Acórdão nº 423/19 de Tribunal Constitucional (Port, 10 de Julho de 2019

Magistrado ResponsávelCons. Gonçalo Almeida Ribeiro
Data da Resolução10 de Julho de 2019
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 423/2019

Processo n.º 326/2019

3ª Secção

Relator: Conselheiro Gonçalo de Almeida Ribeiro

Acordam, em conferência, na 3ª secção do Tribunal Constitucional

I. Relatório

1. Nos presentes autos, vindos do Tribunal da Relação de Évora, em que é recorrente A. e recorrido o Ministério Público e B., S.A. foi interposto o presente recurso, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (Lei do Tribunal Constitucional, referida adiante pela sigla «LTC»), do acórdão daquele tribunal, de 5 de fevereiro de 2019.

2. Pela Decisão Sumária n.º 345/2019, decidiu-se, ao abrigo do disposto no artigo 78.º-A, n.º 1, da LTC, não tomar conhecimento do objeto do recurso interposto. Tal decisão tem a seguinte fundamentação:

«4. Segundo o disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 280.º, da Constituição, e na alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º, da LTC, cabe recurso para o Tribunal Constitucional das decisões dos tribunais que apliquem norma cuja inconstitucionalidade haja sido suscitada durante o processo, «identificando-se assim, o conceito de norma jurídica como elemento definidor do objeto do recurso de constitucionalidade, pelo que apenas as normas e não já as decisões judiciais podem constituir objeto de tal recurso» (v. Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 361/98).

O recorrente invoca determinada inconstitucionalidade reportada ao artigo 50.º do Código Penal, remetendo para o que escrevera nas conclusões 1, 24, 25, 27 e 31 do recurso interposto para o Tribunal da Relação de Évora. Pese embora a irregularidade deste procedimento – já que o artigo 75.º-A, n.os 1 e 2, da LTC, impõe que o recorrente indique expressamente no requerimento de interposição do recurso qual a norma cuja constitucionalidade pretende ver apreciada, sendo que só a indicação da peça processual onde o recorrente tenha suscitado a questão de inconstitucionalidade se faz por remissão –, o certo é que, ultrapassada tal dificuldade, impõe-se concluir que nessa motivação do recurso interposto para o Tribunal da Relação não só não se encontra a suscitação da inconstitucionalidade de uma qualquer norma, como se verifica que o arguido apenas invocou a nulidade da sentença por falta de fundamentação no que diz respeito à questão da suspensão ou não da pena de prisão, bem como por violação do princípio do in dubio pro reo, do princípio da proporcionalidade da pena e da humanidade.

Este enquadramento demonstra que o recorrente pretende questionar a conformidade jurídica da concreta da pena que lhe foi aplicada, na vertente da não suspensão da execução da pena de prisão. Com efeito, o recorrente contesta que os factos dados como provados permitam sustentar a conclusão de que a simples censura do facto e a ameaça de cumprimento efetivo da mesma não são, in casu, suficientes para realizar adequadamente as finalidades de prevenção.

Em suma, o recorrente pretende sindicar a constitucionalidade da própria decisão recorrida e não de qualquer normal legal por aquela aplicada. De resto, a determinação da medida concreta da pena, sujeita aos princípios da culpa e da proporcionalidade, situa-se necessariamente no domínio reservado ao exercício da função jurisdicional, pelo que não constitui objeto idóneo de recurso para o Tribunal Constitucional (v., neste sentido, entre muitos outros, os Acórdãos n.ºs 303/02 e 633/08). Como se escreveu no Acórdão n.º 695/2016: «o sistema português de controlo da constitucionalidade normativa assenta na ideia de que a jurisdição constitucional deve ser o juiz das normas e não o juiz dos juízes. O papel do Tribunal Constitucional na arquitetura da nossa democracia constitucional é o de controlar a atuação do legislador e dos seus sucedâneos; os erros judiciais são corrigidos através do regime de recursos próprio da ordem jurisdicional a que as decisões pertencem.».

5. O recorrente pretende também a apreciação da constitucionalidade de determinada norma reportada ao artigo 74.º do Código de Processo Penal, apresentando assim a questão: «O recorrente sustenta a falta de legitimidade da assistente B., S.A. que desenvolveu um conjunto turístico denominado …, também conhecido por …., Albufeira, que integra diversos empreendimentos e equipamentos turísticos, nomeadamente um hotel, um aldeamento turístico e apartamentos turísticos, que em conjunto compõem o condomínio conjunto turístico …, de que a assistente é condómina maioritária. No caso “Sub Júdice” houve preterição do litisconsórcio necessário ativo, pois deviam intervir todos os condóminos, sem prejuízo de poderem ser representados em juízo pelo administrador ou pessoa mandatada».

É claro que o recorrente centra a sua discordância do acórdão recorrido ao nível da violação da lei ordinária e não ao nível da inconstitucionalidade da lei. Ao afirmar que houve preterição de litisconsórcio necessário ativo e que, por isso, a sociedade assistente é parte ilegítima no que concerne à instância cível enxertada, o recorrente demonstra que, na sua ótica, o que está aqui em causa é apenas a violação do artigo 74.º do Código de Processo Penal e não qualquer questão de inconstitucionalidade normativa. Quando muito, poderá estar em causa a inconstitucionalidade da própria decisão judicial, por não ter aplicado, ou por ter aplicado incorretamente, normas legais que dão cumprimento a imperativos constitucionais.

A omissão destes pressupostos processuais obsta ao conhecimento do objeto do recurso, justificando-se a prolação da presente decisão sumária, segundo o previsto no artigo 78.º-A, n.º 1, da LTC.»

3. De tal Decisão Sumária vem agora o recorrente reclamar para a conferência, ao abrigo do disposto no n.º 3 do artigo 78.º-A da LTC, invocando as seguintes razões:

«A., recorrente, tendo sido notificado da decisão sumária nº 345/2019, proferida ao abrigo do artº 78º-A, nº 1, da Lei nº 28/82, de 15 de novembro/LTC, a fls...., que decidiu:

a) Não tomar conhecimento do objeto do presente recurso; e,

b) Condenar o recorrente em custas, fixadas em 7 UCs,

Mas, porque é possível adquirir decisão diversa, não se conforma, respeitosamente com esse, aliás, sábio entendimento sumário, apoiando-se noutra perspetiva jurídica adiante apresentada, e de harmonia com as normas do artº 78º-A, nº 3, da LTC, artº 652º, nº 3 do NCPC/2013 e ainda dos artºs 280º e 282º, da Lei Fundamental, porfiando ultrapassar o imediatismo dessa resolução negativa a atingir a aproximação plausível e expectável à queixa constitucional alemã ou ao recurso de amparo espanhol,

VEM RECLAMAR PARA A CONFERÊNCIA

Com indicação dos fundamentos porque pede a alteração ou revogação/anulação da decisão sumária ora em crise e, para tal expede, em contraponto, as seguintes razões motivadoras de discordância quanto ao que foi decidido, na base de uma nova visão ou segunda opinião, na modesta opinião do recorrente, mais substancial.

I – A Reforma da Justiça Constitucional e urgente.

O acesso ao Direito Constitucional não pode ser uma miragem constitucional escolástica ou uma imagem invertida em que sobressaia uma ilusão para o cidadão.

Ao invés, a garantia de acesso ao Tribunal Constitucional deve ser uma realidade palpável, no sentido de a norma do artº 20º da CRP ser um autêntico miradouro da tutela jurisdicional efetiva, em que resplandeça o princípio pró-recursivo que conduz ao conhecimento da questão de fundo e à proibição dos excessos, como decorre imperativamente do artº 18º, nº 2, da Lei Fundamental.

Os “não conhecimentos” criam um ambiente de desalento recursivo, impondo-se uma alternativa de ânimo constitucional.

II – O requerimento de recurso constitucional é idóneo. Foi mobilizada a alínea b) do nº 1 do artº 70º, da LTC, reportada ao artº 50º do CP e ao artº 74º, do CPP. Verifica-se o cumprimento cabal dos pressupostos processuais

Foi interposto o vertente recurso de inconstitucionalidade, mediante requerimento apresentado no Tribunal da Relação de Évora, que não sentiu qualquer necessidade de formular convite de aperfeiçoamento, porquanto a pretensão constitucional não enfermava de qualquer deficiência.

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