Acórdão nº 104/21 de Tribunal Constitucional (Port, 04 de Fevereiro de 2021

Magistrado ResponsávelCons. Pedro Machete
Data da Resolução04 de Fevereiro de 2021
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 104/2021

Processo n.º 1115/20

2.ª Secção

Relator: Conselheiro Pedro Machete

Acordam, em conferência, na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional:

I. Relatório

1. A., reclamante nos presentes autos, em que é reclamado o Ministério Público, notificado da Decisão Sumária n.º 45/2021, que não conheceu do objeto do recurso de constitucionalidade por aquele interposto, vem reclamar para a conferência ao abrigo do disposto no artigo 78.º-A, n.º 3, da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (Lei do Tribunal Constitucional – “LTC”).

O recorrente, ora reclamante, interpôs recurso para o Tribunal da Relação do Porto do despacho proferido em 1.ª instância no qual se decidiu declará-lo contumaz. O Tribunal da Relação do Porto, por acórdão de 4 de novembro de 2020, decidiu negar provimento ao recurso e confirmar o despacho recorrido.

Deste acórdão recorreu o ora reclamante ao abrigo do artigo 70.º, n.º 1, alínea b), da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (Lei do Tribunal Constitucional – LTC).

2. É a seguinte a fundamentação da decisão sumária reclamada:

«5. Conforme fez constar do respetivo requerimento de interposição, com o presente recurso o recorrente pretende que o Tribunal Constitucional aprecie a inconstitucionalidade da «aplicação dos arts. 335.º, n.ºs 1, 2 e 3, e 337.º, n.º 3, todos do C.P.P., pela incorreta apreciação dos pressupostos exigidos para a declaração de contumácia, por manifesta violação dos arts. 20.º, 29.º n.º 1 e 32.º, da C.R.P. e pela incorreta interpretação que faz do Princípio da Legalidade, pela qual a exceção (se o fosse) não teria de estar expressamente contemplada» (cf. o ponto 26 do requerimento de interposição de recurso para o Tribunal Constitucional).

6. In casu, o objeto do recurso prende-se exclusivamente com a eventual inconstitucionalidade da decisão recorrida, em si mesma considerada, sendo por isso, inidóneo.

Conforme decorre do enunciado da questão de constitucionalidade, bem como do que demais consta do requerimento de interposição de recurso para o Tribunal Constitucional, verifica-se que o recorrente intenciona que se aprecie o que considera ser uma «incorreta apreciação dos pressupostos exigidos para a declaração de contumácia» efetuada pelo tribunal a quo, visando assim, na verdade, sindicar não a conformidade constitucional de uma qualquer norma ou interpretação normativa extraída de qualquer preceito, aplicada pelo tribunal recorrido enquanto critério geral de decisão, mas a própria decisão no que respeita ao modo como esta aplicou o direito infraconstitucional às circunstâncias específicas do caso.

Com efeito, embora o recorrente refira que pretende sindicar «a interpretação e subsequente aplicação das normas dos arts. 335.º, n.ºs 1, 2 e 3, e 337.º, n.º 3, todos do C.P.P., pelo Tribunal de 1.ª Instância e pelo Tribunal da Relação do Porto», que entende ser inconstitucional (cf. o ponto 36 do requerimento de interposição de recurso para o Tribunal Constitucional), não chega a enunciar qual a interpretação normativa, extraída daqueles preceitos, que pretende ver apreciada. Tal omissão, mais do que simples incompletude, materializa uma deficiência de outro cariz, relacionada com a inidoneidade do objeto do recurso, uma vez que, conforme se disse, subjacente à impugnação feita pelo recorrente não se encontra um qualquer problema de desconformidade de norma, enquanto critério de decisão, face a quaisquer parâmetros constitucionais.

Tal é patente, não só pelo modo como o recorrente identificou o problema de constitucionalidade, mas também pela circunstância de, no requerimento de interposição de recurso para o Tribunal Constitucional, aquele procurar demonstrar que as circunstâncias específicas dos autos, que descreve (cf., em especial, os pontos 8 a 14 do requerimento de interposição de recurso para o Tribunal Constitucional), não se enquadram em nenhuma «das situações salvaguardadas pelo art. 335.º, n.º 1, do C.P.P., impedindo que se cumpram os requisitos necessários para a declaração de contumácia do arguido» (cf. o ponto 7, ibidem), razão pela qual considera que não se compreende como se concluiu, na decisão recorrida, pela verificação dos pressupostos do referido preceito (cf. o ponto 16, ibidem).

Resulta, assim, evidente que o recorrente pretende sindicar diretamente a própria decisão recorrida, na medida em que esta considerou que, nas específicas circunstâncias do caso concreto, se verificava uma situação subsumível à hipótese dos aludidos preceitos e que, como tal, se mostravam preenchidos os pressupostos necessários à declaração de contumácia.

Discordando o recorrente de tal juízo de subsunção das circunstâncias do caso à previsão dos preceitos em causa, o problema de constitucionalidade que coloca mais não é do que a expressão dessa sua discordância no que respeita ao modo como, na sua ótica, o tribunal a quo apreciou a verificação dos pressupostos exigidos para a declaração de contumácia. Daí que questione, não um critério geral de decisão, de natureza geral e abstrata, mas sim a decisão de declaração da contumácia, uma vez que, na sua perspetiva, aquele tribunal «ao declarar o arguido contumaz ainda que sem observância dos devidos pressupostos […] preconiz[ou], inevitavelmente, uma inconstitucionalidade» (cf. o ponto 36 do requerimento de interposição de recurso para o Tribunal Constitucional).

Em suma, com o problema colocado, o recorrente pretende que o Tribunal Constitucional reexamine a decisão recorrida, no que respeita à aferição da (im)procedência de motivos que fundaram a decisão de julgar verificados, na situação concreta dos autos, os pressupostos da declaração de contumácia, escrutínio esse que, conforme se assinalou, extravasa as competências deste Tribunal.

É, por conseguinte, evidente a inidoneidade do objeto do presente recurso, o que determina a impossibilidade do seu conhecimento.

7. Por outro lado, falece legitimidade ao recorrente para a interposição do presente recurso.

Com efeito, e compreensivelmente face ao que vem de...

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