Acórdão nº 440/19 de Tribunal Constitucional (Port, 15 de Julho de 2019

Magistrado ResponsávelCons. Lino Rodrigues Ribeiro
Data da Resolução15 de Julho de 2019
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 440/2019

Processo n.º 74/18

3.ª Secção

Relator: Conselheiro Lino Rodrigues Ribeiro

Acordam, na 3.ª Secção do Tribunal Constitucional

I – Relatório

1. Nos presentes autos, em que é recorrente o Ministério Público e recorrida A., o primeiro veio interpor recurso de constitucionalidade ao abrigo da alínea a) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro, na sua redação atual (Lei do Tribunal Constitucional, adiante designada LTC), de sentença proferida pelo Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa, no âmbito de ação declarativa sob a forma de processo comum, proposta pela ora recorrida contra os proprietários do imóvel destinado a habitação, de que é arrendatária desde 1 de junho de 1966.

Os proprietários do imóvel comunicaram à arrendatária, em janeiro de 2013, a intenção de submeter o contrato ao Novo Regime de Arrendamento Urbano (adiante designado «NRAU») e de proceder à atualização da renda (conforme previsto no artigo 30.º do NRAU, aprovado pela Lei n.º 6/2006, de 27 de fevereiro, na redação que lhe foi conferida pela Lei n.º 31/2012, de 14 de agosto, vigente à data). A ora recorrida respondeu, por carta registada expedida no mesmo mês, opondo à intenção do senhorio a sua idade, superior a 65 anos, e a circunstância de o seu agregado familiar dispor de um rendimento anual bruto corrigido (RABC) inferior a cinco retribuições mínimas nacionais anuais (RMNA). A comprovação da alegação relativa ao nível de rendimentos do agregado familiar foi feita nos termos legalmente previstos (cf. o artigo 32.º do NRAU), tendo sido emitido pelos serviços competentes, em 15 de julho de 2013, documento comprovativo do RABC de 2012, com a menção de que a declaração seria válida por um ano, «devendo ser requerida nova emissão de documento comprovativo do valor RABC do seu agregado familiar dentro deste prazo (…).»

Em maio de 2014, os proprietários do imóvel enviaram nova comunicação à arrendatária, informando que a partir do mês de julho se procederia à atualização do valor da renda, tendo por referência o limite máximo de 1/15 do valor do locado (ex vi da alínea a) do n.º 2 do artigo 35.º do NRAU), uma vez que a arrendatária já não poderia prevalecer-se da circunstância de o agregado familiar deter um RABC inferior a cinco RMNA. Segundo os proprietários, tal seria a consequência de não ter sido apresentada nova prova anual da alegação relativa ao RABC do agregado familiar até ao fim de janeiro de 2014, nos termos previstos no n.º 5 do artigo 35.º do NRAU.

Inconformada, a arrendatária recorreu ao Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa que julgou parcialmente procedente a ação proposta pela ora recorrida e decidiu «não aplicar, por inconstitucionalidade material por violação do princípio da proporcionalidade ínsito no artigo 2.º da Constituição da República Portuguesa, a norma extraída dos artigos 36.º, n.º 7, al. c) e 35.º. n.º 5, do NRAU (…), segundo a qual os arrendatários com idade igual ou superior a 65 anos, beneficiários de renda atualizada atenuada nos termos dos n.os 2 e 3 do artigo 35.º do NRAU, que no mês correspondente àquele em que foi invocada a circunstância em que assentou esse benefício, e pela mesma forma, não fizerem prova anual do seu rendimento perante o senhorio, ficam automaticamente impedidos de poderem prevalecer-se da mencionada circunstância, mesmo que não tenham sido previamente alertados pelos senhorios para a necessidade de fazerem a aludida prova».

2. O Ministério Público interpôs recurso desta decisão, ao abrigo do artigo 70.º, n.º 1, alínea a), da LTC (cf. fls. 284-285).

3. Notificado para alegar, o recorrente apresentou as seguintes conclusões (cf. fls. 315-316):

«3. Conclusão

1 – Constitui objeto do recurso a questão de constitucionalidade da norma extraída dos artigos 36.º, n.º 7, al. c) e 35.º, n.º 5, do Novo Regime do Arrendamento Urbano, aprovado pela lei nº 6/2006, de 27 de fevereiro, (NRAU), na redação introduzida pela Lei n.º 31/2012 de 14 de agosto, retificada pela Declaração de Retificação n.º 59-A/2012, de 12 de outubro, segundo a qual os arrendatários com idade igual ou superior a 65 anos, beneficiários de renda atualizada atenuada nos termos dos nºs 2 e 3 do artigo 35.º do NRAU, que no mês correspondente àquele em que foi invocada a circunstância em que assentou esse benefício, e pela mesma forma, não fizerem prova anual do seu rendimento perante o senhorio, ficam automaticamente impedidos de poderem prevalecer-se da mencionada circunstância, mesmo que não tenham sido previamente alertados pelos senhorios para a necessidade de fazerem a aludida prova.

2 – Beneficiando o arrendatário de renda atualizada nos termos do artigo 35.º, n.ºs 2 e 3 do NRAU, se não fizer a prova anual do seu rendimento perante o senhorio, no mês correspondente àquele em que foi invocada a circunstância na qual assentou o benefício, a consequência é ter de pagar uma renda, não atenuada, até à apresentação dessa prova.

3 – Assim, diferentemente do que ocorria na situação apreciada pelo Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 277/2016, está-se perante uma consequência não excessivamente gravosa para o arrendatário, justificando-se ainda a existência desse ónus, cujo cumprimento não se revela especialmente oneroso.

4 – A comprovação da situação económica do arrendatário para poder beneficiar da renda atenuada tem de ser feita mediante a apresentação ao senhorio de documento comprovativo, emitido pelo serviço de finanças competente, do qual conste o valor do rendimento anual bruto corrigido (RABC) do seu agregado familiar.

5 – Assim, estando a apresentação daquele documento dependente da sua emissão por parte da repartição de finanças competente, o mesmo pode não ser atempadamente apresentado, por razões que não sejam imputáveis ao arrendatário.

6 – Nessa medida, a norma que constitui objeto do recurso é inconstitucional, por violação do artigo 2.º da Constituição.

7 – Termos em que deve ser negado provimento ao recurso.»

4. Embora notificada para esse efeito, a recorrida não apresentou contra-alegações.

Cumpre apreciar e decidir.

II – Fundamentação

5. A título prévio, impõe-se delimitar com precisão o objeto do presente recurso, identificado pelo recorrente com a norma segundo a qual «os arrendatários com idade igual ou superior a 65 anos, beneficiários de renda atualizada atenuada nos termos dos n.os 2 e 3 do artigo 35.º do NRAU, que no mês correspondente àquele em que foi invocada a circunstância em que assentou esse benefício, e pela mesma forma, não fizerem prova anual do seu rendimento perante o senhorio, ficam automaticamente impedidos de poderem prevalecer-se da mencionada circunstância, mesmo que não tenham sido previamente alertados pelos senhorios para a necessidade de fazerem a aludida prova».

5.1. Trata-se de uma interpretação normativa extraída pelo tribunal a quo da alínea c) do n.º 7 do artigo 36.º e do n.º 5 do artigo 35.º do NRAU, aprovado pela Lei n.º 6/2006, de 27 de fevereiro, na redação que lhe foi conferida pela Lei n.º 31/2012, de 14 de agosto (retificada pela Declaração de Retificação n.º 59-A/2012, de 12 de outubro), cuja redação é a seguinte:

«Artigo 35.º

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