Acórdão nº 496/19 de Tribunal Constitucional (Port, 26 de Setembro de 2019

Magistrado ResponsávelCons. Gonçalo Almeida Ribeiro
Data da Resolução26 de Setembro de 2019
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 496/2019

Processo n.º 951/2018

3ª Secção

Relator: Conselheiro Gonçalo de Almeida Ribeiro

Acordam, em conferência, na 3ª secção do Tribunal Constitucional

I. Relatório

1. Nos presentes autos, vindos do Tribunal da Relação de Lisboa, em que é recorrente A. e recorridos o Ministério Público e outros, foi interposto recurso de constitucionalidade, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (Lei do Tribunal Constitucional, referida adiante pela sigla «LTC»), do acórdão daquele Tribunal, de 2 de novembro de 2017.

2. Pela Decisão Sumária n.º 814/2018, decidiu-se, ao abrigo do disposto no artigo 78.º-A, n.º 1, da LTC, não tomar conhecimento do objeto do recurso interposto, com fundamento na não definitividade da decisão recorrida e na falta de idoneidade do objeto do recurso.

3. Tal Decisão Sumária veio a ser confirmada pela conferência, através do Acórdão n.º 165/2019, na sequência de reclamação apresentada pelo recorrente, nos termos do artigo 78.º-A, n.º 3, da LTC.

4. Inconformado, o recorrente apresentou então requerimento, onde arguiu a nulidade do Acórdão n.º 165/2019

O mesmo veio a ser indeferido através do Acórdão n.º 305/2019, no qual se afirmou o seguinte:

«7. O recorrente invoca agora a nulidade do Acórdão n.º 165/2019, com fundamento na alínea d) do n.º 1 do artigo 615.º do Código de Processo Civil.

Dispõe tal preceito, aplicável nos autos ex vi do disposto no artigo 666.º, n.º 1, do Código de Processo Civil e no artigo 69.º da LTC, que são nulos os acórdãos quando «o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento».

O recorrente não identifica no Acórdão n.º 165/2019 qualquer omissão ou excesso de pronúncia, as causas de nulidade previstas na disposição que invoca. Lê-se no requerimento ora apresentado: «considera o requerente que a referida formulação [o enunciado do objeto do recurso que consta da reclamação] se encontra devidamente mencionada no requerimento de interposição do recurso…». O recorrente limita-se, assim, a exprimir o seu desacordo em relação a determinado segmento do aresto impugnado e a formular a pretensão de que o recurso de constitucionalidade seja admitido.

Trata-se de uma pretensão insustentável e inadmissível.

Insustentável, por um lado, porque o recorrente contesta apenas o fundamento subsidiário – e, em bom rigor, apenas um dos dois argumentos que o suportam − da decisão de não admitir o recurso de constitucionalidade, qual seja a falta de idoneidade do objeto; soma-se-lhe o fundamento principal, a falta de definitividade da decisão recorrida. Assim, ainda que se reconhecesse ao recorrente razão no que agora afirma, nunca daí se seguiria a conclusão de que o recurso deveria ter-se por admissível, atenta a subsistência da razão principal para o não conhecimento do respetivo objeto.

Inadmissível, por outro lado, porque o presente incidente tem natureza pós-decisória, destinando-se unicamente à verificação de eventuais nulidades da decisão recorrida e não ao reexame da questão sobre a qual incidiu. Na verdade, o poder jurisdicional do Tribunal Constitucional quanto à questão da admissibilidade do recurso de constitucionalidade esgotou-se com a prolação do Acórdão n.º 165/2019, pelo que o recorrente não pode provocar nova pronúncia jurisdicional sobre essa matéria. E não se vislumbrando no requerimento de arguição de nulidade argumento algum tendente a demonstrar a verificação de alguma das causas de nulidade previstas na alínea d) do n.º 1 do artigo 615.º do Código de Processo Civil, cabe indeferir a pretensão.»

5. Notificado de tal aresto, o recorrente apresentou novo requerimento, com o seguinte teor:

«Tendo este Tribunal proferido o mui douto Acórdão 305/2019 de 29 de maio de 2019, onde se indefere o pedido do recorrente A., melhor identificado nos autos, vem este dirigir-se respeitosamente ao Sr. Dr. Juiz-Conselheiro Relator do Tribunal Constitucional requerendo a V. Exa. a

REFORMA DA SENTENÇA

nos termos da alínea b) do número 2 do Artigo 669º do Código do Processo Civil com a redação aprovada pelo Decreto-Lei nº 303/2007 de 24 de agosto ex vi artº 4º do Código do Processo Penal, e Artº 380º do Código do Processo Penal, o que faz nos seguintes termos:

DO RECONHECIMENTO EM JULGAMENTO E MEIOS DE PROVA

Foi o arguido condenado, em sede de primeira instância, com base em prova exclusivamente testemunhal, já que não foi apurado qualquer evidência de culpa que não a resultante das escassas testemunhas que em tribunal identificaram o ora recorrente.

Dentre cerca de sessenta pessoas que não o identificaram, o recorrente foi identificado por duas pessoas, que, alegadamente, o teriam visto presencialmente apenas por cerca de dez minutos e seis anos antes do julgamento em que testemunharam

As testemunhas que identificaram o arguido, srs. Carlos Nuno da Rocha Pires e Hugo Daniel Alves Rendeiro -não pode o arguido deixar de usar aqui a expressão curiosamente - representam duas das entidades assistentes neste processo, Seguradora Metlife e Banco Popular, que mais terão sido lesadas pelas atividades criminosas ao arguido imputadas.

Ora esta prova testemunhal dos representantes das empresas lesadas, sem observância das formalidades referidas no Artigo 147º do CPP, não deveria ter sido valorizada como meio de prova, não podia ter sido atendido nem considerado, e não podia o tribunal a quo tê-la feito repercutir na decisão da matéria de facto.

Ademais, é de relevar o facto de que a ambas as testemunhas mencionadas ter sido perguntado se conheciam o arguido imediatamente depois de a elas ser mostrada uma foto em tamanho A4 do mesmo e estando apenas dois arguidos na Sala de Audiência e de idades bem distintas um do outro.

A testemunha Hugo Daniel Alves Rendeiro, ouvida a 28 de Setembro de 2016 em sede de audiência, seis anos após os factos sobre os quais depõe, foi convidada pelo tribunal identificar a foto de face do ora requerente que lhe foi mostrada, foto de folhas 2592, ao que a testemunha correspondeu dizendo ser essa a pessoa que alegadamente esteve no balcão do Banco Popular, onde trabalha, (Gravado conforme a ata da Audiência 29-09-2016 dia 28-09-2016 com início pelas 11:45:36, ficheiro 20160928114530_17862661_2871146.wma, minutos 11:30 e seguintes).

Ato contínuo o tribunal convida a testemunha a olhar para os dois arguidos, o ora recorrente na altura com 45 anos de idade e o outro arguido, António Godinho, na casa dos 70 anos de idade, e identificar se era a pessoa na foto, o que a testemunha fez dizendo “confirmo que é aquela pessoa” apontando para o ora recorrente (minutos 11:57 a 12:28 do mesmo ficheiro 0160928114530_17862661_2871146.wma).

Perante uma extemporânea exclamação do arguido que mencionou que depois de se mostrar uma foto sua é fácil identificá-lo no referido contexto, o Meritíssimo Juiz Presidente adverte-o (mesmo ficheiro 20160928114530_17862661_2871146.wma, minuto 12:35 a 12:43) de que, sic, “o reconhecimento como agora foi feito não é cabal”.

Ora esta ação e consequente afirmação do Meritíssimo Sr. Doutor Juiz Presidente em sede de audiência colidiu frontalmente com o disposto no número 2 do Artº 147º do CPP, que se reproduz com sublinhado nosso: “Se a identificação não for cabal, afasta- se quem dever proceder a ela e chamam se pelo menos duas pessoas que apresentem as maiores semelhanças possíveis, inclusive de...

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