando interpretadas no sentido de que ‘tendo os oponentes formulado pedidos próprios de dois outros e distintos meios processuais, não cabe ao tribunal decidir, em nome dos Oponentes, qual dos dois deveria prosseguir”, conforme plasmado na sentença proferida em 1ª Instância, a qual foi confirmada pelo Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo.

e) Aplicação e interpretação inconstitucional e ilegal do art. 113°, n° 1 do CPPT, na medida em que, ao dispensar a realização da prova requerida, quer testemunhal, quer documental, o Tribunal impediu a necessária produção de prova sobre factos essenciais alegados pela Recorrente e que se mostravam de suma importância para a decisão da causa, e, o juízo de que os factos que pudessem vir a ser provados com base nos depoimentos das testemunhas, já se mostrarem provados por documentos, é, no mínimo, precipitada e infundada, sendo a sua fundamentação contraditória, cfr. sentença de 1ª Instância: “Tendo em conta a prova documental junta aos autos e o teor do processo de execução fiscal, afigura-se desnecessária a abertura de um período de produção de prova, já que todos os factos relevantes para a decisão a proferir no presente processo poderiam, virtualmente, ser apurados com base na audição das testemunhas arroladas pelo Representante da Fazenda Pública e pelos Oponentes resultam já provados face aos elementos de prova constantes dos autos.” Tal entendimento choca e viola a lei, mormente os arts. 20º, n° 4 e 5 e 202° da CRP.

f) Aplicação e interpretação ilegal do disposto no art. 120° do CPPT, na medida em que, não se mostra previsto em qualquer preceito legal a dispensa de apresentações de alegações, sequer mesmo sendo dispensada a produção de prova, e, ao interpretar e aplicar como o fez, o Tribunal violou o art. 9º do Código Civil, o principio ubi lex non distinguir nec nos distinguere debemus e o preceito que expressamente prevê a apresentação de alegações cfr. art. 120° do CPPT, o que constitui nulidade. cfr. art. 195°, n° 1 do CPC e 98°, n° 3 do CPPT, cfr...

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